Diante da denúncia coletiva feita por sindicatos de profissionais da saúde contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), no Tribunal Penal Internacional (TPI), por genocídio, o presidente já acumula quatro acusações perante ao TPI desde o início de seu mandato.
Em novembro do ano passado um grupo de advogados e militantes de direitos humanos apresentou acusação por "incitação ao genocídio indígena". A ação apresentada neste domingo (26) também classifica como genocídio "as ações e omissões do poder público no combate à doença nessas comunidades".
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Já a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) em abril deste ano, e o PDT, em outra denúncia, também o acusaram de crime contra a humanidade ao incentivar ações que aumentam o risco de proliferação do novo coronavírus.
Uma vez apresentadas, as denúncias são apreciadas pela procuradoria do TPI, que verifica se elas se inserem na jurisdição da Corte e se estão lastreadas em fatos que justifiquem a abertura de uma investigação. Mas a mais recente denúncia, feita por profissionais de saúde, tem possibilidade de avançar?
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A reportagem do JC conversou com o cientista político e professor, Thales de Castro, sobre o destino dessas denúncias. De acordo com Thales, é “remota” a possibilidade da acusação de genocídio contra o presidente prosperar no TPI.
“No âmbito jurídico internacional, sobretudo no jurídico internacional de Direitos Humanos, tem que ter um nexo causal de responsabilidade objetiva (para que a denúncia avance). Como por exemplo, se um chefe de Estado tivesse autorizado uma matança sistemática de um grupo racial ou étnico contra outro. Essa responsabilidade objetiva quer dizer que alguém ‘apertou o botão’, significa que alguém ordenou formalmente ou coordenou uma matança”, explicou. Diante disso, o professor entende que não há provas palpáveis que embasam a denúncia.
Além disso, o cientista opina que o Tribunal Penal Internacional também pode analisar a acusação considerando quem foram os denunciantes e pode não querer se envolver em uma disputa política polarizada. Relembrando que grande parte das denúncias partiram de partidos e movimentos de esquerda do Brasil. Caso a denúncia tivesse sido feita por partidos de várias ideologias, em uma grande coalizão suprapartidária, a acusação teria mais probabilidade de ser acatada, explicou o cientista.
“O grupo de partidos políticos que deram entrada nesse procedimento investigativo são partidos declaradamente de esquerda, que travam uma luta político-partidária-ideológica contra o presidente. Esse pedido poderia ter mais robustez se, por exemplo, partidos de centro e até mesmo de direita solicitassem a abertura de um processo investigatório. Nesse caso, não seria visto uma segmentação específica ou polarização e o TPI entenderia a denúncia como viável”, justificou.
Mesmo com a possibilidade da acusação protocolada não ser acatada, Thales afirmou que, ainda assim, mais uma denúncia "fragiliza" a imagem do presidente internacionalmente.
"É um somatório de uma série de ações que estão sendo tratadas a partir da percepção da corrosão do perfil político do presidente Bolsonaro. Certamente isso traz um dano à imagem do presidente internacionalmente, podendo ser usado contra ele nas próximas eleições."
Diferentemente da Corte Internacional de Justiça, que examina litígios entre Estados, o TPI julga apenas indivíduos. O tribunal processa e julga indivíduos acusados de crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e, desde 17 de julho de 2018, crimes de agressão.
Em julho deste ano, o TPI condenou o ex-líder rebelde congolês Bosco Ntaganda por 18 crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos entre 2002 e 2003. Entre eles, assassinato, estupro, escravidão sexual e uso de crianças-soldado. A conclusão foi tomada durante audiência pública em Haia, na Holanda, sede do TPI, após revisão de documentos e audiências com testemunhas. A sentença foi anunciada em novembro: 30 anos de prisão. Ele recorre da decisão.
Réu declarado culpado de escravidão sexual, Ntaganda se entregou em 2013 na capital de Ruanda, Kigali. Ele pediu para ser encaminhado ao TPI em Haia, onde ficou preso até 2016. Esse tempo será descontado da sentença de 30 anos.
A sentença informou que 102 testemunhas prestaram depoimento, incluindo uma mulher cuja garganta foi cortada por aliados de Ntaganda. Uma das conclusões da investigação foi que Ntaganda matou a tiros um padre.