Legislativo

Aprovação de projetos na Câmara Municipal do Recife não dão garantia de que se tornarão leis

Depois de ser aprovado no plenário, o projeto de lei é encaminhado para a Prefeitura do Recife, e cabe ao prefeito sancioná-lo ou vetá-lo

Luisa Farias
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Luisa Farias
Publicado em 03/05/2021 às 8:00
YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
ENTENDIMENTO Governo fará reunião com a base para aparar as arestas em relação a projetos vetados - FOTO: YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
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Maio Laranja, Dia Municipal De Conscientização Da Síndrome De Tourette e aniversário do Bairro da Mustardinha. Essas três disposições previstas em projetos de lei aprovados na Câmara do Recife têm em comum não só a inclusão de uma data comemorativa no Calendário Oficial da cidade, mas também o fato de terem sido alvo de veto, ainda que parcial.

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Se engana quem acredita que, depois que um projeto de lei é aprovado na Câmara, o que está previsto nele já passa a valer imediatamente. Mesmo depois de ser protocolado pelo seu autor, discutido e votado no âmbito das comissões e no plenário, ele ainda precisa seguir para uma nova fase, que é a sanção ou veto do prefeito.

De acordo com a Lei Orgânica do Município, o prefeito dispõe de 15 dias úteis a partir da data de recebimento de um projeto aprovado para sancioná-lo ou vetá-lo. Caso esse prazo acabe sem nenhuma manifestação, a Câmara tem a prerrogativa de promulgá-lo de forma independente. 

Equilíbrio

O presidente da Comissão de Direito Parlamentar da OAB-PE, Roberto Rocha Leandro, explica que a sanção e o veto são instrumentos de fiscalização do Executivo em relação ao Legislativo, que integram o sistema de freios e contrapesos. 

"Os três poderes devem estar constantemente fiscalizando, freando e impondo limites uns aos outros para que possa haver um equilíbrio e uma pacificação. A ideia de sanção e veto sob um olhar leigo pode até parecer uma intervenção do Executivo sobre o Legislativo, mas na verdade, ela é justamente o que garante esse respeito aos limites e a complementaridade dos poderes", afirmou.

Na última terça-feira (27), a Câmara votou 18 vetos parciais de uma vez. Haveria outros na pauta, mas após acordo firmado entre os vereadores e o presidente da Casa, Romerinho Jatobá (PSB), os vetos totais previstos na ordem do dia tiveram sua votação adiada para a próxima segunda-feira (3). "A prefeitura muitas vezes demora muito para trazer os vetos de volta e a gente acaba votando eles quase que em bloco, sem dar a devida importância a cada uma das proposições", se queixou o vereador Ivan Moraes (Psol). 

Todos os vetos, assinados pela gestão anterior de Geraldo Julio (PSB), foram aprovados pela Casa. Alguns, inclusive, eram de autoria de vereadores que não conseguiram se reeleger, como Aline Mariano (PP).

Votação

A própria Câmara também tem um prazo de 30 dias para colocar os vetos na pauta depois que eles são enviados pela prefeitura, mas havia vários deles pendentes de votação. "A gente precisa votar. Eles não foram votados antes, então a gente está cumprindo o Regimento Interno e botando para votar. Na minha gestão, vou votar todos os (novos) vetos e os que estavam parados", afirmou o presidente da Casa, Romerinho Jatobá (PSB). 

As justificativas para os vetos têm sido alvo de crítica por parte da bancada de oposição e de autores dos projetos vetados, o que levantou o debate sobre a prerrogativa dos parlamentares de apresentarem projetos de lei que criassem algum tipo de obrigação ou despesa ao executivo municipal. 

"Não podemos corroborar com a tese de que o Legislativo não pode impor deveres ao Executivo, sob pena de esvaziar completamente a nossa atividade política. E mais, sob pena de esvaziar completamente a função institucional da nossa própria existência", queixou-se Liana Cirne (PT) durante a sessão.

Ela citou, inclusive, uma tese de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2016. Não usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos (art. 61, § 1º, II,"a", "c" e "e", da Constituição Federal).

"Teses de repercussão geral definidas pelo STF constituem precedentes obrigatórios que devem ser seguidos por todas as instâncias públicas e portanto, que nós também devemos seguir", disse a vereadora. 

Autora do projeto nº 151/2019, Ana Lúcia (Republicanos) defendeu o teor da sua proposta, mas sinalizou que votaria a favor do veto e apresentaria posteriormente uma emenda com o que estava previsto no artigo suprimido.

"Eu não vou votar contra porque a cidade ganha hoje uma lei que será registrada e que será colocada no calendário de eventos da cidade, o que não me impede de forma alguma de imediato entrar com uma emenda, que é possível em qualquer lei já sancionada, para melhorar essa lei e ela vai melhorar. Se na outra legislatura, o executivo entendeu juridicamente que não cabia, eu vou apelar para que nessa gestão o jurídico entenda que esse quarto artigo é fundamental para essa lei que hoje é sancionada", justificou. 

Michele Collins votou contra os vetos parciais a três projetos de sua autoria. Um deles cria o Guia Municipal de Saúde do Recife, um apanhado com informações sobre o sistema público de saúde da capital pernambucana. O veto diz respeito ao artigo que determina a afixação de cartazes sobre o guia em estabelecimentos públicos.

"Não vai poder ter essa divulgação, o que é algo também que já está dentro das diretrizes da política da saúde, da visibilidade, da ampla divulgação. A gente sabe que não tem um custo algo que a prefeitura já disponibiliza (do orçamento) para divulgação", disse.

Ao JC, o líder da oposição na Câmara, Renato Antunes (PSC) apontou que a bancada entendeu os vetos como improcedentes. "Eles alegam invasão de competência, inconstitucionalidade, mas na verdade a gente entende que não era motivo, até porque existem outros entes da federação que já legislam sobre essas matérias e não caberia ao Executivo vetar pela justificativa que eles apresentaram"

"Nesse contexto a gente apresentou voto contrário, mas infelizmente a própria Câmara confirmou o veto por o governo ter ampla maioria e isso entristece muito porque isso diminui muito o trabalho da Casa. A Câmara Municipal praticamente deixa de fazer o seu trabalho e entrega a responsabilidade ao executivo", completa Renato Antunes. 

O líder do governo na Casa, Samuel Salazar (MDB), por sua vez, afirmou que diante do grande número de vetos já votados e ainda pendentes na Casa, tem procurado aparar as arestas entre os vereadores com relação ao tema. "Não acho que esteja ocorrendo problema, mas como houve algumas pontuações eu tomei a iniciativa de entrar em contato com a Secretaria de Governo e a Procuradoria para marcar uma reunião. Romerinho Jatobá tem ajudado também na reação do legislativo com o executivo. Na minha gestão como líder eu tenho procurado sempre um bom diálogo", disse.

Principais vetos aprovados no dia 27 de abril

  • PL nº 134/2017
    Autora: Natália De Menudo
    Institui o dia 15/11/1825 como marco inaugural de criação do bairro da Mustardinha e inclui, no Calendário de Eventos do Recife, o dia 15 de novembro como aniversário do bairro
    Artigo vetado: Durante a comemoração, os aspectos infraestruturais, sociais, culturais e políticos poderão ser discutidos por meio de palestras e debates
  • PL nº 151/2019
    Autora: Ana Lúcia (Republicanos)
    Institui o “Dia Municipal De Conscientização Da Síndrome De Tourette” no Calendário de Eventos do Recife
    Artigo vetado: Na data, serão promovidas ações de esclarecimento a comunidade sobre causas, tratamentos adequados e necessidade de apoio familiar aos pacientes, integração de pessoas com a síndrome, promoção de campanhas educativas, seminários e encontros
  • PL nº 164/2019
    Autor: Almir Fernando (PCdoB)
    Institui o mês “Maio Laranja” e o “Dia Municipal de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”
    Artigo vetado: Durante o mês, o município promoverá atividades para conscientização, prevenção, orientação e combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes
  • PL nº 29/2018
    Autora: Michele Collins (PP)
    Dispõe sobre o Guia Municipal de Saúde do Recife
    Artigo vetado: Os estabelecimentos públicos de saúde deverão afixar, nas suas dependências, cartaz contendo informações sobre o guia
ARTES JC
Vetos aprovados pela Câmara - FOTO:ARTES JC

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