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Erro de digitação do próprio governo faz mulher esperar casa própria há mais de dez anos em Pernambuco

Agora eu vou sair sem a ajuda deles. Quando chegar o verão, vou colocar a placa de "vende-se" e vou embora

Lucas Moraes
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Lucas Moraes
Publicado em 25/08/2022 às 7:06
GUGA MATOS/JC IMAGEM
TRISTEZA Por causa do dígito errado do CPF, Luzinete Silva não recebeu a chave do imóvel que mudaria sua vida - FOTO: GUGA MATOS/JC IMAGEM

Morando praticamente às margens do Rio Una, em Palmares, a dona de casa Luzinete Maria Silva, 49 anos, chegou mais perto do que poderia imaginar de uma casa própria longe do risco de enchentes. Passou-se alguns anos quando ela foi conferir a lista de beneficiários das casas construídas a partir da operação reconstrução, após as enchentes de 2010. Chegou a ver a chave do imóvel que mudaria sua vida. Mas, por um dígito errado do CPF, não pôde realizar esse sonho acalentado há mais de uma década.

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“No dia que estava distribuindo as casas estava lá meu nome completo, número da minha identidade, tudo certinho. Aí ela disse que por causa de um número do CPF, eu não iria receber”, relembra ela.

O cadastro, segundo Maria Silva, foi feito por equipes da própria Casa Civil, que estiveram na cidade logo após a cheia de 2010. “Na primeira vez que vieram pegaram meus dados e já dizia no sistema deles que eu nem morava perto do rio. Mandaram uma foto e disseram que iriam resolver. Passou. Chegou o dia de pegar a chave e foi isso. Um erro deles, que foram eles que preencheram os dados. O que me disseram foi apenas: "Procure um advogado”, desabafa a dona de casa.

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Rio Una - GUGA MATOS/JC IMAGEM


Sem dinheiro e motivação para buscar pelo próprio direito. Maria já desistiu de ter uma moradia digna a partir de alguma ação do governo. “Eles quem deveriam resolver. Não foi um erro meu. Eu não procurei um advogado e até hoje espero. Agora, eu vou sair sem a ajuda deles. Quando chegar o verão, vou colocar a placa de “vende-se” e vou embora”, sentenciou.

A última cheia, de 2022, trouxe para dentro de casa 1,20 metro de água. "Tem meio mundo de casa fechada lá em cima (Quilombo I E II). Uma folha de caderno não dá para você anotar. Tem gente que vendeu, alugou ou foi embora porque as casas começaram a apresentar problemas", salienta a dona de casa.

Segundo ela, no Estado não há objetivo de mudar a vida da população ribeirinha. "É onde eles (gestores) ganham dinheiro. Agora, mesmo, teve dinheiro liberado. Eu recebi, mas muita gente aí não recebeu. Na última vez que procurei o pessoal da Infraestrutura, mandaram eu buscar o advogado. Não fui. Disse: 'no dia que vocês quiserem me tirar, estarei no mesmo local". 

Em Palmares foram prometidas quase 3 mil casas, mas nem todo mundo que sofreu com a enchente daquela época recebeu um imóvel novo. O Estado diz que tem em andamento ainda 853 casas em toda a Mata Sul, tendo entregue 13.625 imóveis.

 

A associação de moradores do bairro de São Sebastião estima que 100 famílias foram atingidas pelas chuvas de 2010 e deveriam receber as casas construídas por meio do programa Minha Casa, Minha Vida. Mas efetivamente, a conta da associação é que metade desse total foi alojado nas novas casas.

A reportagem do JC questionou a Cehab especificamente sobre o quantas casas foram entregues por município da Mata Sul, quantas estão em obras, se havia unidades paralisadas ou abandonadas, além de saber para onde teriam ido famílias que não aceitaram morar lá. As respostas não foram dadas.

GUGA MATOS/JC IMAGEM
Loteamento Quilombola - GUGA MATOS/JC IMAGEM

OPERAÇÃO TORRENTES

Em 2017, a Polícia Federal deflagrou a Operação Torrentes, que culminou na condenação de sete pessoas por fraudes em licitações para socorrer as vítimas das chuvas de 2010. A operação revelou a atuação de um grupo criminoso em fraudes na execução de ações de auxílio, envolvendo membros da Casa Civil do Estado e um grupo de empresários.

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