O cenário mudou rapidamente para o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Nos últimos dias ele vinha dando ao governo demonstrações de força, como ocorreu nas votações do novo arcabouço fiscal, do marco temporal das terras indígenas e da medida provisória da reestruturação do governo. A semana, no entanto, se encerrou com Lira sob cerco.
Aliados do deputado em Alagoas foram alvo de uma operação da Polícia Federal que investiga superfaturamento na compra de kits de robótica para escolas públicas. E na próxima quarta-feira o próprio deputado estará no centro das atenções: o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar um recurso dele contra decisão que o tornou réu por corrupção passiva.
O noticiário negativo para o parlamentar levou seus aliados a levantarem teorias sobre o momento político do alagoano. Entendem eles que a liberação do processo para julgamento e a operação da PF podem interessar a adversários de Lira não só em seu Estado natal, mas também no Planalto.
Segundo revelou a Coluna do Estadão, Lira se incomodou com a ida do ministro Flávio Dino (Justiça) a Alagoas sem convidá-lo para integrar a comitiva. Ao lado do governador Paulo Dantas (MDB), aliado do senador Renan Calheiros (MDB-AL) - este, um inimigo político e desafeto pessoal de Lira -, Dino entregou viaturas policiais. O tema teria sido mencionado por Lira no contato que teve com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por telefone, antes da votação da MP da reestruturação.
O ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Paulo Pimenta, ressaltou que o governo federal tem "cuidado, respeito institucional com todos os Poderes, em especial com o Legislativo". Segundo o ministro, Lula tem um diálogo constante com Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). "Não é agora que o diálogo deixará de acontecer."
A denúncia a que se refere o processo que está no STF foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e envolve a apreensão de R$ 106 mil com um assessor parlamentar do deputado Lira.
A acusação afirma que o dinheiro foi recebido em troca de apoio político para a manutenção do então presidente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Francisco Carlos Caballero Colombo.
A denúncia foi recebida pelo STF em 2019. Depois, a PGR mudou de entendimento e defendeu o arquivamento da própria acusação. Enquanto isso, a defesa de Lira alega esvaziamento da denúncia.
O processo estava engavetado desde 2021, quando o ministro Dias Toffoli pediu vista. Toffoli liberou o caso na quarta-feira passada, mesmo dia em que a Câmara votou a MP da reestruturação do governo.
Também no mesmo dia, outra ação - esta de interesse do deputado - foi travada no Supremo. O ministro André Mendonça suspendeu processo em que o presidente da Câmara atribui a Renan Calheiros crimes contra a honra em razão de ataques durante a campanha de 2022.
A Operação Hefesto, da PF, veio no dia seguinte. As fraudes somariam R$ 8,1 milhões com direcionamento de licitações e superfaturamento na compra de kits de robótica por 43 municípios de Alagoas.
Um dos principais alvos da ação foi Luciano Cavalcante, ex-assessor de Lira. Cavalcante ainda trabalha na liderança do PP na Casa, recebendo R$ 14,7 mil de salário. Durante a operação, R$ 4,4 milhões em espécie foram apreendidos em endereços de pessoas e empresas investigadas.
A Justiça Federal determinou o sequestro de bens dos investigados e a suspensão de processos licitatórios e contratos entre a empresa investigada, Megalic Ltda., e os municípios que receberam recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a aquisição de equipamentos de robótica.
Na Justiça alagoana, a queda de braço travada entre Lira e Renan Calheiros ganhou um novo capítulo. A juíza Margareth Cristina Becker, do 2.º Juizado Especial Cível de Brasília, encerrou uma ação movida pelo presidente da Câmara contra o senador por publicações nas redes sociais. Lira pedia indenização por danos morais.
A briga nas redes começou quando a Polícia Federal fez uma operação contra o governador Paulo Dantas - aliado de Renan -, durante a campanha eleitoral do ano passado.
O senador acusou Lira de interferir na Superintendência do órgão. O candidato do presidente da Câmara era Rodrigo Cunha (União Brasil), derrotado no segundo turno.
"Arthur Lira é ladrão já condenado por desvios na Assembleia. Segue roubando no orçamento secreto, metendo as mãos sujas na PF/AL para qual trouxe a aliada. Afastar o governador - favorito que quase venceu no primeiro turno - para uma apuração é a anomalia que será rechaçada pelos alagoanos", escreveu o emedebista.
A defesa de Renan Calheiros logo foi atrás de publicações do deputado e também pediu a condenação de Lira por danos morais. O presidente da Câmara chegou a chamar o senador de "criminoso".