O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, voltou a defender a posição do Brasil na guerra da Ucrânia. Em entrevista ao jornal italiano Corriere della Sera, ele disse que o conflito não pode ser vencido nem pelos russos, nem pelos ucranianos.
A posição de Lula tem sido contestada pelo arco de aliados ocidentais da Ucrânia, especialmente americanos e europeus. Mais de uma vez, o presidente brasileiro repetiu que a responsabilidade do conflito é tanto dos ucranianos quanto dos russos - ignorando que a guerra começou quando Vladimir Putin ordenou a invasão do país vizinho.
Lula, que pretende mediar um acordo de paz, voltou ontem a tocar no assunto. "Os dois países acreditam que podem vencer o conflito militarmente: eu discordo. Tem pouca gente falando de paz", disse Lula. "Minha angústia é que, com tanta gente passando fome no mundo, com tantas crianças sem ter o que comer, em vez de resolver as desigualdades, estamos cuidando de guerra. É urgente que Rússia e Ucrânia encontrem o caminho da paz."
No primeiro dia de sua agenda em Roma, Lula se encontrou com o presidente da Itália, Sergio Mattarella. Os dois conversaram sobre ampliação do intercâmbio comercial entre Brasil e Itália, que passa pela aprovação do acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia.
Aprovado em 2019, após 20 anos de negociações, o acordo está parado - e um dos objetivos de Lula na Europa é destravá-lo. O texto precisa ser ratificado pelos parlamentos dos países dos dois blocos, uma negociação complexa que envolve 31 países, o que pode levar anos.
Na maratona de reuniões de quarta, Lula esteve ainda com líderes do Partido Democrático (PD), de centro-esquerda, com o prefeito de Roma, Roberto Gualtieri, e com o ex-premiê da Itália Massimo D’Alema.
A reunião mais importante foi com Giorgia Meloni, a premiê italiana, líder do partido de extrema direita Irmãos da Itália. Até pouco tempo, ela criticava Lula, especialmente durante a extradição de Cesare Battisti, condenado por quatro homicídios nos anos 70, na Itália. Battisti passou 40 anos foragido - 14 deles no Brasil.
Em 2010, no último ano do segundo mandato de Lula, Battisti foi beneficiado por um refúgio concedido pelo brasileiro. A decisão desatou uma crise com a Itália e prejudicou a imagem de Lula com os conservadores italianos.
Em 2018, Meloni celebrou a vitória de Bolsonaro. "Os povos estão recuperando sua liberdade", disse. "Com Bolsonaro, se abre uma brecha na rede internacional de radicais chiques que por décadas protegeu o terrorista vermelho Battisti" - em 2019, ele foi preso na Bolívia e voltou para a Itália, onde cumpre prisão perpétua.
Desde que se assumiu, porém, Meloni suavizou o discurso. Cumprimentou Lula pela vitória, em 2022, e criticou a invasão do Congresso brasileiro, em janeiro. "O que está acontecendo no Brasil não pode nos deixar indiferentes", disse.
Nesta quarta, Lula e Meloni se comportaram de maneira institucional, em busca de uma melhor relação entre os dois países. Ao Corriere della Sera, Lula reforçou os laços históricos entre Brasil e Itália. "Espero conhecê-la (Meloni) melhor", afirmou.
"Temos 30 milhões de descendentes italianos. Tenho uma relação excelente com o movimento sindical daqui, com os intelectuais, as empresas", disse o presidente brasileiro, que se esquivou, contudo, de comentar sobre Battisti.