O ministro Benedito Gonçalves, relator da ação contra Jair Bolsonaro (PL) em julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), votou, nesta terça-feira (27), pela inelegibilidade do ex-presidente.
A votação foi interrompida e será retomada na quinta (29).
Bolsonaro responde por abuso de poder político, conduta vedada, desordem informacional e uso indevido dos meios de comunicação.
Se for condenado, pode perder os direitos políticos e ficar sem disputar eleições por oito anos.
REUNIÃO COM EMBAIXADORES
O pano de fundo do julgamento no TSE é a reunião convocada por Bolsonaro, então presidente, com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada, em 18 de julho de 2022, para atacar o sistema de votação brasileiro e as urnas eletrônicas.
As falas do ex-presidente foram transmitidas pela TV Brasil.
Segundo Gonçalves, houve desvio de finalidade no uso do "poder simbólico do presidente e da posição do chefe de Estado" para "degradar o ambiente eleitoral".
Braga Netto, parceiro de chapa de Bolsonaro nas eleições de 2022, não foi citado pelo ministro.
"A prova produzida aponta para a conclusão que o primeiro investigado foi integral e pessoalmente responsável pela concepção intelectual do evento objeto desta ação", disse o ministro.
Com Estadão Conteúdo
VEJA VOTO DO RELATOR DA AÇÃO CONTRA BOLSONARO NO TSE
JULGAMENTO DE BOLSONARO
O primeiro dia do julgamento, 22 de junho, ficou reservado para a leitura do relatório, documento que reconstitui o histórico de tramitação da ação, e para as manifestações dos advogados e do Ministério Público Eleitoral.
O primeiro a falar foi o advogado Walber de Moura Agra. Ele é coordenador jurídico do PDT e redigiu a ação movida pela legenda.
A estratégia foi tentar ligar a reunião com os embaixadores a um contexto mais amplo de ataques antidemocráticos e investidas para desacreditar o sistema eleitoral, que culminou com os atos golpistas do dia 8 de janeiro em Brasília.
Em seguida, o advogado Tarcísio Vieira de Carvalho teve 30 minutos para falar em nome do ex-presidente.
Ele buscou "despolitizar" o julgamento e defendeu a não instrumentalização da Justiça Eleitoral para "varrer" a direita no Brasil. Outra estratégia foi tentar minimizar a gravidade das declarações.
"A questão do voto impresso não pode ser tabu", afirmou.
Por fim, o vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gustavo Gonet, sustentou pela condenação de Bolsonaro. O discurso foi duro e atribuiu ao ex-presidente uma tentativa de "degradar ardilosamente" a democracia.
A leitura é que a reunião com os embaixadores foi usada para promover a narrativa falsa, explorada na campanha, de fraude nas urnas.
Ele também associou as declarações do ex-presidente a bloqueios em rodovias, acampamentos em frente a quartéis do Exército e aos atos do dia 8 de janeiro.
Violação à normalidade democrática
Segundo Gonçalves, a conduta do ex-presidente viola a normalidade democrática ao questionar o processo de votação e levantar questionamentos sobre a integridade de autoridades do Judiciário. "(Palavras de Bolsonaro) esgarçam a normalidade democrática e isonomia ao propor cruzada contra inexistente conspiração para fraudar eleições. A recusa de valor ao conhecimento técnico a respeito das urnas e recusa a autoridade do TSE foram usadas como ferramenta de engajamento (de eleitores), afirmou o ministro em seu voto.
Desvio de finalidade
O ministro pontuou que o ex-presidente cometeu "desvio de finalidade" ao usar a TV Brasil para transmitir a reunião para "reverberar falsa denúncia de fraude".
Ele lembrou que, àquela altura, o deputado estadual pelo Paraná, Fernando Franceschini, teve mandato cassado pelo TSE por difundir informações falsas sobre o sistema eleitoral nas eleições de 2018.
"Não foi realizada apenas uma live, houve transmissão de evento de caráter oficial, marcado por desvio de finalidade. (A transmissão) ocorreu somente nas redes do investigado, mas em emissora pública, reverberou falsa denúncia de fraude que a essa altura já havia levado à cassação de deputado federal. O fato ocorreu a menos de 3 meses da eleição e serviu para alinhavar prática nefasta que foi levada adiante durante campanha", destacou o magistrado.
O desvio de finalidade, de acordo com o relator, não se limitou ao uso de bens e serviços públicos na reunião com embaixadores.
"O que torna o evento no Palácio do Alvorada um evento aberrante foi o poder simbólico de presidente da Republica e da posição de chefe de Estado para degradar ambiente eleitoral", reforçou.
Banalização do golpismo
Ainda segundo o relator, os ataques de Bolsonaro levam à "banalização do golpismo" e fizeram um "apelo rude para que comunidade internacional não desse ouvidos ao TSE".
Gonçalves finalizou o voto com uma defesa enfática da Justiça Eleitoral. "O TSE se manterá firme em seu dever de transmitir informações verídicas e atuar para conter o alastramento de desinformação", afirmou.
"Agressões violentas à Justiça Eleitoral confirmam a importância da instituição para salvaguarda da democracia", prosseguiu.
RETORNO DO JULGAMENTO
Na quinta-feira (29), o julgamento de Bolsonaro no TSE será retomado com o voto do ministro Raul Araújo, às 9h.
Também votarão Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e o presidente do TSE, Alexandre de Moraes.
Com Estadão Conteúdo