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Saúde e Bem-estar

Por Cinthya Leite e equipe

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Veto ao PL das vítimas do zika vírus expõe contradição do governo, aponta especialista

A Presidência ofereceu indenização em parcela única e afirmou que as vítimas já estão acomodadas juridicamente, o que é questionado por especialistas

Publicado em 14/01/2025 às 12:36 | Atualizado em 14/01/2025 às 14:27
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O governo federal foi alvo de críticas depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou integralmente o projeto de lei que previa indenização e pensão para crianças com microcefalia em decorrência do zika vírus. Em compensação, Lula editou uma Medida Provisória para indenizar as vítimas em parcela única de R$ 60 mil.

A MP 1.287/2025 foi recebida com frustração pela senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), autora do projeto aprovado pelo Legislativo no ano passado, mas cujas discussões começaram em 2015, devido à epidemia de zika no Brasil. Ela acusou o governo de não ouvir as famílias das vítimas e considerou a medida "uma afronta à dignidade” dessas pessoas.

O PL 6.064/2023 previa indenização única de R$ 50 mil e uma pensão mensal vitalícia de R$ 8.092,00, equivalente ao teto do regime de previdência do INSS. Os valores seriam corrigidos pela inflação (pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor) e seriam livres de Imposto de Renda.

A Presidência da República justificou o veto afirmando que a proposta contraria o interesse público devido ao impacto orçamentário.

“Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, pois cria despesa obrigatória de caráter continuado e benefício tributário e amplia benefício da seguridade social, sem a devida estimativa de impacto orçamentário e financeiro", diz o documento, publicado no Diário Oficial da União.

A Secretaria da Comunicação Social da Presidência justificou ainda que as pessoas vítimas do zika vírus já teriam sido acomodadas juridicamente, referindo-se à possibilidade existente de uma pensão mensal no valor de um salário mínimo para as crianças com síndrome congênita do zika.

Responsabilidade do governo

Em entrevista ao programa Tudo é Notícia, da Radio Jornal, o advogado previdenciário e trabalhista Rômulo Saraiva problematizou a justificativa do “acomodamento jurídico” dada pela Presidência.

O especialista esclareceu que esse aparato jurídico não foi criado para lidar especificamente com o problema do zika vírus, porque corresponde ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é dado a qualquer brasileiro, desde que ele consiga provar situação de pobreza e uma doença grave, incluindo a zika.

“A motivação foi meio esquisita, porque o BPC já é uma garantia constitucional praticada no Brasil há anos. Então, o governo não inventou a roda, isso já existia”, disse.

O advogado também considera que a justificativa para o veto é contraditória, já que a MP editada posteriormente indica que o governo reconhece que tem responsabilidade sobre as vítimas da zika.

“É uma situação paradoxal, porque o governo admite uma mea-culpa. Se vai pagar os R$ 60 mil, é porque ele reconhece ali que teve responsabilidade nesse problema de saúde pública que acometeu milhares de pessoas”, afirmou.

Precedente na Síndrome da Talidomida

Saraiva compara a situação com a Síndrome da Talidomida, medicamento que causa malformações no feto quando usado durante a gravidez, que foi um grande problema de saúde pública no País, na década de 1960.

O advogado lembra que, na ocasião, o governo se responsabilizou pelo problema e ofereceu uma pensão vitalícia criada especialmente para atender às vítimas do medicamento, o que não ocorre agora.

“Nesta ocasião do zika vírus, o governo resolveu exonerar-se do pagamento do pensionamento vitalício, embora tenha praticado isso na Síndrome da Talidomida. Aqui, em relação ao zika vírus, o governo se eximiu da responsabilidade com esse veto do Lula”, diz o advogado.

Dificuldades para conseguir o BPC

Para ter direito à indenização de R$ 60 mil prevista na MP editada por Lula, as famílias precisam comprovar a relação entre a deficiência da vítima e a infecção pelo zika vírus. A criança precisa ter nascido entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024.

Mas para ter direito ao Benefício de Prestação Continuada existem muitos outros critérios, entre eles a necessidade de comprovar situação de baixa renda.

Se há um companheiro que tenha renda própria ou carteira assinada, ou se alguém da família recebe pensão ou aposentadoria, isso dificulta o acesso ao benefício.

Segundo Saraiva, esses empecilhos deixam muitas famílias em uma situação vulnerável, porque mesmo pessoas pobres têm dificuldade de atender aos critérios.

“Como advogado, tenho várias experiências de pessoas que mesmo encampando um perfil de pobreza, com crianças com microcefalia, encontram dificuldade perante o INSS para receber o benefício. Então, mesmo o pobre, ele não vai ter facilidade em receber isso rapidamente. Muitas vezes o INSS nega, precisa travar uma discussão judicial para provar e conseguir receber o benefício”, relata.

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