Tanto a obesidade como a magreza extrema são fatores de risco para a enxaqueca, de acordo com um novo estudo realizado por um grupo de cientistas dos Estados Unidos e publicado nesta quarta-feira, 12, na revista "Neurology", da Academia Americana de Neurologia.
O estudo, coordenado pela neurologista Lee Peterlin, da Universidade Johns Hopkins, concluiu que as pessoas obesas e as abaixo do peso têm, respectivamente, uma probabilidade 27% e 13% maior de sofrer de enxaqueca, em comparação aos indivíduos com peso normal.
Os resultados se basearam na análise de 12 estudos, envolvendo 289 mil pacientes, que tinham dados disponíveis sobre enxaqueca e Índice de Massa Corpórea (IMC).
"Como a obesidade e a magreza extrema são condições potencialmente modificáveis, é importante que os médicos e os pacientes de enxaqueca estejam conscientes desses fatores de risco. Agora vamos estudar se os esforços para redução ou ganho de peso podem atenuar o risco da doença", disse Lee.
O IMC é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a principal referência para a classificação das faixas de peso. O índice é determinado pela divisão do peso do indivíduo, em quilos, pelo quadrado de sua altura em metros. A obesidade é definida por um IMC acima de 30, enquanto as pessoas abaixo do peso são as que têm IMC menor que 18,5.
De acordo com Lee, a relação de risco encontrada entre obesidade e enxaqueca é moderada. A escala da relação é a mesma da observada com transtornos bipolares e doença cardíaca isquêmica - problema que causa dor e desconforto que acontece quando parte do coração não recebe sangue suficiente.
A idade e o sexo foram variáveis importantes, segundo a pesquisadores, na associação entre IMC e enxaqueca. "Isso faz sentido, já que o risco envolvido na obesidade e o risco de enxaqueca é diferente entre homens e mulheres e entre jovens e idosos. Tanto a obesidade como a ocorrência de enxaqueca são mais comuns em mulheres e em jovens", disse Lee.
A pesquisadora afirma que não se sabe ainda exatamente como a composição corporal pode afetar a enxaqueca.
"O tecido adiposo, que é a gordura, secreta uma ampla gama de moléculas que poderiam ter um papel no desenvolvimento ou no desencadeamento da enxaqueca", sugeriu Lee.
A enxaqueca é um tipo de cefaleia que costuma provocar dores latejantes de um lado só da cabeça, eventualmente acompanhadas de náuseas, vômitos e intolerância a sons, luz e cheiros fortes.
De acordo com o neurologista Mário Peres, do Hospital Albert Einstein, a enxaqueca acomete 15% da população brasileira em geral, mas a ocorrência é de duas a três vezes mais comum entre as mulheres.
"Na região Sudeste, 30% das mulheres sofrem com as crises. A doença é uma das principais causas de falta ao trabalho. A dor é, na maior parte das vezes, incapacitante", disse Peres.
A doença muitas vezes é tratada com analgésicos, mas, de acordo com o médico, o principal tratamento é mesmo a prevenção. "As pessoas são massacradas pelas propagandas de analgésicos e acham que essa é a saída. Mas, muitas vezes, o abuso desses medicamentos pode agravar a condição", disse.
Um estudo liderado pelo pesquisador brasileiro Alex da Silva, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, mostra que durante as crises de enxaqueca o cérebro do paciente tem uma queda nos níveis de dopamina - substância produzida pelo cérebro que está envolvida na regulação da sensação de prazer, bem-estar e motivação.
De acordo com Silva, esse resultado ajuda a explicar o comportamento dos pacientes, que durante as crises costumam procurar reclusão e silêncio.
"A redução dos níveis de dopamina durante as crises é uma forma do cérebro dizer que algo não vai bem internamente e que precisa de tempo para se recuperar. Com menos dopamina, a pessoa é forçada a reduzir o ritmo, ir para um quarto escuro e evitar todo tipo de estímulo", disse Silva ao Estado.
No estudo, publicado na revista Neurology, os cientistas fizeram medições da atividade cerebral e dos níveis de dopamina em oito pacientes que sofriam de enxaqueca - durante as crises e entre elas - e em oito pessoas saudáveis.
Quando os pacientes com enxaqueca estavam entre as crises, seus níveis de dopamina ficavam tão estáveis como os dos pacientes saudáveis. Mas durante os episódios os níveis do neurotransmissor caíam consideravelmente. "A conexão entre dopamina e enxaqueca sempre foi conhecida, mas pouco compreendida", disse Silva.
Para realizar o estudo, o cientista utilizou imagens do cérebro de pacientes obtidas com tomografias por emissão de pósitrons. As imagens foram estudadas com um equipamento de "experiência digital imersiva": um modelo cerebral 3D que usa realidade virtual para que o cientista possa "passear" no cérebro do paciente. "Na sala, nós usamos óculos especiais para ver o cérebro flutuando. Com um joystick, podemos cortar, expandir, rotacionar e navegar no cérebro, utilizando dados reais de pacientes", explica.