Num gesto em que assume a nacionalização da crise do sistema penitenciário, o presidente Michel Temer (PMDB) anunciou, ontem, em Brasília, que vai liberar as Forças Armadas para atuarem na segurança dos presídios do País, caso sejam requisitadas pelos governadores. O decreto presidencial foi anunciado no mesmo dia em que o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, se reuniu com secretários de Segurança e Justiça dos Estados, também na capital federal, para anunciar medidas emergenciais para as prisões.
Até o final da noite de ontem, apenas os Estados do Amazonas, de Roraima e do Rio Grande do Norte – onde rebeliões deixaram um saldo total de 124 mortos desde o início do ano – haviam sinalizado positivamente para a proposta de utilização de militares em unidades prisionais. Atualmente, existem 350 mil integrantes das Forças Armadas aptos a atuar nas unidades carcerárias.
Em um primeiro momento, Pernambuco não deverá requisitar o reforço. O secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos, Pedro Eurico, afirma que vê com ressalvas a utilização de militares federais no interior dos presídios do Estado. “É preciso ter muita cautela com essa questão. As Forças Armadas não têm expertise para esse tipo de atuação”, afirma.
O artigo 2º do decreto presidencial, no entanto, deixa claro que as Forças Armadas apenas entrarão nos presídios “para a detecção de armas, aparelhos de telefonia móvel, drogas e outros materiais ilícitos e proibidos”, e que o trabalho “será realizado em articulação com as forças de segurança pública competentes”. E isso já aconteceu em Pernambuco. No dia 16 de março de 2015, militares do Exército, com o auxílio de detectores de metal, encontraram 203 armas artesanais, além de celulares e drogas, no Presídio Frei Damião de Bozzano, um dos três que compõem o Complexo do Curado, no bairro do Sancho, Zona Oeste da cidade. A ação foi em parceria com o Batalhão de Choque da Polícia Militar e agentes penitenciários.
Dentro do que prevê o decreto de Michel Temer, as Forças Armadas não teriam competência, por exemplo, para conter a situação atual no presídio de Alcaçuz, no município de Nísia Floresta, a 30 quilômetros de Natal (RN). Desde o último sábado, uma violenta rebelião deixou, até agora, um saldo de 26 mortos na unidade.
O secretário de segurança pública do Rio Grande do Norte, Caio Bezerra, afirmou ser bem-vindo o apoio das Forças Armadas, mas que é preciso executar um conjunto de medidas para estancar a crise vivida pelo sistema carcerário. Até o final da noite de ontem, a rebelião na Penitenciária de Alcaçuz não tinha sido controlada. “Não há solução milagrosa. Precisamos levantar a estrutura física da unidade, realizar transferências de alguns presos. Mas vemos o apoio com bons olhos. Toda ajuda é bem-vinda”.
Através de nota, o governo do Amazonas afirmou que fará uso de toda e qualquer iniciativa que possa trazer mais tranquilidade e paz para a população. Disse que vai reiterar o pedido de atuação das Forças Armadas também nas regiões de fronteira, principalmente com países como Colômbia e Peru, onde existe uma grande produção de cocaína.
Para a professora Marília Montenegro, do curso de Direito da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), a medida adotada ontem pelo governo federal realça o caráter da “guerra” que a gestão pretende travar para conter o caos nas penitenciárias brasileiras. “É o mais do mesmo. A bomba-relógio que é o sistema penitenciário só será mais aparelhada ainda. O País não está discutindo os principais pontos, que é o como as pessoas chegam até as unidades prisionais. É preciso repensar essa política de superencarceramento”.
Segundo ela, deve-se acelerar o investimento nas audiências de custódia e em mutirões que resolvam a situação dos presos provisórios. “Em Pernambuco, 60% dos detento estão nessa situação. Também faz-se necessário redefinir a guerra às drogas, que também não tem mostrado resultados”, completa.