Se você passou pela Rua São Francisco de Paula, no bairro de Caxangá, na Zona Oeste do Recife, nos últimos anos, certamente virou o pescoço para olhar a casa de número 291. É quase impossível fazer esse caminho sem bisbilhotar o sobrado de três pavimentos, de arquitetura colorida como um templo hindu e com paredes revestidas de pedacinhos de cerâmica formando mosaicos à la Antoni Gaudí (1852-1926), famoso arquiteto catalão.
A edificação de arquitetura curiosa vem sendo construída há 19 anos pelo artista plástico Genézio Gomes, 47 anos, natural de Belo Jardim, município do Agreste pernambucano. Ele mesmo projetou a casa, usando como inspiração palácios renascentistas que visitou em viagens pela Europa e a criatividade própria. O resultado está estampado na fachada, que mistura vários estilos, numa casa eclética por excelência.
“Falaram que parece uma caldeirada de estilos artísticos, mas é um exagero que agrada”, declara Genézio, ao relatar a história da casa, que serve como moradia, ateliê e oficina. As peças que mais chamam a atenção, na fachada, são quatro estátuas de escultores que assumem o lugar de colunas, para segurar o telhado, e quatro figuras de corujas, símbolo da sabedoria, no topo. Os olhos dos animais disfarçam lâmpadas que são acesas à noite.
Da esquerda para a direita, no segundo piso, o visitante contempla as estátuas do italiano Michelangelo (1475-1564), do grego Fídias (480 a.C.-430 a.C.), do italiano Bernini (1598-1680) e do brasileiro Aleijadinho (1730-1814). Enfileiradas, atrás dos escultores, há duas deusas (cariátides) e dois deuses (atlantes) também com a função de segurar o telhado, como na arquitetura grega.
Genézio bebeu na fonte do italiano Lourenço de Médici (1449-1492) para fazer o revestimento de paredes internas. “Usei pedras, como no Palácio Pitti, em Florença, que pertenceu à família Médici e funcionava como uma escola de artes. Lá ele recebia escultores, poetas, artistas, a nata da cultura renascentista”, afirma.
Num casamento da arquitetura de Florença com Bom Jardim, ele fez o revestimento de outros trechos da parede com tijolo cerâmico aparente, numa referência à casa infância do artista, coberta com tijolo de barro aparente. Florões renascentistas decoram o teto, como suporte de luminárias em formato de tulipas, criadas por Genézio, que é formado em desenho e artes plásticas pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Ele trabalha com esculturas desde 1990 e tem um currículo tão eclético quanto a residência-ateliê. “Comecei com estilo diverso, depois fiz arte erótica para ornamentação de motéis e de cinco anos para cá produzo arte sacra para igrejas”, revela. “Minha arte sempre foi variada, até sou assim, gosto da diversidade”, destaca.
A casa no bairro de Caxangá, com quintal para o Rio Capibaribe, foi comprada em 1998 para ser o ateliê. “Era de alvenaria e taipa, em ruínas, reformei tudo e aproveitei os 5% que existiam.” Ali, ele modela a argila, faz os moldes em gesso e arremata com a fundição, usando resina, fibra e mármore para dar vida a peças que são vendidas para o mercado interno e também exportadas.
Sobras dos trabalhos artísticos, como cacos de cerâmica, serviram para montar os mosaicos que revestem paredes. Para concretizar o projeto de arquitetura, ele teve ajuda de um amigo, engenheiro calculista. “No interior, eu trabalhava na agricultura de subsistência. Vim ao Recife para estudar, em busca dos meus sonhos. E continuo sonhando até hoje”, destaca o artista.
A ideia de Genézio é concluir a obra nos próximos dois anos e abrir para visitação pública. “Muita gente pede para conhecer, mas quando estou carregado de serviço não tenho como parar e atender a todos”, comenta. O passeio só é liberado no térreo, onde funciona o ateliê e a sala de aula de escultura. A moradia, nos andares superiores, é preservada.
Vizinhos aprovam a casa de arquitetura diferente da rua. “Acho muito bonita, já fotografei e botei no meu Face”, diz o caseiro Joseilson José de Almeida, 27. Visitas podem ser agendadas pelo número (81) 3271-3904.