Pais de criança com AME entram na Justiça contra plano de saúde

Ação é para que o plano de saúde custeie a importação do medicamento Spinraza, usado no tratamento da Atrofia Muscular Espinhal
Ana Roberta Amorim
Publicado em 02/10/2017 às 7:30
Foto: Foto: Guga Matos/JC Imagem


Os pais do menino Daniel, de um ano e meio, diagnosticado com Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo 1 estão no meio de mais uma disputa. Após o diagnóstico do filho, dado quando ele tinha apenas três meses de vida, Gabriel Fernandes e Taciana Spinelli começaram uma corrida contra o tempo em uma campanha na internet para angariar os R$ 3 milhões necessários para custear o medicamento Spinraza, usado no tratamento da doença. Agora, eles entraram com uma ação na justiça para tentar fazer com que o plano de saúde do filho SulAmérica pague pela importação do medicamento, que já teve o registro aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em agosto. O próximo passo é a regulamentação do preço que deve ser cobrado no Brasil.

“A gente pensou muito e vimos que, se a gente tem um plano de saúde e ele está fornecendo o tratamento de Daniel, temos que cobrar do plano de saúde e não do estado, que está aí para as pessoas que não têm condições de pagar por um tratamento desse custo”, explicou o pai. A primeira audiência para decidir o caso ocorreu no último dia 13 de setembro. A segunda, marcada para esta quarta-feira (4), deve decidir pelo pagamento ou não. Por enquanto, o placar está dois votos a um contra o casal.

De acordo com Gabriel, um dos argumentos do SulAmérica para não pagar pela importação é de que o tratamento já é oferecido ao menino, que recebe cuidados 24h por dia por meio de um homecare. “Esse é o principal ponto da questão: não havia tratamento. Há agora. Tudo ao que ele tem acesso, fisioterapia, terapia ocupacional, são cuidados paliativos e que ele responde muito bem, por isso o nosso desespero em obter o medicamento mais rápido possível, porque sabemos que ele vai ter realmente uma evolução”, contou Gabriel.

                                         

Doença e medicamento

Atrofia muscular espinhal (AME) é uma doença genética, degenerativa e progressiva, que causa a perda de neurônio motores da medula espinhal, fazendo com que as pessoas acometidas por essa doença tenham dificuldades de respirar e deglutir, além de realizar movimentos simples, como levantar e abaixar o pescoço. Estima-se que, no Brasil, um em cada 10 mil bebês sejam diagnosticados com a doença.

Atualmente, a única terapia voltada para o tratamento da AME é o medicamento Spinraza, que foi aprovado em agosto pela Anvisa. Isso quer dizer que a comercialização já pode ser feita, dependendo apenas que a decisão sobre o preço seja tomada pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), um departamento da Anvisa.

O Ministério da Saúde informou que a empresa responsável pela fabricação do Spinraza ainda está na fase de envio dos documentos necessários para a fixação do preço. A partir disso, e dependendo em que categoria do medicamento seja classificado, o valor sugerido demora entre 60 e 90 dias para ser analisado e aprovado. A comercialização, de fato, é feita em um acordo entre o laboratório e as farmácias. A Biogen Brasil, empresa fabricante do Spinraza, explicou que a venda não será realizada em farmácias, por ser um produto aplicado diretamente na medula, o que requer assistência hospitalar.

Já para ser disponibilizado ao pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), o medicamento precisa passar por mais uma etapa, conforme a Lei 12.401/2011. De acordo com o Ministério da Saúde, o Spinraza deve ser analisado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), que vai avaliar questões como custo-benefício e se não há outro medicamento que tenha a mesma eficácia e seja mais barato. Por isso, o preço é um ponto importante.

Responsabilidade dos planos de saúde e do Estado

De quem é a responsabilidade de fornecer um medicamento com esse custo, os planos de saúde ou o Estado? A coordenadora executiva da Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de Saúde de Pernambuco (Aduseps-PE) René Patriota, comenta que quem deveria pagar primeiro por um tratamento seria o Estado.

No entanto, se a família tem o plano e, no caso de Daniel, que entrou na SulAmérica com 10 dias de nascido, o dever seria do próprio plano custear o medicamento, assim como todas as outras despesas, fornecidas com o homecare (auxílio domiciliar) que acompanha o menino. “Na hora que o governo autoriza a entrada de um plano de saúde, ele está transferindo a responsabilidade para essa empresa. Então, a responsabilidade da criança é da SulAmérica”, afirmou a coordenadora. “Se a criança entrou antes de 30 dias de nascida, ela tem direito. É um tratamento muito caro, mas a vida da criança depende disso”, pontuou.

No entanto, ela questiona que, caso o Spinraza não seja aprovado para a incorporação no SUS, pacientes atendidos exclusivamente por esse meio não terão acesso ao medicamento. “Como é que eu posso tomar um remédio que um paciente do SUS não pode tomar?”

Patriota rebate também o argumento que a operadora de saúde afirma que o Spinraza não possui cobertura contratual na Lei dos Planos de Saúde. De acordo com ela, não existe nomes de medicamentos na lei. “Saúde é um direito indisponível, a gente não sabe quando vai adoecer ou quando vai morrer. Não depende da vontade do paciente. O plano de saúde tem que estar preparado”, afirma.

Veja também
últimas
Mais Lidas
Webstory