Novos esqueletos encontrados em cemitério colonial de Abreu e Lima

A necrópole fica nas terras do antigo Engenho Jaguaribe, no Grande Recife, que se manteve em atividade do século 16 ao século 19. Esqueletos serão examinados na UFPE
Cleide Alves
Publicado em 06/09/2019 às 7:53
Foto: Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem


Cinco esqueletos humanos completos e várias ossos isolados foram desenterrados na zona rural do município de Abreu e Lima, no Grande Recife. Longe de ser um caso de polícia, os sepultamentos preservam informações que auxiliarão arqueólogos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) a conhecer um pouco mais sobre a história da ocupação de uma das primeiras áreas de povoamento do Litoral Norte do Estado.

As ossadas encontram-se no cemitério do antigo Engenho Jaguaribe, implantado no século 16 e que se manteve em atividade até o século 19, no período colonial brasileiro. Estudos mais simples conseguem estimar sexo, idade e estatura das pessoas enterradas no cemitério colonial, informa Andrea Lessa, professora do Museu Nacional do Rio de Janeiro, que está em Abreu e Lima acompanhando a pesquisa arqueológica desenvolvida pela UFPE.

A datação por radiocarbono, diz ela, pode indicar em que época as pessoas viveram. E a partir da análise dos esqueletos é possível saber o que comiam, doenças que contraíram e o estilo de vida que levavam, acrescenta a arqueóloga, especialista em bioarqueologia com experiência em estruturas funerárias e sepultamentos. As ossadas foram retiradas nessa quinta-feira (5) e transferidos para o câmpus da UFPE na Cidade Universitária, Zona Oeste do Recife, onde serão examinadas.

Ossadas foram recolhidas na última quinta-feira (5) - Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem
Material será analisado por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) - Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem
15 pesquisadores da equipe permanente e 15 alunos participaram do estudo - Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem
Pesquisa na região integra o Programa de Preservação Ecológica e Cultural da Sesmaria Jaguaribe - Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem
Os esqueletos completos são de adultos - Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem

 

De acordo com Andrea Lessa, os esqueletos completos são de adultos e começam a aparecer a 30 ou 35 centímetros do atual nível do solo. “É uma profundidade muito pequena”, observa. Mas levando-se em consideração que houve a abertura de uma estrada nas terras do antigo engenho, a camada de solo sobre os sepultamentos poderia (ou não) ser maior no passado, pondera.

Ritual cristão

Todos foram sepultados no sentido paralelo à entrada da capela do engenho, dedicada a Santo Antônio. “Normalmente, nos enterros eclesiásticos, a orientação da cabeça ou dos pés é voltada para o altar”, relata Andrea Lessa. Os ossos desarticulados do cemitério colonial de Abreu e Lima estão a cerca de um metro de profundidade, são mais antigos e devem ter sido remexidos pelos enterros mais novos (os esqueletos completos). Os pesquisadores recuperaram crânio, mandíbula, fêmur e fragmentos de ossos.

“Encontramos esqueletos com os braços cruzados sobre a pelve, o tronco ou o peito, indicando sepultamento com ritual cristão”, afirma. Não há vestígios de caixões ou de objetos associados às ossadas, como botões, peças de metais e colares. “O caixão surge em meados do século 19 para as famílias de maior poder aquisitivo, por ser um item caro. Inicialmente, servia apenas para o transporte dos corpos, não era usado no enterro”, explica a arqueóloga.

No período histórico e pré-colonial necrópoles não costumavam ter marcação individual para os enterros e a reutilização dos espaços acontecia com frequência, continua Andrea Lessa, que veio a Pernambuco a convite da arqueóloga da UFPE Cláudia Oliveira, coordenadora das pesquisas no Engenho Jaguaribe. A professora do Museu Nacional disse que ainda é cedo para afirmar se as pessoas enterradas seriam escravos ou faziam parte da população livre e pobre.

Engenho Jaguaribe

Cláudia Oliveira realiza escavações no engenho, uma das unidades da Sesmaria Jaguaribe, desde 2015. Por falta de recursos, o trabalho é executado aos poucos, em ações com cerca de 30 dias de duração. Ela descobriu o cemitério colonial de Abreu e Lima em julho do ano passado. Na época, afloraram três esqueletos completos e ossos isolados. “Retornamos em 19 de agosto deste ano para novas escavações e encerraremos essa etapa amanhã (esta sexta-feira, 6)”, diz a arqueóloga da UFPE.

O cemitério fica próximo da porta de entrada da Capela de Santo Antônio, hoje em ruínas. “Ampliamos a escavação para tentar delimitar a área dos sepultamentos. Achamos uma estrutura de pedra calcária que pode ter sido o armazém de açúcar do engenho, o trecho localizado do cemitério encontra-se entre a estrutura e a capela, mas a área escavada ainda é muito pequena”, declara Cláudia Oliveira. Possivelmente há mais esqueletos no terreno.

Formada pelos Engenhos Jaguaribe, Inhamã (Igarassu) e Paratibe, a Sesmaria Jaguaribe ocupava uma área doada por Duarte Coelho, primeiro donatário da Capitania de Pernambuco, a Vasco Fernandes de Lucena em 1540. A pesquisa na região integra o Programa de Preservação Ecológica e Cultural da Sesmaria Jaguaribe, lançado por Cláudia Oliveira em 2005.

O trabalho finalizado nesta sexta-feira (6)  tem apoio do Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura), da Prefeitura de Abreu e Lima e do Departamento de Arqueologia da UFPE. Participaram do estudo 15 pesquisadores da equipe permanente e 15 alunos vinculados à graduação e pós-graduação em arqueologia da UFPE, ao Instituto Federal de Pernambuco (IFPE) e ao Museu Câmara Cascudo (RN) que fizeram um minicurso de escavação de estruturas funerárias conduzido por Cláudia Oliveira, Andrea Lessa e Sérgio Monteiro, coordenador do Laboratório de Arqueologia Biológica e Forense (Labifor) da UFPE.

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