Como estão os irmãos albinos de Olinda

Dez anos depois da primeira reportagem, eles cresceram e ainda enfrentam dificuldades
JC Online
Publicado em 28/09/2019 às 19:59
Foto: Foto : Brenda Alcântara/ JC Imagem


Do dia 30 de agosto de 2009 até hoje, 29 de setembro de 2019, passaram-se pouco mais de dez anos. Naquela data, o JC publicava a história dos três irmãos albinos nascidos em uma família pobre de negros e mulatos na periferia de Olinda, no Grande Recife: Rute Caroline, então com 10 anos, Estefane Karolyne, oito, e Kauan José, cinco. A matéria – assinada pelo repórter João Valadares e pelo repórter fotográfico Alexandre Severo – mostrava a dupla privação que viviam os irmãos: premidos pela miséria do ambiente e sem ter ao menos a condição de brincar na rua como as demais crianças da comunidade do V-8. Motivo: albinos não podem ser expostos à luz do sol, sob pena de terem graves lesões na pele, inclusive câncer. 

A reportagem teve repercussão nacional. Desconhecidos, como uma “madame rica de São Paulo”, como diz Rosemere Andrade, mãe dos albinos, compraram as camas e colchões que nem toda família tinha – alguns dormiam no chão. Celebridades, como o apresentador Gugu Liberato, chegaram junto: através do programa dele, a família ganhou a até então inimaginável casa própria. Passaram a ter um pouco mais para comer. Um pouco mesmo, pois havia dias de não ter nada. E foi num desses que a história dos irmãos albinos quase foi interrompida sem que o Brasil a conhecesse.

Em um momento de desespero por não ter o que comer para dar aos cinco filhos (além dos três albinos, tinha dois outros estava grávida da caçula) a mãe das crianças decidiu que nem ela nem eles passariam mais fome. Separou o resto dos legumes – a única coisa no armário – e cozinhou. Colocou chumbinho na comida e preparou-se para comer e dar às crianças. Quando Kauan pegou a primeira colher para levar à boca, ela desistiu. Chorando, jogou tudo fora e abraçou os filhos. Refeita do instante de desespero absoluto, deu uma oportunidade à vida.

E a vida, de um jeito torto e inusitado, sorriu para a família. Tudo por causa do dia em que Kauan, aos cinco anos, fugiu de casa. Hiperativo, o garoto saiu correndo, sob o sol escaldante, pelas ruas da V-8, desafiando a própria condição. Foi quando a equipe do JC, que estava ali para outra pauta, o avistou. “Severo viu Kauan e perguntou de quem era aquela criança. Perguntou se poderia bater umas fotos”, recorda, hoje, Rute.

Pausa para um óbvio esclarecimento. Eles não são mais crianças. Rute, a mais assertiva e brigona, vai fazer 21 anos e tem uma filha, Cristina, de dois anos. Estefane tem 18 e é a mais observadora e introvertida dos três. Aos 15 anos (completa 16 amanhã), Kauan continua com a mesma energia que o fez fugir de casa naquela manhã de agosto de 2009 - extrovertido, fala e gesticula sem parar. 

A “fama” trouxe um pouco mais de qualidade de vida. Não muito, que fique bem claro. Apenas a miséria bruta, daquelas de não ter comida na mesa, foi embora. “Hoje a gente toma café, almoça e janta”, lembra Estefane. Desempregada, Rosemere, com incríveis 36 anos para quem já viveu tanta coisa, sobrevive do Bolsa Família e do aluguel da casa que a família ganhou do programa do Gugu. Moram em um apartamento térreo dado pela prefeitura de Olinda, em um habitacional popular, no bairro de Peixinhos. A mãe, que o desespero pela miséria quase levou a uma tragédia, é idolatrada pelos filhos. “Ela é nosso tudo. É uma leoa, lutou e luta muito por nós”, diz Rute, emocionada.

O protetor solar fator 99 é o principal passaporte para o mundo lá fora. Sem ele, nada de sair. Acontece que o produto é caro: pouco mais de R$ 100 por um frasco que não dura uma semana – para cada um deles. A prefeitura de Olinda passou um bom tempo sem distribuir a loção, mas promete regularizar o processo. “Eles precisam passar por médico para atualizar a receita, com isso, podem receber o protetor”, garante a secretária executiva de atenção e vigilância à saúde de Olinda, Daniela Travassos.

A gratidão à equipe do JC é expressa em palavras e nas fotos que ilustraram a matéria de 2009, impressas e colocadas em quadros nas paredes do pequeno apartamento térreo. Os nomes de João e, principalmente, de Severo, vêm várias vezes à tona. O repórter fotográfico foi uma das vítimas da tragédia com o avião do ex-governador Eduardo Campos em agosto de 2014, quando morreram, além dos dois, cinco pessoas, entre políticos, pilotos e assessores. “A gente foi ao enterro. Até hoje temos amizade com Dona Rita, mãe de Severo, e com Patrícia, irmã dele”, diz Rute.

Quem quiser e puder ajudar a família de Rosemere Andrade pode contactar Estefane pelo telefone (081) 98357-7186.

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