Uma escola e uma Unidade de Saúde da Família utilizadas por indígenas no sítio Bem Querer de Baixo, em Jatobá, Sertão de Pernambuco, foram atingidas por um incêndio na madrugada desta segunda-feira (29). O povo Pankararu utilizou o Facebook para denunciar o caso, que está sendo apurado pela Polícia Civil. Comentários nas redes sociais sugerem que o incêndio tenha motivação política, mas o delegado responsável pela investigação nega. A suspeita inicial é de que trata-se de uma ação de posseiros que foram retirados do território.
Em uma nota intitulada "A barbárie começou", publicada no Facebook, o povo Pankararu afirmou que os moradores da área acordaram "com uma escola e um PSF destruídos pelo fogo do ódio, preconceito e da intolerância".
Nos comentários da publicação, usuários da rede social sugerem que o incêndio esteja relacionado a eleição de Jair Bolsonaro (PSL). "Quando o líder eleito coloca que 'não haverá mais terra para os povos indígenas', seus seguidores se solidarizam com ele. Como 'a terra' apenas os órgãos 'podem' tirar, eles começam tirando outros bens do povo que podem ser alcançados com suas mãos", diz um dos comentários.
O delegado Daniel Angeli, titular da delegacia de Jatobá, responsável pela investigação, nega, até o momento, que o incêndio esteja relacionado ao momento político do País. "Não tem motivação política ou eleitoral nenhuma", afirmou. Segundo ele, a suspeita inicial é de que o incêndio tenha sido uma consequência do processo de retirada de posseiros do território.
"Apesar de ser preliminar, a gente suspeita de ser uma consequência do procedimento de expulsão dos posseiros da comunidade indígena. O juiz determinou a reintegração de posse em favor dos indígenas e posseiros que moravam lá foram expulsos e não tiveram indenização por benfeitorias", explicou o delegado.
Segundo o delegado, no local incendiado, foram encontrados recipientes contendo álcool e uma das janelas da unidade de saúde foi quebrada.
A área atingida pelo fogo está isolada e deve passar por perícia do Instituto de Criminalística (IC) na manhã desta terça-feira (30). As primeiras oitivas também devem acontecer nesta terça-feira (30).
O embate judicial entre os posseiros e os indígenas já dura mais de 25 anos. Em junho deste ano, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) negou provimento a um agravo de instrumento e determinou o cumprimento de decisão do Juízo da 38ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco (SJPE), na qual se estabeleceu a desocupação da Terra Indígena Pankararu, no prazo máximo de 90 dias, pelos ocupantes não índios.
No dia 13 de setembro, a Polícia Federal de Pernambuco (PF) com apoio de policiais militares, realizou a Operação Pankararu cujo objetivo era a desocupação de 12 imóveis indígenas na região localizada entre Tacaratu, Jatobá e Petrolândia. Na data, a PF informou que sete dos 12 imóveis foram desocupados.
Um levantamento realizado pela Fundação Nacional do Índio (Funai), a pedido da Justiça Federal, identificou que, das 346 famílias não-indígenas com posses na região, 259 não residem nas terras, possuindo imóveis nas cidades de Petrolândia, Tacaratu e Jatobá que seriam utilizados apenas como local de lazer para feriados e finais de semana.
De acordo com o TRF5, a Funai também ficou responsável por indenizar as famílias posseiras que realizaram benfeitorias na terra que ocuparam. Algumas dessas indenizações já teria sido pagas e todos os posseiros foram realocados no PA-Abreu e Lima, um assentamento localizado em Tacaratu, Sertão do Estado. Apesar disso, segundo o tribunal, posseiros apresentaram insatisfação com a localização do município, que seria muito distante, e com as terras, que seriam improdutivas.
Segundo uma indígena de 25 anos, que prefere não ser identificada por questões de segurança, os moradores da localidade já foram alvo de ameaças feitas por posseiros. "Tiveram várias ameaças. Já depredaram a tubulação que abastece as aldeias, já houve ameaça de envenenamento, disseram que iriam colocar veneno na água".
Na nota, o povo Pankararu afirma que a unidade de saúde realizava cerca de 500 atendimentos mensais. De acordo com a mulher, a Escola Municipal São José, atingida pelo incêndio atendia crianças que cursam o ensino fundamental. "O que a gente pede é respeito, tolerância, que as pessoas olhem com humanidade, independente de ser uma comunidade indígena. São crianças sem aula, idoso sem atendimento. Por isso o que a gente pede é justiça para que tudo isso se resolva", acrescentou.