Os dados preliminares do primeiro estudo científico sobre as complicações neurológicas que apareceram no período da tríplice epidemia (vivenciado em 2015 e 2016) revelam que nove pacientes evoluíram com doença neuroinvasiva causada pela infecção simultânea pelos vírus da dengue, chicungunha e zika. Os achados foram apresentados na quinta-feira (8), durante encontro entre pesquisadores do Grupo Neurozika, que congrega especialistas da Fiocruz Pernambuco e do Serviço de Neurologia do Hospital da Restauração (no Derby, área central do Recife), onde o evento foi realizado.
“Acabamos de analisar uma grande série de casos: dos 212 pacientes investigados com comprometimento neurológico, 140 estão associados a arboviroses. A maioria deles apresentou coinfecção. Ou seja, são pessoas que adoeceram por mais de um vírus ao mesmo tempo”, informa a médica Fátima Militão, pesquisadora do Departamento de Saúde Coletiva da Fiocruz Pernambuco.
A especialista acrescenta que, entre os 140 casos, 67 estão associados a coinfecção. “Desses, 50 foram por zika e chicungunha, que se somam aos outros nove relacionados ao adoecimento simultâneo por dengue, chicungunha e zika. É provável que (essas pessoas) tenham sido (picadas) por mosquitos infectados por vírus diferentes. E em oportunidades próximas, picaram o mesmo paciente.”
Durante o encontro, Fátima destacou que o grupo agora quer saber o potencial de agressividade da tripla (e também dupla) infecção. “Estamos agora investigando se esses casos são mais graves e como esses pacientes devem evoluir, em termos de sequelas, a médio prazo.”
Em busca de novos caminhos que possam dar pistas para elucidar dúvidas que ainda permanecem obscuras, o Grupo Neurozika estabeleceu uma cooperação com pesquisadores ingleses. Na quinta-feira (8), no Hospital da Restauração (HR), o neurologista Tom Solomon, da Universidade de Liverpool (Inglaterra), ministrou palestra sobre o cenário da complicações neurológicas que ele tem pesquisado, com destaque para a encefalite japonesa, endêmica em países asiáticos. “Ainda é cedo para apontarmos se a evolução dos pacientes com encefalite por zika é diferente da causada pelo vírus da encefalite japonesa”, diz Solomon, que vê enigmas, assim como especialistas brasileiros, nas questões sobre as manifestações graves e neurológicas associadas à chicungunha e zika.
“Os pesquisadores da Universidade de Liverpool estão numa cooperação de trabalho conosco. Eles têm tecnologia para fazer a parte laboratorial que pode nos ajudar muito a entender todo esse processo de infecção e os mecanismos imunológicos relacionados às arboviroses”, reforça a médica Maria Lúcia Brito, chefe do Serviço de Neurologia do HR, referência no tratamento de pacientes com comprometimento neurológico causado por arboviroses.
Na quinta-feira (9), no HR, um jovem de 13 anos diagnosticado com a síndrome de Guillain-Barré, doença neurológica autoimune que pode levar à paralisia, recebeu alta após 15 dias em tratamento no hospital. Os sintomas começaram com fraqueza nas pernas. “Ele não conseguia ficar em pé. Fez exame e apresentou plaquetas baixas (um sinal de arbovirose)”, contou a mãe do jovem, que seguiu para casa caminhando. “É como se eu estivesse andando pela primeira vez”, comemorou.