Após uma série histórica de queda da mortalidade infantil, Pernambuco voltou a registrar aumento nos casos entre 2015 e 2016. O crescimento de quase 7,5% é superior ao apontado pelo Ministério da Saúde (MS) no cenário nacional, de 5%. Para especialistas, vários fatores estão associados ao aumento, como a epidemia da síndrome congênita do zika vírus. Mas um, em especial, preocupa: o índice de cobertura vacinal em gestantes. Em 2016, ano com maior número de mortes em Pernambuco, apenas 49,22% das grávidas receberam a tríplice bacteriana (dTpa), que protege mãe e bebê contra difteria, tétano e coqueluche. A meta é de 95%.
Além da dTpa, o calendário da gestante inclui as vacinas contra Influenza e hepatite B. Em 2018, de acordo com a Secretaria Estadual de Saúde (SES), o grupo das gestantes bateu a meta de 90% de cobertura. A dTpa ficou em 43,99%. O órgão não tem dados sobre a cobertura vacinal da hepatite B.
A professora Isis Fragoso, 45 anos, mãe de João, de dois meses, conta que tomou todas as vacinas durante a gravidez. “Fui orientada pelo médico. Em momento nenhum pensei que faria mal ao bebê.” A assistente administrativa Marília Lima, 31, grávida de 9 meses de Ellena, foi vacinada logo no início da gestação. “Só penso em prevenir a mim e a bebê.” A confeiteira Nathália Lira, 28, sequer precisou de orientação. Quando descobriu a gravidez de Camile, procurou a rede pública. “Sabia que faria bem a ela.”
Mas a situação de Isis, Marília e Nathália não reflete a realidade da maior parte das mulheres. “A cobertura não é a ideal. Cerca de 40% das gestantes recebem a dTpa. Essa vacina foi introduzida em 2014 e oferece proteção contra a coqueluche a bebês nos primeiros meses de vida. Após o parto, a criança só vai estar protegida aos 6 meses. Em 2016, não tivemos óbito por coqueluche, mas registramos adoecimento. Se as gestantes tivessem sido vacinadas, não haveria esse quadro. São situações provocadas pela falta de informação e de orientação”, argumenta Ana Catarina de Melo, coordenadora do Programa de Imunização de Pernambuco.
A dTpa deve ser aplicada após a 20ª semana de gravidez. As demais vacinas podem ser tomadas a qualquer momento da gestação.
Para especialistas, apesar da explosão dos casos de microcefalia, a síndrome do zika não foi determinante para o aumento. “Não podemos justificar o crescimento por causa dela. Temos que chamar atenção para as causas evitáveis. Estamos vendo o retorno de mortes causadas por diarréia e infecções respiratórias”, destaca Jane Santos, especialista em saúde do Unicef em Pernambuco.
A pediatra Analíria Pimentel cita motivos para o aumento da mortalidade. “Temos o desemprego, a falta de leitos e a deficiência do pré-natal. Também é comum encontrar casos de sífilis em bebês.” No mesmo período em que a mortalidade cresceu, o número de casos de sífilis congênita (quando há transmissão direta da mãe para o bebê), aumentou 10,56% em Pernambuco.
“É um problema multifatorial, que exige ações específicas em saúde. As grávidas não têm pré-natal adequado e as maternidades estão lotadas”, aponta Eduardo Jorge da Fonseca, presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco. A SES admite que o cenário não é ideal. Em nota, o órgão afirmou que o Estado realiza 60% dos partos, quando deveria atender apenas aos casos de alto risco.
Quanto ao aumento de mortes, Patrícia Ismael, diretora de ações estratégicas e vigilância epidemiológica da SES, defende que existe uma explicação matemática. “Está no próprio cálculo do indicador. Muitas mães adiaram a gravidez por conta da microcefalia, então houve redução no número de nascidos vivos, que está no denominador do cálculo. Quando ele é menor, a taxa acaba sendo maior.”