Passava das 20h, quando o público ainda formava generosas filas diante do Teatro de Santa Isabel. Com lotação esgotada, e gente ainda voltando da porta, a abertura do 12º Festival de Circo do Brasil, sexta à noite, foi um tremendo sucesso de público. Cúmplice, a plateia aplaudiu cada palavra da produtora Dani Hoover, da Luni Produções, durante o discurso de apresentação do evento.
“Este ano, resolvemos dizer que somos um festival de circo portátil, para não dizer que somos pequenos”, disse ela, a respeito das
dificuldades da produção que concentrou a programação com espetáculos mais simples, com menos estrutura, praticamente conduzindo por duplas. Mas a diminuição da qualidade não significou perda de qualidade.
A primeira atração da noite no palco, Stefano Catarinelli, artista italiano, ator, comediante e clown, da Companhia Giullari Del
Diavollo, magnetizou a plateia com um humor de camadas inteligentes em que picardia e erotismo, horando a grande tradição clownesca, eram dosadas com ingenuidade e lirismo.
No palco, apenas a apresentação de um palhaço malabarista e sua ajudante. No desenrolar, contudo, a dupla lançava mão de piadas com expectativas invertidas, interação com o público, recrutado ao palco gente da plateia para pequenos constrangimentos consentidos. Sua parceria, de uma técnica excepcional a serviço da poética, a brasileira Rose Zambeze ofereceu momentos de puro ilusionismo cênico com a manipulação de bolas de malabares que pareciam ter vida própria. Um espetáculo simples, denso, felliniano e que resumiu bem o espírito do festival que segue ao longo da semana.
Em seguida, a segunda apresentação da noite trouxe a Compagnie Sôlta, uma companhia de circo franco-brasileira, parceria entre o ator, bailarino e trapezista francês Tom Prôneur e a bailarina e trapezista brasileira Alluana Ribeiro. Um espetáculo circense, impregnado de romantismo contemporâneo, que poderia facilmente estar escalado num festival de danças.
“Apesar”, nome do espetáculo, é, de fato, uma peça de dança contemporânea, com recursos do balé clássico em que um grande mastro pendular, por onde os artistas dançavam verticalmente, como se voassem, dá o aporte circense para contar a história de um casal que “se esqueceu de comportar normalmente”. O quebrar constante das regras da gravidade trazia o peso como metáfora – física e sentimental. Tanto quanto a primeira dupla, foram ovacionados com generosidade. Antes de abrirem as portas do teatro, o público pôde conferir ainda a performance de Rufino, clown italiano da trupe Gran Teatro Dentro. A crise, afinal, potencializou a poética dos espetáculos mais delicados.