No ano passado, o grandioso Cais do Sertão, impressionante museu de conteúdo material e, sobretudo, multimídia, sobre o imaginário de Luiz Gonzaga e da cultura nordestina, no Porto do Recife, ficou um mês de portas fechadas. Então administradora da instituição, a Fundação Gilberto Freyre alegava problemas de repasse nos recursos do convênio com o Governo do Estado. Em outros momentos, funcionários pararam de trabalhar por falta de pagamentos. Desde que a Secretaria de Turismo do Estado assumiu a gestão direta, o Cais deixou de ter problemas de gestão no noticiário. E está prestes a iniciar nova fase. Literalmente: até o fim do mês, deve ter inaugurada sua segunda etapa.
No projeto do arquiteto Marcelo Ferraz, o mesmo que trabalhou com Lina Bo Bardi na construção do Museu de Arte de São Paulo, a nova etapa do Cais do Sertão consiste numa gigantesca estrutura de quatro pisos suspensa sobre um vão, à semelhança do Masp, de quase quatro mil metros quadrados, como prolongamento da primeira.
Entre o prédio e o mar do Porto do Recife, uma enorme parede de combogós projeta, através da luz, sombras que formam desenhos no piso, reproduzindo o chão rachado pela seca. “Como no Masp, esse vão livre será usado para eventos, como, por exemplo, ensaios de quadrilhas”, antecipa Manuela Marinho, a antiga executiva do Prodetur, o Programa de Desenvolvimento do Turismo, em Pernambuco, titular da pasta de Turismo no Governo do Estado desde que Felipe Carreras pediu exoneração. No piso térreo, funcionará também um café, ainda sem empresário definido. “Abriremos uma licitação”.
No último piso do prédio, numa área de 400 metros quadrados, um restaurante está sendo finalizado. Além da área coberta, a estrutura conta com um gazebo para mesas no jardim que, diante do mar, reproduz a caatinga, como se, confirmando a frase antológica, o sertão encontrasse o mar. A primeira licitação para ocupação do empreendimento, no entanto, não teve qualquer procura. Nenhum empresário mostrou interesse, levantando a hipótese de que tenha havido uma espécie de pressão silenciosa para que seja rebaixado o aluguel previsto em cerca de R$ 20 mil. “Vamos publicar outro edital de concorrência”, adianta a gestora.
As obras da nova etapa começaram em 2014. De lá para cá, foram consumidos cerca de R$ 25 milhões, dinheiro cedido pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) através do Prodetur. Na cartilha do BID, ceder não é doar. “Esse dinheiro não é doação, o Estado já começou a pagar e tem até dez ou 15 anos para quitar”, esclarece “Com a obra, o Cais deixa de ser apenas um museu e vira um grande centro cultural, com várias funções”, ela diz. No andar imediatamente abaixo do restaurante está um auditório-teatro com capacidade para 232 pessoas, com estrutura preparada para atender à nova lei de acessibilidade. A sala tem arquitetura também compatível para usos de teatro e cinema. “Futuras parcerias podem viabilizar esses usos”, diz ela.
Nos dois primeiros pisos, estão as salas de exposição: quatro no total. A Sala São Francisco (de 444 m², climatizada e com iluminação básica de exposição) é pensada para o recebimento de exposições temporárias. Antes mesmo na inaguração oficial da segunda etapa, hospeda, até este domingo, a exposição itinerante do Museu do Futebol de São Paulo. A partir de julho, a Sala Pajeú (de 146 m²), deve receber uma exposição sob curadora Isa Ferraz chamada Do Sertão ao Manguebeat. Na Sala Moxotó (146 m²), uma exposição das sanfonas de Cesar Prezzi, incluindo a primeira Todeschini de Luiz Gonzaga. “Construir não foi o mais difícil. O mais difícil é estabelecer boas parcerias para manter o Cais bem ocupado”, reflete a secretária.