Outra vez, sem previsão de ver uma luz sobre a tela. Com obras que se arrastam, desde 1998, por várias gestões municipais e prazos nunca cumpridos de inauguração, o histórico Cine Olinda, no Carmo, já não tem, de novo, expectativa de ter as portas abertas para voltar a funcionar. Há cerca de duas semanas, discretamente, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) decidiu suspender o contrato com a empresa pernambucana DSH, responsável pelas obras de finalização do prédio. "Eles não concluem o trabalho, não dão explicações sobre os atrasos, nem pediram, desta vez, aditamento do prazo", disse, ao JC, Elízio Luiz, novo superintendente do IPHAN em Pernambuco.
A DSH ganhou a última licitação para fazer as obras de finalização no prédio do cinema fechado desde os anos 1970. Com previsão de ter sido concluído no final de 2014, o contrato com a DSH teve valor total de R$ 1,257 milhão. Cerca de R$ 593 mil, segundo o Iphan, já foram pagos à empresa antes da suspensão do contrato. Com a ruptura, cerca de R$ 800 mil voltam para Brasília sem a certeza de que possam ser de novo aplicados no Cine Olinda.
"Não é, realmente, um bom momento para se perder verba", diz Fernando Augusto, diretor do Iphan no escritório de Olinda. "Vamos analisar para saber realmente o que foi feito em obras e se elas equivalem ao que já foi pago à empresa", diz ele. Com o impasse, nenhum dos envolvidos sabe ainda o que fazer com o cinema. O Iphan tentou entregar as chaves do prédio em art-déco. Mas o prefeito Renildo Calheiros se negou a recebê-las.
"Não temos estrutura nem pessoal para garantir a guarda do cinema", diz o superintendente do Iphan. "Não podemos simplesmente assumir o problema sem nenhuma alternativa de caminho a seguir, sem que os envolvidos assumam as responsabilidades", contrapõe Claudia Rodrigues, secretária executiva de Patrimônio de Olinda.
Diante da situação, outras verbas importantes para o cinema podem ser inviabilizadas. Uma emenda parlamentar previa R$ 400 mil para, entre outros, mobiliar o cinema depois da reforma. "Mas sem a finalização das obras de engenharia civil, não temos a certeza de que poderemos usar essa emenda para esse ou quaisquer outros fins", diz Claudia Rodrigues.
Sócio-diretor da DSH, Francisco Barros garante que quase 80% das obras previstas em contrato foram executadas. "Em termos estruturais, a obra está concluída.
Faltam apenas elementos de sobrepor, ar condicionado e iluminação, por exemplo...toda a parte hidráulica e elétrica está pronta", diz o empresário. "Falta muito pouco pro cinema voltar a funcionar", ele continua, responsablizando o atraso nos repasses de verba como a causa dos atrasos no cronograma das obras. "Até 2014, o Iphan pagava tudo em dia. Mas começou a atrasar muito. O contrato prevê que os repasses sejam quinzenais, e eles estavam fazendo, quando muito, o repasse a cada cem dias. Não há, hoje, empresa no Brasil que consiga sustentar uma situação como essa. Não há como adiantar verba do caixa sem a garantia de recebimento com data certa".
Fernando Barros diz ainda que, do total de R$ 593 mil que constam como pagos à empresa, cerca de R$ 200 mil não foram ainda repassados pelo Iphan pernambucano.
"Como não conluíram tudo o que estava em contrato, vamos analisar pra saber se tem ainda algo a receber ou ressarcir", diz Fernando Augusto, do Iphan olindense. "Desde outubro do ano passado nós informamos que não teríamos como continuar com as obras sem os repasses. Nunca obtivemos qualquer retorno. Lá, as coisas funcionam a passos de tartaruga", diz o empresário, informando que, se o contrato e os repasses forem revalidados, a DSH segue com a obra.
Enquanto Iphan, Prefeitura de Olinda e a empresa DSH não se entendem sobre o destino do Cine Olinda, o outro cinema de rua do Sítio Histórico também agoniza. Inaugurado ainda em 1942 com vida curta e intensa pelos 40 anos seguintes, o antigo Cine Duarte segue como um conjunto insalubre de ruínas no Varadouro. Desde o começo de 2014, no entanto, o prédio teve o projeto de reforma no valor de R$ 4,7 milhões enviado para o Ministério do Planejamento como parte do conjunto de 14 obras previstas para reforma através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das Cidades Históricas, em Olinda.
O projeto prevêa a instalação de um cine-teatro de convenções no Duarte Coelho. “Teremos palco, camarim e estrutura para eventos e apresentações teatrais”, diz o secretário de Cultura de Olinda, Lucilo Varejão. Em 1998, a Prefeitura de Olinda chegou a iniciar uma obra de requalificação no local, mas teve que interrompê-la por falta de recursos. A gestão municipal, então, recebeu R$ 700 mil do Governo Federal para recuperar o imóvel. Três anos depois, uma CPI foi aberta para investigar a ex-prefeita e possíveis desvios de verba. A investigação, tal como as obras, não foi concluída. Os poucos equipamentos então colocados no cinema foram saqueados.
Apesar dos cortes gigantescos no Orçamento Geral da União anunciados pelo Governo Federal há um ano, não houve informação oficial de que o programa de recuperação do patrimônio histórico brasileiro sofreria redução. Mas o fato de o Ministério do Planejamento ter passado um ano apenas para concluir, há duas semanas, a análise do projeto de reforma enviado pela Prefeitura de Olinda leva a crer que a disponibilidade orçamentária já não é a mesma. "Além de ter levado um ano apenas para analisar o projeto e sua documentação, o Ministério tem por hábito pedir atualização de orçamento. Se isso ocorrer, o prazo pode ir se estendendo para muito além do esperado", diz a secreátria municipal Claudia Rodrigues. Olinda, enfim, ainda não sabe quando voltará a ter um de seus cinemas funcionando. A última projeção de um filme num cinema da cidade histórica aconteceu ainda nos anos 1980.