Em 2000, o X-Men de Bryan Singer provocou o tsunami de filmes de super-heróis, dando início a uma franquia que, entre idas e vindas, consolidou ainda mais o universo dos mutantes da Marvel como referência dentro desses segmento da cultura pop. Como pioneira, a saga experimentou grandes filmes, medíocres filmes, uma reformulação de seu universo e algumas despedidas.
Amanhã, estreia mais um capítulo desta saga, certamente um dos mais densos e bem amarrados dentro do escopo desse universo. Simon Kinberg, envolvido com a série desde 2007, seja como roteirista ou produtor, assume agora a direção de X-Men: Fênix Negra, mostrando que conhece profundamente aqueles personagens que parecem estarem sempre lutando contra ameaças de ordem física, social e psicológica.
Depois dos eventos do fraco X-Men: Apocalipse, retornamos para a vida na escola do Professor Xavier (James McAvoy), contando com uma boa aceitação dos mutantes perante a sociedade. O atual time de X-Men é convocado para uma missão de emergência no espaço, atuando no resgate de uma equipe de astronautas que passou por um acidente. Durante a empreitada, a jovem Jean Grey (Sophie Turner) acaba absorvendo um misterioso fenômeno cósmico, ampliando seus poderes, mas também diminuindo seu controle sobre eles, colocando em risco pessoas próximas. As coisas se complicam ainda mais com a chegada de visitantes extraterrestres interessados no poder da moça.
Kinberg parece entender que dentro do cardápio de personagens interessantes no mundo dos mutantes, principalmente nesta segunda fase iniciada com Primeira Classe (2011), há aqueles que já foram bem digeridos e aqueles com potencial dramático ainda não tão explorados. Que o eixo narrativo esteja agora focado em Jean Grey – impulsionado pela excelente capacidade de Sophie Turner em expressar poder e confusão – acaba por dar uma densidade psicológica e um tom sombrio que se equilibram bem com os aspectos de caráter mais físico e espetaculares do filme de herói.
A partir daí, o roteiro ganha em ritmo ao conseguir desenvolver motivações para personagens já bem explorados em outros filmes, como o Erik/Magneto (Michael Fassbender) e o Hank/Fera (Nicholas Hoult), mesmo levando em conta as conhecidas confusões narrativas que a linha do tempo da franquia traz.
Esses papéis acabam por impor um certo piloto automático dentro da performance de atores como McAvoy, Fassbender e Jennifer Lawrence, pois não há facetas tão novas a serem exploradas por suas personas. Porém, não se trata de um demérito a esses intérpretes, nem chega a ser algo problemático na construção narrativa desses personagens, pois possuem um embasamento bem sólido em relação a suas motivações e ações. Contudo, o domínio e o conhecimento prévio sobre os personagens também resulta em interessantes passagens de ação em que os diferentes poderes apresentam uma instigante sintonia entre si quando combinados e ampliados.
Sintonia, aliás, é a palavra certa para descrever as habilmente construídas cenas de ação. Kinberg e o diretor de fotografia Mauro Fiore prezam pela coerência espacial no lugar de campos de batalha com escalas épicas, algo com o qual o filme passado, por exemplo, não soube lidar bem. A direção faz questão de deixar bem claro quem está onde e fazendo o que, trabalhando bem com cenas em profundidade e temperando tudo com um bem feito dinamismo visual.
Fênix Negra acaba por fechar bem um arco dramático que acabou se mostrando bem sólido ao dar um novo fôlego aos mutantes no cinema. Uma nova despedida, pois ainda não se sabe dos planos da Disney, nova dona dos direitos da franquia, em relação à sua continuidade e renovação. Um fechamento que consegue trabalhar bem com tensão e densidade, além das temáticas já bem digeridas, com suas alegorias sobre minorias e seus processos de auto-aceitação e aceitação perante a sociedade. Tudo sem deixar de lado uma boa ação entre seres superpoderosos.