Escrever novela é tarefa para poucos. Utilizando a batida metáfora da montanha russa, para agradar o telespectador com um folhetim no horário nobre, o autor ou autora passa por altos e baixos. Assim tem sido com a carioca Glória Perez, que entrega ao público nesta segunda-feira (3) a 11ª novela da carreira: A Força do Querer, substituindo a apagada A Lei do Amor, no horário das nove da Globo.
No alto de seus 68 anos de vida, Glória escreveu além de dez folhetins como titular mais cinco minisséries. Na TV Globo, seu ápice foi com a épica O Clone (2001). Em seguida, tropeçou com a bagunçada América (2005). Voltou ao topo com Caminho das Índias (2009), trazendo o primeiro Emmy – considerado o Oscar da TV mundial – de Melhor Telenovela para o Brasil debaixo dos braços. Em 2012, desceu ladeira com a confusa Salve Jorge e recuperou um pouco de seu prestígio com a boa minissérie thriller Dupla Identidade (2014).
Em entrevista ao Jornal do Commercio, Glória tenta explicar a gênese de sua nova trama: “Os temas me escolheram, não fui atrás deles. No dia a dia, de repente, surge uma determinada situação que direciona o seu olhar para um assunto. Achei muito interessante o trabalho do Batalhão de Ações com Cães e quis trazer para a novela. A história da Bibi Perigosa (Juliana Paes) me impressionou demais. Inspirada no livro dela vou contar até onde uma mulher vai pela intensidade da paixão. E, percebendo que muito se fala de mulheres que amam demais, quis mostrar que homens também ultrapassam seus próprios limites e são desafiados por uma paixão. A compulsão por jogo é outro assunto que me despertou interesse, soube de casos muito curiosos e quis retratar essa dependência e como isso pode interferir num casamento. Foi assim com outros temas também”.
Os outros temas que Glória traz para A Força do Querer são tão polêmicos quanto: revolução tecnológica, o universo dos transsexuais, do MMA feminino e até sereismo vão ser expostos nesta novela das nove. “Observo muito ao meu redor, o que está acontecendo no mundo e estou sempre atenta a temas pouco explorados e interessantes. Essa junção da realidade com a ficção é uma característica do meu trabalho”, reforça Glória.
Para desenvolver cada capítulo desta nova trama, a autora revelou seu método, digamos, peculiar de redigir sua história: “Escrevo sozinha, sem colaboradores, em pé (risos). No meu escritório, diariamente. As ideias vão surgindo quando estou de frente para a tela do computador”, relata.
A crítica sempre definiu que uma trama “gloriapereana” tem características específicas: amores proibidos, um drama social e uma cultura peculiar. Glória, no entanto, diz que não é bem assim: “Não vejo como rótulo, nem como uma característica específica minha. São características do próprio folhetim, do gênero telenovela. E sim, são essenciais para uma construção de uma história longa como é a novela, que precisa de elementos para prender a atenção do público no decorrer de vários meses”, argumenta.
Com um público bastante exigente atualmente com as novelas, principalmente nas redes sociais, Glória Perez afirma que está atenta à opinião popular, e que audiência não é a sua prioridade. “Meu termômetro é sempre as pessoas nas ruas. Mais do que na internet. Se comentam, falam sobre os personagens, se me dão “dicas ou broncas” (risos) pelas ruas, está tudo certo. É sinal de que as pessoas estão acompanhando. A audiência é consequência”, esclarece.
A Força do Querer chega com o desafio de reaver o prestígio do público com as novelas das nove da Globo. E o título que rege a trama, segundo Glória, não é aleatório: “Acho que a gente está vivendo um tempo de embate de quereres. Vejo muito isso em volta de mim. De quereres que se conflitam, que se harmonizam. O querer vem junto com tudo isso e ficou muito mais forte nessa época em que estamos vivendo. São quereres que estão sendo reivindicados e solidificados. Foi isso que me motivou a trazer esse tema para a novela”, conclui.