Sem perder o lúdico, Stranger Things deve voltar mais madura e sombria

Eles cresceram. Os quatro garotos da cidade interiorana de Hawkins já não são mais crianças. Nem Eleven (Millie Bobby Brown). Seu vestido rosa sai de cena e entra um figurino mais atual e sem gênero. Assim como a peruca loira. Ela agora exibe os cachos curtos e escuros, consegue completar frases e conhece bem o significado da palavra amigo. Perdida no Mundo Invertido após ter cedido sua liberdade para salvar Will Byers (Noah Schnapp), a menina dotada de poderes psicocinéticos agora deve ir em busca das suas origens.

Pelo menos é isso que mostra a Netflix em trailers e teasers divulgados até hoje, data de estreia da nova temporada de Stranger Things – série de fantasia e sci-fi criada pelos gêmeos Matt e Ross Duffer. Há uma cena com a qual é sugerido que Eleven pode ter aparecido para seu mais precioso amigo Mike Wheeler (Finn Wolfhard), enquanto ele é interrogado sobre um desaparecimento pela polícia de Hawkins. Muito provavelmente pelo sumiço da própria comedora de waffles. Outra cena sugere que Eleven pode ter chegado à casa de sua mãe, Terry Ives (Aimee Mullins), que durante a gravidez foi vítima de experimentos ultrassecretos no Laboratório Hawkins, onde a garota foi criada como um rato de laboratório e teve sua mente testada incontáveis vezes.

Com o retorno de Will, o quarteto aficionado por Dungeons & Dragons se reúne mais uma vez. Mas nada parece voltar aos conformes. Há algo de errado com o caçula de Joyce Byers (Winona Ryder), recém-chegado de uma dimensão sombria. Ele vomita lesmas. O quesito bizarrice também fica por conta de um suposto desordenado surgimento de abóboras na cidade. Os problemas que Will, Mike, Dustin (Gaten Matarazzo) e Lucas (Caleb McLaughlin) devem encarar agora parecem maiores do que nunca. Ainda bem que eles não são mais os mesmos garotinhos inocentes de um ano atrás, ainda que tivessem um imprudente senso de heroísmo. Afinal, o que são os valentões da escola comparados a um Demogorgon? Eles já têm preocupações o suficiente. Secretas organizações governamentais são uma delas. Mas nada impede que decidir sobre o melhor episódio de Star Wars seja outra.

Resgatado quase sem vida do Mundo Invertido após habitar numa espécie de incubadora "demogorguiana", Will é o personagem que mais tem gerado expectativa nos fãs. Afinal, o intérprete do menino mal apareceu na primeira temporada, ainda que ela girasse em torno do seu desaparecimento. É o que nos confirma Mari Frazão, youtuber e cosplayer de Eleven. “Estou colocando muita expectativa sobre a atuação de Noah Schnapp. Me parece que os novos acontecimentos estarão ainda mais centralizados nele e, por isso, talvez tenhamos agora uma abertura maior para conhecê-los (o ator e o próprio Will)”, declara.

Fã de ficção científica e cultura pop, Mari decidiu estrear o cosplay na ocasião da CCXP Tour Nordeste, em abril deste ano. “Achei que era o momento perfeito para saber a reação do público. Na época, eu não sabia como faria, por causa do cabelo. Eleven é uma experiência de laboratório, um negócio meio X-Men”, afirma. Ela acabou criando coragem para raspar o cabelo e passou a máquina em casa, na véspera da convenção. “As pessoas me paravam o tempo inteiro no evento, perguntavam se eu tinha raspado só por causa da personagem, foi um sucesso”, relata, enfatizando que o número de personagens femininas realmente influentes da cultura pop é bem reduzido. “De repente, a série se torna um fenômeno, e sua maior protagonista é uma menina no auge dos seus 13 anos”.

Clássicos oitentistas

Muito do sucesso de Stranger Things se deve à atmosfera oitentista nostálgica e cheia de referências a clássicos da época, um marco na história do cinema e do sci-fi. “Não foram raras as vezes em que me senti revendo Conta Comigo, ET: O Extraterrestre ou Os Goonies. É como provar um prato cheio de ingredientes já batidos, mas que não tem gosto de comida requentada”, conta a youtuber. Tudo em Stranger Things é uma referência assumida. Da impecável trilha sonora às grandes citações aos trabalhos de Spielberg. A cena das crianças fugindo numa bicicleta não foi introduzida na trama à toa. Os olhares mais apurados a associam de primeira como uma homenagem ao amigo extraterrestre. Os elementos de horror típicos das obras de Stephen King também não passam batidos, sobretudo quando somos remetidos ao clássico uso de criaturas de terror e fascinação.

Ainda sobre alusões aos anos 1980, os protagonistas aparecem em prévias da segunda temporada vestidos com os macacões de Os Caça-Fantasmas, ao que tudo indica, prontos para o Halloween. Talvez a referência mais direta seja a adição de Bob Newby (Sean Astin) à narrativa. Ele, que foi ator mirim de Os Goonies, fará uma aparição especial como o namorado de Joyce. Uma decepção para aqueles que esperavam ver a mãezona do ano ao lado do policial Jim Hopper (David Harbour), que a ajudou a resgatar seu filho do Mundo Invertido. É essa dimensão emocional que, entre outras coisas, torna a produção tão memorável.

Em nove episódios inéditos, Stranger Things deve nos brindar hoje com um clima mais sombrio e protagonistas mais maduros. O elo com o lúdico, entretanto, não deve ser rompido. Pelo menos não por enquanto. Após tantas teorias e easter eggs nas redes sociais, engana-se quem pensa que o mistério está prestes a acabar. Há rumores de que coisas estranhas devem acontecer ao grupo mais destemido de Hawkins, ao menos, até a quarta temporada.