O chão telúrico de Lenine

Um canário deu o mote de Chão, disco que ele gravou com o filho Bruno Giorgi e Jr. Tolstoi
JOSÉ TELES
Publicado em 19/10/2011 às 8:43


Frederico é o sexto de uma linhagem. Frederico VI pode ser ouvido em uma das faixas de Chão, novo disco de Lenine. Frederico VI é um canário, da casa da sogra do cantor. "A gente estava gravando. Quando fomos ouvir, ali estava o vazamento: Frederico solando na música. Decidimos gravar novamente, e para valer. Colocamos o microfone na gaiola, fez-se o maior silêncio, a música bem baixinho, demos o play-rec, e ele solou novamente, no tom e no andamento", conta Lenine. Foi o talentoso Frederico VI (que está na faixa Amor é pra quem ama) quem apontou a direção de Chão, um disco de sons orgânicos, extraindo-se o máximo do mínimo.

Um disco diferente de todos os que Lenine fez até agora. "É um estímulo para descobrir novos relevos", como diz ele. Para começo de conversa, um disco sem bateria ou percussão: "Quando pensei o conceito, tive que falar com Pantico (Rocha). O que ele me disse foi bonito, e para mim, o bastante: 'Cara, estou contigo há vinte anos por causa de sua música'". Chão, uma das duas parcerias com Lula Queiroga, define o trabalho telúrico, intimista. A outra parceria é Se não for amor, eu cegue. O projeto foi tocado por Lenine, pelo filho Bruno Giorgi (baixo, guitarra, delays e produção) e Jr. Tostoi (guitarras, bandolim e harmonium). Numa única faixa, mais um músico, Yuri Pimentel (baixo acústico, em Envergo mas não quebro).

O projeto costura outros laços. Sofia, que fez os sons no início do disco, é namorada de Bruno. Bernardo, filho caçula, foi assistente de produção. O disco é dedicado a Tom, filho do primogênito João, e a outra neta, Luna. A foto de Tom, dormindo sobre o corpo de Lenine, na capa em suaves matizes vermelhos, foi tirada por Ana, mulher de Lenine. Chão pode ser o significado de família: "Chão é o que sustenta. Na foto da capa, Tom dorme com toda segurança, sem saber que ele me passa segurança", comenta o cantor. Ressaltando que os filhos trabalham com ele não pelo parentesco, mas pelas qualidades: "Bruno está no disco, ele tem seu próprio estúdio, já produziu outras pessoas, algumas bandas, é dele também a mixagem", explica, orgulhoso.

Chão é um álbum conceitual, avisa Lenine. "É uma suíte, para ser escutada numa tacada só. E é também um repertório para ser apresentado indoor. No show, o som será 4.2, os efeitos, gravados binaural, no palco darão uma sensação espacial, como se estivessem solto no ar". Os barulhinhos bons pontuam as canções: do arrastar dos passos de Sofia (que abrem e fecham o disco) ao afinado trinar de Frederico VI, passando por máquinas de escrever e de lavar roupa, pelo chiado de chaleira, de uma motosserra, e do canto das cigarras da Urca, bairro onde mora Lenine. As inserções sonoras remetem ao Pink Floyd de The dark side of the moon, iniciado com o soar de uma máquina registradora. Mas não é o caso aqui, explica Lenine: "A influência está num cena de Dersu Uzala, de Kurosawa. Ele conversa e ao fundo se ouve o crepitar da lenha ardendo numa fogueira, fazendo contraponto com a voz dele".

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