Luiz Gonzaga cresceu ouvindo a sanfona de oito baixos do seu pai, Januário, e sempre admitiu não ser um virtuoso do instrumento. Porém, por outro lado, sempre se jactou de ter criado um estilo que o destacava entre os outros sanfoneiros. Numa entrevista ao Jornal do Commercio (edição de 23 de março de 1973, matéria não assinada), ele detalhou sua técnica e como ela surgiu.
“Geralmente, quando a orquestra ia descansar, o acordeonista tocava tango, que era moda naquela época. Então, o que eu ia fazer? Tudo o que eu ia tocar não dava certo, porque o acordeom precisava de uma técnica , e eu só conseguia tocar pelo jeito do Norte. Aí eu tive de procurar meu próprio jeito de tocar. Eu não conseguia imitar ninguém, porque todo mundo tocava melhor do que eu. Foi aí que eu descobri o meu próprio estilo, sem saber que estava criando uma coisa nova”, explicou o Rei do Baião.
Numa entrevista, em 1972, à revista Bondinho, publicação de esquerda com estética alternativa ou de vanguarda, Luiz Gonzaga comparou sua forma de usar a sanfona à maneira como Jackson do Pandeiro tocava o pandeiro (os dois sempre se mantiveram respeitosamente distantes): “...E o Jackson do Pandeiro, tem uma bagagem espetacular, é um grande ritmista. Prestando bem atenção na sanfona que eu toco, você vai chegar à conclusão de que eu sou mais um ritmista do que um solista. Que eu criei na sanfona a minha maneira de cantar, uma maneira de me acompanhar sem que a sanfona encubra a voz. Então, ter a sanfona amarrada ali, como se tivesse um pandeiro, um violão, uma bateria, um triângulo. Então tá presa ali, só fazendo cadência para eu cantar. Então eu sou um ritmista. O Jackson também é um ritmista”.
O acordeonista mineiro, de Uberlândia, Antenógenes Silva (1906-2001) exerceu forte influência em Luiz Gonzaga quando ele começou a se dedicar à sanfona, no período em que viveu em Minas Gerais, particularmente em Ouro Fino. Antenógenes era o acordeonista mais popular do País, presença constante no rádio, solista ou como acompanhante das principais estrelas da época. Um de seus clássicos, a valsa Pisando corações (com Ernani Campos), em que acompanha Augusto Calheiros com o acordeom, era obrigatória no repertório do iniciante exuense, musicalmente ainda conhecido como soldado Bico de Aço.
A primeira apresentação pública do jovem Luiz Gonzaga aconteceu, em 1937, no Clube Éden, de Ouro Fino, quando tocou, entre outras, o samba-choro Faustina, de Gadé, lançado por Almirante (mas que se tornaria popular anos depois, com Moreira da Silva). Um teatrólogo local da cidade mineira, com o sugestivo nome de Raul Apocalipse, foi quem o convidou para tocar numa das peças montadas por ele.
Porém, a formação de Luiz Gonzaga nos anos que precederam a sua ascensão é bem mais complexa, um amálgama de ritmos e gêneros das mais diversas procedências. Na citada entrevista ao JC, em 1973, ele esclarece esta asserção, apontando Pedro Raimundo como outra grande influência, sobretudo em se decidir pela indumentária que usaria no palco e pela versatilidade do sanfoneiro gaúcho. Cita até Ernesto Nazareth, para lembrar que foi tocador de choro: “Eu tive a influência do jazz, porque eu consegui no baião, mesmo no choro, um certo balanço diferente na sanfona, porque eu toquei em orquestra, porque eu toquei em cassino, porque eu toquei em gafieira, porque eu toquei no rádio. Eu toco de ouvido até hoje. Então, eu criei meu próprio estilo assim. Um pedacinho dacolá, pedacinho do jazz, e um pedacinho de regional”, resumiu.