Feminismo em canções compostas por eles e por elas

Homens fizeram alguns clássicos do repertório feminista
JOSÉ TELES
Publicado em 08/03/2017 às 8:31
Homens fizeram alguns clássicos do repertório feminista Foto: foto: divulgação


 

 Primeiro, fiquei com medo/estava petrificada/pensando que não conseguiria/ viver sem você ao meu lado”. Esta é a abertura de I Will Survive (Eu Sobreviverei), maior sucesso de Gloria Gaynor. É o desabafo de uma mulher que, abandonada, dá a volta por cima e, quando o ex quer reatar, é sumariamente dispensado. 

No universo da música popular, durante muitos anos, a mulher se limitava a intérprete, pois a grande maioria das canções era assinada por marmanjos. Mas nem todos incentivavam a misoginia. I Will Survive foi escrita por homens, Freddie Perren and Dino Fekaris.

Respect, clássico do soul, na voz de Aretha Franklin, foi composta por Otis Redding, que também a gravou. Aretha transformou o apelo por respeito contido no título numa exigência: “Só o que lhe peço quando chegar em casa/é um pouco de respeito”. A inflexão da voz não era a de quem pedia, mas a de uma mulher que se impunha. Aretha Franklin fez da canção um hino do feminismo nos anos 60. Não foi o único. These Boots Are Made For Walking, hit internacional de Nancy Sinatra, escrito pelo produtor, Lee Hazlewood, é enquadrado como uma das grandes canções feministas, pelo refrão: “Esta botas são feitas para caminhar/é pra isto que foram feitas/e um dia elas vão caminhar sobre você”. 


BOTAS

Mas o uso das botas como arma contra o macho opressor é jogado para o futuro. Ao contrário de You Don’t Own Me, sucesso de Lesley Gore, em 1963, composto por John Madara and David White. A música é incisiva, sem arrodeios: “Você não é meu dono/não tente mudar meu modo de ser/você não é meu dono/não me amarre porque ficarei assim”, narrava o refrão da canção que levou Lesley Gore, aos 17 anos, para o topo das parada nos dois lados do Atlântico. 
Cada década acrescenta canções ao repertório feminista, poucas tão divertidas quanto Girls Just Want to Have Fun, que tornou Cindy Lauper famosa. Assim como fez Aretha com Respect, Cindy aplicou um viés feminino, e mudou a letra da canção de Robert Hazard.

NO BRASIL

Na linha de I Will Survive é Começar de Novo, de Ivan Lins e Vitor Martins, composta um ano depois do hit americano. Começar de novo/E contar comigo/Vai valer a pena
Ter amanhecido, o refrão da canção, tema da série feminista Malu Mulher, da TV Globo (que trazia também Feminina, de Joyce, na trilha). A música fez sucesso na voz da cantora da vez, a baiana Simone: “Sem as tuas garras/sempre tão seguras
/sem o teu fantasma/sem tua moldura/sem tuas escoras/sem o teu domínio/sem tuas esporas/sem o teu fascínio”. Feita no mesmo ano da anistia dos presos políticos, a dupla de compositores “anistiava” e incitava a mulher à independência, foi uma dos maiores sucesso, e da mais badaladas, do ano.

Mulher! Mulher/na escola em que você foi ensinada/jamais tirei um dez/sou forte, mas não chego aos seus pés”, refrão de Sexo Frágil, de Erasmo Carlos (com parceria de Narinha, sua mulher), de 1981, é a mais popular das canções feministas da MPB. Tem influência óbvia de Woman, de John Lennon (do álbum com Yoko Ono, Double Fantasy, de 1980).

 Nos anos 80, o tema, até então bissexto passou a recorrente. Rita Lee tem composições feministas suficientes para um álbum, de Rosa Choque (tema de um programa feminista de baixos teores, o TV Mulher, da Globo), a Luz Del Fuego e Pagu (“Nem toda feiticeira é corcunda/ nem toda brasileira é bunda/meu peito não é de silicone/sou mais macho do que muito homem”). 

Pouco lembrada é A Mulher do Aníbal (Genival Macedo/Nestor de Paula), lançada, em 1954, por Jackson do Pandeiro. A tal personagem é bastante independente pra ir a um baile sem ele. Mas exigia respeito, bem antes de Aretha Franklin. Vítima de assédio, ela revidava à altura e ia à luta.

Galeria de canções:




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