No mundo do design, Philippe Starck é uma espécie de pop star. O francês tem sua assinatura carimbada em milhares de projetos, que vão desde iates e hotéis de luxo até móveis, acessórios, produtos eletrônicos, cosméticos e vestuário. Anualmente, envolve-se em cerca de 200 novos empreendimentos, implementando neles uma filosofia que tem a inovação como princípio básico. Autointitulado com uma espécie de Robin Hood do design, que utiliza os recursos despendidos pelos grandes empresários para encontrar formas de popularizar os bens de consumo, ele prepara seu segundo projeto no Brasil, o luxuoso hotel Torre Rosewood, no complexo Cidade Matarazzo, em São Paulo.
Localizado a poucos metros da Avenida Paulista, o empreendimento do Grupo Allard é um projeto arrojado, com uma torre projetada pelo arquiteto francês Jean Nouvel, envolta por jardins verticais, com 151 quartos de hóspedes e 122 suítes residenciais. A área dialogará com a antiga maternidade Filomena Matarazzo, prédio tombado que será revitalizado pelo grupo. Menina dos olhos do presidente do grupo, Alexander Allard, o hotel contará com a curadoria de Philippe Starck em sua decoração. O designer disse, durante visita recente ao Brasil, que a ousadia do projeto foi o que definiu sua participação na obra.
“Para mim, é um lugar que ativa a ideia de sonho e isso é essencial no meu trabalho”, afirmou o francês, cujo mote de trabalho é a utopia. “Sou um criador e, para isso, preciso ser uma pessoa livre. Eu sonho com o futuro: esse é o meu trabalho”, reforçou.
Para o projeto, seu segundo no Brasil (o primeiro foi o Hotel Fasano, no Rio de Janeiro), Starck utilizou unicamente produtos e materiais brasileiros, funcionando mais como uma espécie de curador. Durante suas pesquisas, conheceu Inhotim, em Minas Gerais, espaço que o encantou. “Para mim, o Brasil é o último povo do mundo que mantém alguma ideia de humanidade, uma certa loucura positiva que cultiva a beleza e tem um mistério quase incompreensível. O que mais me encantou do design brasileiro foi a elegância, uma certa atemporalidade e a ligação com a natureza, a utilização da madeira. É incrível”, enfatizou.
Responsável por projetos de valores astronômicos, como o iate Venus, que pertenceu a Steve Jobs, e estabelecimentos como os hotéis Península, em Hong Kong, Teatron no México; e Mondrian, em Los Angeles, ele refuta a ideia de design excludente. Pode parecer uma contradição, já que a maioria de suas empreitadas envolve somas generosas de dinheiro, mas, para ele, trata-se de uma estratégia quase de guerrilha.
“Gosto de inventar peças de design democrático. Posso fazer um produto que custe milhões e outro que custe poucos dólares. Antes de tudo, meu trabalho é servir às pessoas. Por isso, minha estratégia é meio Robin Hood: pego dos ricos para dar distribuir para as outras classes. Tenho sorte de muita gente poderosa, inteligente, vir até mim e garantir recursos para que eu invente, como um laboratório. O iate de Steve Jobs, por exemplo, foi uma experiência incrível, experimentamos muito com tecnologia, que posteriormente foram sendo absorvidas pela indústria e aos poucos vão se popularizando”, explicou.
Dessa forma, tudo vira objeto de interesse do francês, que iniciou suas aventuras como designer de forma autodidata. Ele já projetou de escova de dentes a produtos tecnológicos, tendo como principal objetivo reinventar, ou, nas suas palavras, estimular, o futuro da sociedade. Uma de suas marcas registradas é o uso do plástico como artifício nobre, ressignificando a ideia ligada ao material.
Ele busca incorporar, por essência, a ideia do que é o designer: aquele que cria para solucionar problemas e necessidades dos consumidores. A Starck parece interessar não só o criar, mas o que as experiências podem proporcionar aos usuários ao repensar objetos do cotidiano e dar a eles nova roupagem estética. Por isso, se orgulha de, além de seus projetos grandiosos, também assinar linhas acessíveis, como a de utensílios domésticos que projetou para a rede americana Target.
“Não me interesso pelo produto, pela materialidade. Me interesso pela vida. Não sou especialista em design e o que me move é a utopia, a ideia de fantasiar, fazer algo com amor. Meus projetos precisam ter idealismo. Por isso prefiro criar um milhão de produtos a um dólar do um que custe um milhão de dólares. Para mim, chega a ser obsceno o que certos designers fazem de criar um objeto simplesmente como obra de arte, sem serventia. Você passa sua vida para fazer um produto para uma pessoa? Meu deus! Acho até que é uma solução fácil fazer apenas edições limitadas de luxo. Porque, quando você vai pensar um produto para as massas, com a qualidade certa, o design certo, você gasta muito tempo, cinco anos no mínimo. Por isso, digo: faça uma boa cadeira, que as pessoas usem, seja prática, seja um bom designer. Dá trabalho”, enfatizou.
Sobre seu legado, o francês, hoje com 67 anos, afirma que sua ideia é continuar explorando as barreiras do sonho, da utopia, na intenção de estimular mudanças positivas na vida das pessoas.
“Se eu deixar um traço, quero que alguma criança veja meu trabalho e diga: ‘Philippe Starck era um cara legal, honesto. Olha tudo que ele fez, o risco que ele assumiu. Olhe como ele trabalhou tanto. Ele era um ator na sociedade’. Quero fazer algo, melhorar a vida das pessoas, ser parte da evolução. Quando eu morrer, quero saber que fiz parte da evolução”, concluiu.