O dólar acelerou a tendência de alta nesta quarta-feira (11) e pode alcançar em breve o patamar de R$ 2,90, na avaliação de analistas ouvidos pela reportagem.
O dólar à vista, referência no mercado financeiro, subiu pelo quarto dia seguido. A moeda teve valorização de 1,99% na sessão desta quarta (11), passando de R$ 2,823 para R$ 2,879. É o maior patamar desde 25 de outubro de 2004, quando fechou a R$ 2,889. Na máxima do dia, o dólar bateu R$ 2,882.
Já o dólar comercial, usado no comércio exterior, encerrou o dia com alta de 1,33%, a R$ 2,874, maior valor também desde 25 de outubro de 2004. Na máxima, bateu R$ 2,883.
Para analistas, a velocidade de valorização da moeda vista nos últimos dias e a persistência dos fatores que pressionam o valor da divisa para cima podem fazer com o dólar alcance em breve o patamar de R$ 2,90.
"O ritmo da desvalorização do real preocupa, e não a desvalorização em si. O real está pressionado por fatores que provocam a desvalorização, principalmente internos. Mas o movimento está ocorrendo mais rápido que o imaginado pela falta de suporte politico da presidente Dilma Rousseff para levar adiante o ajuste fiscal necessário para colocar as contas públicas em trajetória sustentável", afirma Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil.
A presidente encontra resistência inclusive na base governista para aprovar os ajustes fiscais necessários para trazer credibilidade à economia brasileira.
Nesta quarta-feira, o ministro Joaquim Levy (Fazenda) voltou a defender as medidas de ajuste nos gastos do governo federal ao afirmar que o reequilíbrio fiscal "é crucial para preservar as conquistas no campo da inclusão social já alcançadas".
EQUILÍBRIO
O dólar fortalecido também é um fator importante para ajudar a indústria brasileira e os exportadores, ao mesmo tempo em que pode significar uma redução da importação e um reequilíbrio da balança comercial. Em 2014, o país registrou rombo recorde nas contas externas. Os gastos brasileiros superaram as receitas em moeda estrangeira em US$ 90,9 bilhões, o equivalente a 4,17% do PIB.
Em proporção ao PIB, o resultado de 4,17% é o pior desde 2001, quando o deficit chegou a 4,19%, gerando desconfiança sobre a capacidade do Brasil de pagar a sua dívida.
"A balança comercial veio bem ruim no ano passado e os participantes do mercado estão achando que vamos ter um problema parecido com o de 2014", avalia João Medeiros, diretor da corretora de câmbio Pioneer. Ele estima que o câmbio se situe na casa de R$ 3 até o final do ano.
Se o governo não conseguir implementar as medidas e resgatar a confiança dos investidores, corre o risco de ter sua nota de crédito rebaixada neste ano pelas agências de classificação de risco internacionais, o que aumentará ainda mais a percepção negativa sobre o Brasil, levando a moeda americana a novos patamares.
A possibilidade de racionamento de energia e de água também preocupa, pois os cortes podem afetar o desempenho das empresas e prejudicar ainda mais a produtividade da economia brasileira, em um cenário em que os analistas já preveem crescimento zero em 2015.
Na segunda-feira, o boletim Focus, do Banco Central, mostrou que o PIB (Produto Interno Bruto) deve ter variação de 0% neste ano. Há uma semana, esperava-se crescimento de 0,03%. A recuperação deve começar a chegar apenas em 2016, para quando se espera crescimento de 1,5%, a mesma taxa divulgada anteriormente.
BANCO CENTRAL
Nesta quarta, o BC deu continuidade às atuações diárias no mercado de câmbio nesta manhã, vendendo 2.000 contratos de swaps cambiais (equivalentes à venda de dólares no mercado futuro). Foram vendidos 1.690 contratos para 1º de dezembro de 2015 e 310 contratos para 1º de fevereiro de 2016, com volume de US$ 98 milhões.
O BC também vendeu a oferta integral de até 13.000 contratos de swap para rolagem dos contratos que vencem em 2 de março, equivalentes a US$ 10,438 bilhões. Ao todo, a autoridade monetária já rolou cerca de 48% do lote total.
Para os analistas, o Banco Central poderia intensificar o ciclo de aperto monetário, com aumentos mais expressivos da taxa básica Selic, para tentar conter o impacto da alta do dólar na inflação.
"Isso atrairia um fluxo de investidores interessados em ser remunerados pelos juros altos", afirma Luis Gustavo Pereira, estrategista da Guide Investimentos. Mas mesmo essa estratégia é questionável. "Chega uma hora em que o país acaba não atraindo investidores, mesmo com juros altos", afirma Tarcisio Joaquim, do Banco Paulista.
A alta da moeda também poderia estar relacionada a uma pressão para que o Banco Central continue com suas intervenções diárias no mercado cambial, em vez de encerrá-las em março, como se cogita. "O leilão de swaps em um mercado menos volátil surte efeito, mas com especulação não tem grandes instrumentos que possam fazer com que a moeda reverta a trajetória", afirma Joaquim.
EXTERIOR
A hipótese cada vez mais forte de o Federal Reserve (Fed, banco central americano) elevar suas taxas de juros antes de junho é uma das grandes influências externas que pressionam em alta a cotação da moeda.
Com juros mais altos nos EUA, recursos internacionais poderiam se direcionar para investimentos em títulos americanos -remunerados pela taxa e considerados de baixo risco-, em detrimento de aplicações mais arriscadas, como em países emergentes. Diante da perspectiva de entrada menor de dólares no Brasil, o preço da moeda americana sobe.
"Brasil, Rússia e Índia estão com problemas pontuais, o que faz com que investidores procurem um porto seguro e retornem para os Estados Unidos", afirma Tarcisio Joaquim, diretor de câmbio do Banco Paulista. "A moeda se valoriza no mundo inteiro. E com a Europa praticamente parada e a China desacelerando, os EUA chamam a atenção", ressalta.
Das 24 moedas dos principais emergentes, 23 tiveram queda em relação ao dólar nesta sessão. Apenas o rublo registrou alta.
As incertezas em torno da permanência da Grécia na zona do euro elevam a aversão a risco e pressionam o dólar também, avalia Luciano Rostagno, do Banco Mizuho do Brasil. "Ninguém sabe exatamente qual seria o efeito de uma saída da Grécia da zona do euro e quanto os países detêm de títulos gregos", afirma.
"Seria preciso estimar quais países poderiam ser afetados por um movimento de saída da Grécia da zona do euro e se eles estão preparados para absorver impacto da saída da Grécia da zona do euro", complementa.
Nesta quarta-feira, o ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis, partiu para um embate com ministros das Finanças da zona do euro, após seu novo governo liderado pela esquerda conquistar um voto de confiança do parlamento a favor de sua recusa de estender o resgate internacional.