Era noite de uma quarta-feira, em janeiro de 2013, quando a então presidente Dilma Rousseff apareceu na TV vestida num terninho pink, maquiada e com cabelo impecável para fazer um pronunciamento à nação. “Queridas brasileiras e queridos brasileiros, acabo de assinar o ato que coloca em vigor uma forte redução na conta de luz de todos os brasileiros”. Durante aqueles oito minutos, explicou que o preço da energia ia cair 18%. Mas a farra da conta barata durou pouco. Em 2015, um tarifaço de 50% provou que o anúncio em rede nacional tinha sido um misto de apelo demagógico e equívoco na condução da política econômica.
As consequências daquele ato de 2013 reverberam hoje num setor elétrico praticamente quebrado. O caso da energia é apenas um exemplo de como a demagogia (do grego: arte de conduzir o povo) pode influenciar a economia do País e prejudicar a população.
Tributos escorchantes, juros altos, inflação e desemprego são, normalmente, os amargos frutos do populismo. “A demagogia é um fenômeno próprio da democracia. Para os políticos se elegerem ou terem popularidade eles prometem coisas que podem não acontecer”, explica o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Pablo Holmes.
No Brasil, a desigualdade social sempre foi combustível para inflamar a demagogia, que permeou governos dos mais diferentes matizes ideológicos ao longo da história. O ambiente é favorável: uma população carente, com educação ainda precária e em busca de soluções mágicas. Do outro lado, políticos dispostos a fazer promessas inalcançáveis para ganhar eleição. Na história recente não faltam exemplos. Candidato à reeleição em 1998, Fernando Henrique Cardoso, que cinco anos antes havia estabilizado a economia do País, seduziu os eleitores com a proposta de permanência de paridade do real com o dólar, mas mudou a regra quando foi eleito. E vieram crise e desemprego.
Seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva, surfou numa onda global de bonança e esqueceu o dever de casa. “Lula teve a sabedoria de manter a estabilidade econômica, mas iludiu o povo com a aposta no consumo. As casas tinham geladeira e TV de plasma, mas do lado de fora o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) não cresceu, com o País ocupando a 79ª posição mundial”, analisa o professor de Ciência Política da PUC-RIO Ricardo Ismael.
Com apenas 5% de popularidade, Michel Temer quer entrar para a história como um presidente reformista, que promoveu o ajuste fiscal e colocou o País nos trilhos. Mas está longe de dar o exemplo. Na contramão da promessa de austeridade, as despesas explodiram em um ano e quatro meses de governo e a dívida pública chegou a 73,8% do PIB (R$ 4,7 trilhões em julho). Nos seis primeiros meses de mandato gastou, junto com a esposa Marcela Temer, R$ 29 milhões no cartão corporativo do governo (valor muito acima da sua antecessora). A vantagem de Temer: sem compromisso em agradar a população, acerta ao impor limites ao gasto público e encaminhar a reforma da Previdência.
Na avaliação de Pablo Holmes da UnB, a necessidade de ser demagogo aumentou, motivada por um sistema político que cria dificuldades para o presidente. “Tudo precisa de muito apoio do Congresso, sob a desculpa de ser mais democrático quando, na verdade, vivemos uma oligarquia semelhante à da República Velha. Temos um Congresso de homens brancos, ricos, principalmente empresários, com interesses diferentes para compatibilizar em meio às elites do Nordeste, do Sudeste, do Centro-Oeste…Nesse cenário, é preciso ser cada vez mais demagogo e fazer mais promessas para tentar governar.”
Qual o risco que enfrentamos? Às vésperas das eleições de 2018, existe um temor de que os brasileiros tendam a votar em candidatos que se contraponham à política de ajuste fiscal. Nunca é demais lembrar que, mesmo com os ajustes do governo Temer, o País ainda sofre com 14 milhões de desempregados. O equivocado discurso anti-ajuste deve voltar com força nos próximos meses. “O povo está muito sofrido, carente de emprego e suscetível ao discurso populista. Mas se for eleito um demagogo a situação pode piorar, porque não vai conseguir cumprir as promessas, vai perder o controle e pode sofrer impeachment. Até no populismo é preciso ter ética”, diz Ricardo Ismael.