Greve de caminhoneiros agita debate sobre intervenção militar

"É um sentimento que vai crescendo entre a população, que vê os militares como uma solução para o problema nacional", disse o general Augusto Heleno
Sebastian Smith
Publicado em 31/05/2018 às 21:51
"É um sentimento que vai crescendo entre a população, que vê os militares como uma solução para o problema nacional", disse o general Augusto Heleno Foto: Foto: Leo Motta / SJCC


Os governos brasileiros costumam chamar as Forças Armadas para ajudar quando algo vai mal no país, e não surpreendeu ver os soldados em ação durante a greve dos caminhoneiros que paralisou o país. A diferença é que desta vez ocorreram apelos à intervenção militar.

Os caminhoneiros iniciaram sua greve na segunda-feira (31) passada, contra o aumento dos preços do diesel.

Os bloqueios nas estradas provocaram um desabastecimento general de combustíveis, insumos industriais e alimentos na maior economia da América Latina, mas o movimento contou com um forte apoio popular e permitiu expressar o descontentamento com a situação econômica, a corrupção no país e o governo de Michel Temer.

Após a surpresa inicial diante da amplitude da greve, Temer chamou as Forças Armadas para escoltar os caminhões que não aderiram à greve para atravessar os bloqueios.

Mas longe de ficar irritados com a chegada das tropas, muitos grevistas receberam as tropas com cartazes proclamando "Intervenção Militar Já!", o que equivale a pedir o retorno da ditadura que governou o Brasil entre 1964 e 1985, ou ao menos um golpe de Estado seguido de eleições.

O apelo já havia aparecido em manifestações contra a corrupção, mas desta vez tomou o protagonismo durante a cobertura da greve.

"Se possível queremos que as Forças Armadas intervenham por nós e tomem conta desse país", disse Alexandre Bastos, 43 anos, no bloqueio em frente à Reduc, em Duque de Caxias.

"Intervenção não tem nada a ver com ditadura. Nós só queremos que o Exército intervenha nessa situação toda, dissolva todo mundo, porque todo mundo é comprado e depois venha com eleições diretas, apenas isto", declarou à AFP.

No WhatsApp, correu um boato sobre uma disposição constitucional que autorizava a intervenção  militar caso a greve passasse de sete dias e seis horas.

"É um sentimento que vai crescendo entre a população, que vê os militares como uma solução para o problema nacional", disse o general Augusto Heleno, que comandou a Missão da ONU no Haiti (Minustah), acrescentando que as Forças Armadas "não pretendem nem buscam" um golpe de Estado.

Segundo o general, o Brasil da época da ditadura é visto agora como "um país mais organizado, onde as pessoas tinham uma vida melhor". "Não estou dizendo que era assim, mas é a imagem que muita gente tem".

Socorro dos soldados 

Os brasileiros se acostumaram a ver os militares entrar em cena quando as outras instituições falham.

No Rio de Janeiro, durante os Jogos Olímpicos de 2016, os militares se encarregaram da segurança, e voltaram às ruas da cidade várias vezes desde o ano passado diante da violência do narcotráfico.

Este ano, Temer decretou a intervenção federal na área de segurança do Rio de Janeiro.

Quando o Brasil atravessou a crise do vírus da zika em 2016, antes dos Jogos Olímpicos, também foram os militares que vieram ao socorro, indo de casa em casa para erradicar os mosquitos nas áreas de risco.

A reputação dos militares é parte importante da campanha presidencial do capitão da reserva do Exército Jair Bolsonaro, que figura em segundo lugar nas pesquisas para as eleições de outubro.

Bolsonaro é um nostálgico da ditadura, mas evitou apoiar os caminhoneiros que pediam a intervenção militar, dizendo que a direita nostálgica daquela época precisa chegar ao poder pelo voto, e não mediante o golpe.

A presidente do Supremo, Carmen Lúcia, declarou nesta quarta-feira que a democracia é o "único caminho legítimo"

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