A trégua na guerra comercial, selada entre Estados Unidos e China no final de semana animou os mercados, que até a semana passada se retraíam com a perspectiva de uma onda protecionista. O acordo também serviu para mostrar que, quando se trata de comércio, as diferenças políticas são secundárias. Para o Brasil, a leitura é que, no curto prazo, o acordo das duas potências atrapalhe o comércio de commodities Brasileiro, principalmente soja, mas abre boas perspectivas de médio e longo prazo.
Nem mesmo o alinhamento político do presidente eleito Jair Bolsonaro com os Estados Unidos e sua visão crítica em relação à China poderá, pelo menos por enquanto, gerar algum atrito ou perda para os brasileiros em relação aos chineses. Isso porque a China é o principal parceiro comercial do País, numa relação que gera superávits crescentes na balança para o Brasil desde 2014 (ver arte), ano que deu início aos 11 trimestres da pior recessão brasileira.
“Eu creio que vai haver pragmatismo. Bolsonaro já disse que era preciso cuidado na tomada de posição estratégica, compra de terras e de empresas estratégicas em relação à China. Problema mesmo é se não for confirmado o acordo”, diz o sócio e diretor internacional do Grupo L&S, Leandro Rushel. Para ele, nem mesmo a soja sairá prejudicada porque os produtores brasileiros vinham se beneficiando com volumes 20% maiores de exportação para os chineses. “Com o acordo dos EUA voltaremos à situação normal de antes de 2018, quando tivemos um prêmio por causa do conflito de mercado.”
Para o professor de economia da UFPE Écio Costa, o acordo em que os EUA deixam de aplicar a tarifa de 25% sobre importações de US$ 200 bilhões da China em troca de “uma quantidade tremenda de produtos agrícolas dos americanos”, segundo o presidente Donald Trump, vai beneficiar também a economia brasileira. Para ele, o protecionismo que preocupava o mundo até a semana passada se transformou numa nova forma de fazer negócio, com os acordos bilaterais. “Independente de quem exporta ou importa, os outros países vão demandar mais produtos agrícolas, energéticos, industriais e o Brasil pode se beneficiar dessa escalada”, diz.
Rushel salienta que o acordo EUA/China chega numa boa hora para o futuro governo Bolsonaro, que vai assumir num cenário internacional favorável. Além disso, a equipe econômica liderada por Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, ainda traz boas expectativas de melhora para as relações comerciais do Brasil. “O novo governo quer abrir a economia brasileira, que é muito fechada comercialmente. A gente teve um começo de abertura no começo dos anos 90, mas ainda somos muito fechados e parte da recessão que estamos nos recuperando agora se deve a isso. A última década foi de inflação baixa no mundo, mas não importamos isso porque somos muito fechados. O Brasil é a oitava economia do mundo, mas tem pouca participação no comércio mundial”, avalia Guilherme Canavarro, sócio da Multinvest Capital.