O Brasil tem vários dos ingredientes que estimulam o apetite chinês ao redor do mundo. Mercado consumidor em potencial, ativos com valores depreciados por conta da crise, infraestrutura deficitária e posição de liderança na América Latina. A conjuntura brasileira coincide com o movimento de expansão internacional do gigante asiático. Sob o comando do presidente Xi Jinping, a China aproveita o comportamento isolacionista de Donald Trump para fazer alianças e ditar as regras da globalização. Os chineses querem implementar uma nova lógica no mercado mundial.
“A China quer ganhar alianças pelo mundo para estabelecer um novo sistema de relações internacionais. Ao invés de deixar rastro de sangue, o país quer deixar desenvolvimento e prosperidade para os países que hospedarem seus investimentos. Durante muito tempo, as nações fortes dominaram as mais fracas pelas armas, mas a China não quer isso. A intenção chinesa é unir forças com os países em desenvolvimento e o Brasil faz parte dessa estratégia, na medida em que integra os Brics”, destaca o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Charles Tang. Quando conversou com o JC, na noite da última quinta-feira (7), Tang contou que acabara de voltar de um Congresso do Partido Comunista Chinês em Beijing, que reuniu lideranças de 122 países (muitas do Brasil).
Enquanto uma das primeiras medidas de Trump no cargo foi retirar os EUA do acordo comercial do Transpacífico/TPP (reunião de 12 países banhados pelo Pacífico), Xi Jinping avança com o projeto da Rota da Seda. O plano é criar um cinturão econômico ligando Ásia, África, Oriente Médio e Europa, reunindo 68 países que congregam 40% da riqueza do planeta. Já na América Latina, a China criou o Fundo Chinês para Investimento (Clai Fund) para dar fôlego aos investimentos na região. Em outubro do ano passado, o Brasil ganhou uma versão do mecanismo: o Fundo Brasil-China de Cooperação para Expansão da Capacidade Produtiva. Com US$ 20 bilhões em recursos (US$ 15 bi da China e US$ 5 bi do Brasil), o fundo vai financiar projetos de infraestrutura, modernização industrial, agricultura, armazenagem agrícola e outros áreas de interesse dos dois países.
“Para cada real que uma instituição financeira brasileira aportar, os chineses aportarão o triplo, numa relação de de 3 para 1. Mesmo com investimento maior do lado chinês, o processo decisório será paritário. A empresa interessada submete uma carta-consulta que será analisada por um grupo técnico e depois aprovada pelo comitê diretivo. Já recebemos 20 pré-consultas, das quais oito se converteram em cartas-consulta. A análise técnica deverá ser concluída até o final de janeiro e esperamos aprovar o primeiro conjunto de projetos até abril de 2018”, adianta o Secretário Adjunto de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Renato Baumann. As primeiras cartas são nas áreas de ferrovia, biotecnologia, informática e infraestrutura portuária. Baumann afirma que as condições de financiamento serão definidas caso a caso. Do lado brasileiro, os recursos virão do BNDES e da Caixa Econômica.
Charles Tang diz que a estratégia da China é ganhar dinheiro e fazer os países parceiros prosperar também. “Quando Brasil e China reataram relações diplomática em 1974, o Brasil era cinco vezes mais próspero que a China e hoje a China é nove vezes mais próspera. E não é porque Deus virou chinês, ele continuou brasileiro. É porque a China implementou políticas objetivas em busca de prosperidade. A China não aplicou as ideias liberais. O Brasil e outros países se endividaram com o FMI, enquanto a China e os demais Tigres Asiáticos cresceram”, simplifica Tang.