O processo de impeachment que culminou no afastamento definitivo de Dilma Rousseff (PT), na última terça-feira (30), apresenta um dado assustador: nos últimos 30 anos, desde a redemocratização do Brasil, sete presidentes na América Latina foram destituídos dos seus cargos. Isso significa que, a cada 4,3 anos, um presidente é afastado do poder.
O primeiro impeachment compreendido nesse período foi o do alagoano Fernando Collor de Melo (hoje senador pelo PTC), que assumiu o cargo em 1990. Em abril de 1992, entretanto, o seu irmão, Pedro Collor, deu uma entrevista apresentando um esquema de corrupção que envolvia o tesoureiro da campanha do então presidente, o Paulo César Farias, considerado como o “testa-de-ferro” do então presidente. No dia 29 de dezembro do mesmo ano, Fernando Collor renuncia à Presidência, tentando evitar o impeachment. No entanto, o processo segue e, no dia seguinte, o Senado o condena com a perda do mandato político e a inelegibilidade por oito anos.
O venezuelano Carlos Andrés Pérez foi o segundo presidente a enfrentar o processo de impeachment. Pérez, que já tinha o governado o país entre 1974 e 1979, voltou ao poder após vencer as eleições de 1988. Já em 1989, Pérez foi acusado de desvio de verbas públicas, fato esse que culminou no impeachment, finalizado em 1993. Um ano antes, enfrentou duas tentativas de golpe de estado, organizadas por Hugo Chávez – que assumiria posteriormente a Presidência.
O ex-presidente venezuelano, primeiro a ser reeleito, ficou conhecido pela mudança ideológica. Enquanto no primeiro mandato o seu governo se tornou bem avaliado internacionalmente, uma das primeiras medidas do segundo foi um pacote de austeridade econômica, que resultou em protestos por todo o país. O chamado “Caracazo” (por ter começado na capital, Caracas) resultou na morte de pelo menos três mil civis.
Em 1997, o presidente equatoriano Abdalá Bucaram assumiu o governo e, seis meses depois, foi deposto pelo Congresso do país, sob a acusação de incapacidade mental. À época, ele disse que tinha sido vítima de um golpe dado pelo Congresso. Bucaram foi alvo de protestos por medidas antipopulares, como o aumento de tarifas públicas. Depois da destituição, Bucaram viajou em exílio para o Panamá.
No século 21, outros quatro presidentes foram destituídos. Em 2005, novamente no Equador, o então presidente Lucio Gutiérrez deixou o poder após vários protestos populares que pediam a sua saída. Os estopins para a revolta foram a destituição da Suprema Corte do país feita por ele e a decisão de levar de volta o ex-presidente Bucaram.
Já em junho de 2009, um golpe de estado militar depôs o então presidente de Honduras, Manuel Zelaya. O hondurenho governava desde 2006 e foi acusado de querer fazer uma consulta popular sobre uma mudança na Constituição do país para colocar a possibilidade de reeleição. O presidente do Congresso, Roberto Micheletti, assumiu o governo de forma interina. Zelaya foi levado de forma compulsória para Costa Rica. Em setembro, Zelaya decide retornar à capital Tegucigalpa e se instala na embaixada brasileira, criando uma crise diplomática entre os dois países. Em janeiro de 2010, Manuel Zelaya deixa a Embaixada do Brasil em Honduras e segue de avião para a República Dominicana, para o seu exílio.
No Paraguai, o processo de impeachment do ex-presidente Fernando Lugo, em 2012, durou um dia. O ex-bispo, eleito em 2008, enfrentou uma dura oposição durante o seu governo. Entretanto, uma reintegração de posse no distrito de Curuguaty – que resultou na morte de 11 camponeses, seis policiais e deixou mais de cem pessoas feridas – culminou na saída de Lugo. A oposição alegou que grupos camponeses, ligados ao então presidente, emboscaram a polícia, o que resultou no massacre.
Além disso, Lugo também tinha problemas pessoais. Ex-bispo da Igreja Católica, o paraguaio teve que encarar quatro pedidos de reconhecimento de paternidade na época em que era clérigo. Duas crianças foram assumidas por Lugo. Em 2010, ele ainda teve que se submeter a um tratamento quimioterápico para câncer linfático.
Para o professor da Universidade Federal de Pernambuco, Thales Castro, todas as situações que culminaram nos afastamentos tem mais a ver com o sistema presidencialista na América Latina e com a relação de forças entre o parlamento e o Executivo. “Em geral, o sistema presidencialista hipertrofia o Executivo. Em alguns países, o presidencialismo acabou assumindo um protagonismo tão grande que resultou em uma crise”, avalia. Castro afirma ainda que o ideal para o Brasil seria o parlamentarismo, dados os limites territoriais. “Em um país do tamanho do nosso, o modelo seria interessante. Em Honduras, já acredito que não funcionaria bem”.