A oposição venezuelana e os simpatizantes do presidente Nicolás Maduro retornam neste sábado (20) às ruas, em uma disputa tensa marcada por quase dois meses consecutivos de protestos violentos que deixaram 47 mortos, em sua maioria jovens.
"Vamos mostrar pessoas e força (...) porque é uma forma de recordar ao governo que após 50 dias de resistência, mortos e presos, somos mais e não vamos nos render", disse em uma assembleia cidadã Freddy Guevara, vice-presidente do Parlamento, que tem maioria opositora.
Os adversários de Maduro acreditam que a nova passeata na principal avenida de Caracas vai superar a do dia 19 de abril, a maior da onda de protestos que em sete semanas também deixou centenas de feridos e quase 2.200 detidos.
De acordo com a ONG Foro Penal, ao menos 161 pessoas foram encarceradas por ordem de tribunais militares.
Do outro lado, Maduro receberá no palácio presidencial de Miraflores os trabalhadores do setor de alimentação, que devem caminhar a partir do centro de Caracas para expressar apoio à Assembleia Constituinte "popular", convocada recentemente pelo presidente.
O país está completamente dividido e quase paralisado, em meio a uma grave crise econômica que provoca uma escassez crônica de alimentos e medicamentos, e uma inflação que, segundo o FMI, atingirá os 720% este ano. Um coquetel explosivo que se completa com altos índices de criminalidade.
Os opositores denunciam uma "repressão selvagem" do governo, que por sua vez os acusa de apelar ao "terrorismo" para dar um golpe de Estado com financiamento dos Estados Unidos.
Nos últimos dias aumentaram as mortes por ferimentos a bala em atos vinculados aos protestos, pelas quais vários policiais e militares são investigados.
Alguns destes fatos ocorreram no estado de Táchira (oeste, na fronteira com a Colômbia), para onde Maduro ordenou esta semana o envio de 2.600 militares para "preservar a paz", após violentos distúrbios que incluíram saques.
Os protestos ganharam força, ainda, com a convocação por Maduro de uma Assembleia Constituinte "popular", na qual metade de seus integrantes seriam escolhidos em setores controlados pelo chavismo.
A crise também atinge o chavismo. A procuradora-geral Luisa Ortega, uma chavista histórica que se distancia cada vez mais do governo, estimou que uma Constituinte apenas agravará a crise, em carta enviada a Maduro.
A oposição rejeita a iniciativa por considerar que deixa no limbo sua maior reivindicação, as eleições, pois enquanto a Constituinte deliberar, não haveria convocação às urnas e Maduro continuaria no poder.
No entanto, Maduro garantiu que em 2018 haverá eleições presidenciais, como prevê a lei. Por enquanto, estão pendentes as eleições de governadores, que deveriam ter sido realizadas em 2016, e para este ano estão previstas a de prefeitos.
Guevara afirmou que no momento em que Maduro anunciar as "bases" da Constituinte, começará a "etapa final" de seu governo.
"A população paralisará o país para desconhecer o Estado ditatorial", disse.
Maduro insistiu na sexta-feira que a Constituinte "é o caminho para a paz, o diálogo e o consenso", enquanto a oposição, disse, propõe apenas "violência e morte".
- Lealdade militar -
Analistas concordam que, depois de mais de um mês e meio de protestos, o desafio da oposição é permanecer nas ruas de maneira pacífica.
"O êxito de um protesto depende de sua massificação e permanência", avalia Luis Vicente León, presidente do instituto de pesquisas Datanálisis, que adverte que se as manifestações se tornarem violentas, "perdem impacto".
Maduro, considerado o herdeiro do presidente Hugo Chávez (1999-2013), enfrenta a rejeição de sete em cada dez venezuelanos, segundo pesquisas de institutos privados, em meio à devastação econômica, acentuada pela queda nos preços do petróleo a partir de 2014.
O principal apoio de Maduro vem das Forças Armadas, que têm enorme poder político e econômico e que em várias ocasiões expressou "lealdade incondicional".
O general Vladimir Padrino López, ministro da Defesa e chefe da instituição, pediu nesta semana aos opositores que não se enganem, pois, segundo ele, os militares e o governo não vão tolerar o caos.
A oposição voltou às ruas depois que o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) - acusado de servir ao governo - assumiu em 30 de março as funções do Parlamento.
A decisão - anulada parcialmente após forte pressão internacional - provocou a entrada dos Estados Unidos no conflito.
Na quinta-feira, o Tesouro americano impôs sanções econômicas a oito magistrados do TSJ, acusando-os de usurpar as funções da Assembleia, o que implica no congelamento de bens que possam ter nos Estados Unidos.