Quatro ministros franceses renunciaram nos últimos três dias, incluindo três do partido centrista MoDem aliado do presidente Emmanuel Macron, em meio a um processo de moralização que ocorre em plena recomposição do governo.
Desde sua vitória, no domingo, nas eleições legislativas, que lhe deram uma clara maioria no Parlamento, o novo chefe do Estado francês trabalha em uma reforma de seu gabinete.
Inicialmente, a mudança seria limitada e "técnica". Mas tem se revelado maior que o esperado, após a saída do ex-socialista Richard Ferrand (Coesão Territorial) e de três ministros do MoDem - Sylvie Goulard (Defesa), François Bayrou (Justiça) e Marielle de Sarnez (Assuntos Europeus).
A renúncia surpresa na terça-feira de Sylvie Goulard, ex-adepta do MoDem, teve o efeito de bola de neve. Ela explicou querer poder, se necessário, "provar livremente (sua) boa fé" em um caso de supostos empregos fictícios do partido centrista à custa do Parlamento Europeu.
"Ela é uma europeia e aplica a si mesma regras que podem surpreender na França, mas que correspondem às normas de outros países", escreveu um jornalista do Le Figaro.
"Com certo brio, (ela) tomou a iniciativa de não se tomar como refém um grande ministério soberano. François Bayrou e Marielle de Sarnez seguem seus passos (...), esta é uma atitude extremamente razoável", comentou por sua vez Christian Estrosi, prefeito de Nice, do partido de direita Os Republicanos.
Bayrou e Sarnez são os pilares do partido MoDem, alvo de uma investigação preliminar sobre supostos empregos fictícios aberta em 9 de junho por "abuso de confiança e ocultação". A justiça deve determinar se o partido pagou a colaboradores que trabalhavam na França com verbas de assistentes parlamentares europeus.
O caso é ainda mais embaraçoso uma vez que foi Bayrou quem apresentou o projeto de lei sobre a moralização da vida pública, uma questão prioritária para o chefe de Estado após uma campanha presidencial recheada de escândalos.
Vários líderes políticos, incluindo o secretário-geral do Os Republicanos (LR), Bernard Accoyer, pediram ao primeiro-ministro Edouard Philippe que "exigisse" a sua renúncia. De acordo com uma pesquisa Harris Interactive, 57% dos franceses desejavam sua saída do governo.
Ao anunciar à AFP sua "decisão de não fazer parte do próximo governo", François Bayrou assegurou que sua renúncia não foi imposta.
"É uma escolha pessoal" que "simplifica a situação", reagiu o porta-voz do governo Christophe Castaner.
"Acredito que Macron usou Bayrou durante a campanha presidencial e agora, que tem uma maioria sem o MoDem, o joga fora como um trapo velho", criticou Marine Le Pen, presidente do partido Frente Nacional (FN) de extrema-direita (FN).
A FN também é alvo de uma investigação sobre empregos fictícios de assistentes parlamentares europeus. Dois assessores da FN já foram indiciados por juízes parisienses.
Companheiro do presidente Macron em sua conquista ao poder, Richard Ferrand, reeleito deputado sob a bandeira do partido presidencial, também saiu do ministério na segunda-feira.
Ferrand é alvo de uma investigação preliminar por suspeita de favorecimento, em um caso que teria beneficiado sua esposa em uma transação imobiliária.
Fora do governo, ele pretende concorrer à liderança da bancada parlamentar do A República em Marcha (LREM). Da mesma forma, sua colega centrista Marielle de Sarnez vai se dedicar à liderança de seu partido na Assembleia Nacional, de acordo com uma fonte do MoDem.
Após a saída de três ministros do MoDem, surge a questão da participação do partido centrista no próximo governo.
O segundo gabinete formado por Philippe, do LR, deve ser "equilibrado" e formado "por pessoas da direita, da esquerda, do centro, por pessoas cuja legitimidade não é resultado de um compromisso partidário", de acordo com o desejo do primeiro-ministro.
A composição do governo deve ser anunciada antes das 18h00 (13h00 de Brasília).