Dois homens foram detidos e acusados nesta sexta-feira de homicídio doloso de caráter antissemita pelo assassinato em Paris de uma mulher judia de 85 anos, um caso que comoveu a França.
As duas pessoas foram acusadas de "assassinato relacionado com a religião da vítima", indicou a fonte judiciária.
Ambos enfrentam acusações de roubo com agravante e destruição de propriedade, apontaram fontes à AFP, e ficaram detidos à disposição da justiça, de acordo ao solicitado pela procuradoria.
Mireille Knoll vivia sozinha em um apartamento do leste de Paris e, segundo a necropsia foi apunhalada várias vezes. Depois de morta, o apartamento foi incendiado.
A idosa havia nascido em 1932, e conseguiu escapar da perseguição de 1942 de Paris contra mais de 13.000 judeus, fugindo com sua mãe para Portugal com um passaporte brasileiro herdado de seu pai.
Depois da guerra, Knoll voltou a Paris e se casou com um sobrevivente do Holocausto, que morreu no começo da década dos anos 2000.
"Minha avó era uma mulher admirável, muito gentil, muito doce. Ela tinha muita alegria, amava viver. Não vi mal em ninguém. Talvez fosse um pouco inocente", relatou à AFP uma de suas netas Noa Goldfarb, de 34 anos.
Vários elementos levaram a procuradoria de Paris a se concentrar no caráter antissemita neste caso. Um dos suspeitos, vizinho de Knoll, sabia da religião da idosa. Seu suposto cúmplice o acusou de ter gritado "Allah Akbar" ao cometer o crime, segundo uma fonte próxima à investigação.
O primeiro suspeito nasceu em 1989 e tinha antecedentes policiais por casos de estupro e agressão sexual. O segundo acusado, de 21 anos, tinha antecedentes de roubos violentos e estava no edifício no dia do assassinato.
"Estamos realmente comovidos. Não entendo como alguém pode matar uma mulher que não tinha dinheiro e vivia em um apartamento de aluguel subsidiado pelo Estado para pessoas humildes", declarou seu filho.
"Savta (avó em hebraico) foi apunhalada até a morte onze vezes por um vizinho muçulmano que ela conhecia bem. Ele tomou o cuidado de incendiar seu apartamento para não nos deixar nenhuma lembrança. Nenhum álbum de fotos, nem dela, nem de Saba (avô), nem cartas... nada! Só nos restou as lágrimas", escreveu a neta no Facebook.
O ministro das Relações Exteriores francês, Jean-Yves Le Drian, em visita a Jerusalém na segunda-feira, disse que a morte de Knoll era uma demonstração da necessidade de uma luta "fundamental e permanente" contra o antissemitismo.
O grande rabino da França, Haim Korsia, escreveu no Twitter que está "horrorizado" com o assassinato.
"Judia de coração", mas não praticante, a senhora vivia "uma vida modesta", segundo sua neta, criando seus dois filhos "numa família muito aberta, em contato com amigos de todas as religiões".
"Ela conseguiu escapar dos nazistas, mas os islamitas a pegaram", lamentou Noa, que vive em Israel.
A comunidade judaica da França, de mais de meio milhão de pessoas, tem sido alvo de vários ataques islamitas nos últimos anos e denuncia o aumento na incidência de atos antissemitas violentos.
No mês passado, um juiz confirmou que o assassinato de Sarah Halimi, uma judia ortodoxa de 65 anos, teve motivação antissemita.
O Conselho Representativo de Instituições Judias (CRIF) instou as autoridades que investigam o assassinato de Knoll a atuar com "a maior transparência" para que "o motivo deste crime bárbaro possa ser conhecido o quanto antes".
Embora o número de atos antissemitas tenha caído em 2017, esse tipo de ação continua sendo significativa, e a comunidade judaica da França, que representa menos de 1% da população, é alvo de um terço dos crimes de ódio no país.
Desde 2006, 11 pessoas foram assassinadas na França por serem judeus, segundo os responsáveis da comunidade.