Em um país sacudido pela instabilidade política, os escândalos de corrupção e a crise econômica, a ambientalista Marina Silva (Rede) fará em outubro a terceira tentativa de chegar à Presidência com uma proposta para restaurar a credibilidade do Brasil.
"Uma coisa muito importante é tirar o país da crise pela falta de investimento. Hoje não tem investimento no Brasil porque está todo mundo esperando que chegue um governo que tenha credibilidade, legitimidade, para saber o que vai acontecer, ter alguma segurança", explica em entrevista à AFP em Brasília.
A sede do Rede Sustentabilidade, partido do qual é fundadora e pelo qual é pré-candidata às eleições de 7 de outubro, fica relativamente próxima à Esplanada dos Ministérios e à Praça dos Três Poderes, cenários dos esquemas e corrupção e intriga que jogaram na lama o prestígio da classe política brasileira.
Mas a ex-ministra de Meio Ambiente e ex-senadora de 60 anos, se vangloria de não haver acusações contra ela e defende o "voto da mudança" para fechar o rombo da corrupção nas instituições, através de uma profunda reforma política.
Trata-se de um grande desafio para a jovem democracia brasileira, depois das experiências traumáticas do impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, da prisão de seu antecessor e padrinho político, Lula, em abril deste ano, e das denúncias de corrupção que encurralaram seu sucessor, Michel Temer, bem como grande parte de seus ministros e de membros do Congresso.
"Já se tem a clareza de que aqueles que criaram o problema não têm como resolvê-lo (...) Os grandes partidos, que aparentemente são contra um o outro, estão unidos num único objetivo: acabar com a 'Lava Jato'", a investigação que desvendou um gigantesco esquema de corrupção montado dentro da Petrobras, explicou.
Segundo pesquisas de opinião, se a Justiça eleitoral inabilitar a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) por ter sido condenado em segunda instância, como prevê a Lei da Ficha Limpa, Marina Silva ficaria em segundo lugar no primeiro turno, com 10% dos votos, atrás do ultradireitista Jair Bolsonaro, a quem venceria com facilidade no segundo turno.
Entre 2003 e 2008, Marina foi ministra do Meio Ambiente do governo Lula, então aliado do falecido presidente venezuelano Hugo Chávez nos anos dourados da esquerda latino-americana. Mas desde que rompeu com Lula e o PT, que a levou a se apresentar à Presidência em 2010 e 2014, a ex-senadora mostrou-se abertamente crítica aos governos de Chávez e de seu sucessor, Nicolás Maduro.
"Hoje na Venezuela temos um problema humanitário. A Venezuela não é mais uma democracia, é preciso que haja uma coalizão independente de partidos para ajudar na situação em que está [o país]", declarou.
A profunda crise econômica, provocada por uma hiperinflação, e a escassez de produtos básicos são sentidas no estado de Roraima, fronteiriço ao país vizinho, onde entraram desde 2015 mais de 25.000 migrantes venezuelanos. "É uma questão delicada porque o que deve prevalecer é a diplomacia, a mediação", advertiu, sem dar maiores detalhes.
Negra e franzina, a ex-senadora, de confissão evangélica, propõe um referendo para discutir questões como a legalização do aborto e das drogas. Mas centra seu programa na necessidade de grandes reformas para estabelecer as bases das fragilizadas instituições democráticas. Promete, assim, eliminar a reeleição e instaurar mandatos de cinco anos.
"Se ganhar, vou acabar com a reeleição, instituir mandato de cinco anos para aquele que vier depois de mim. Eu terei apenas quatro anos, depois disso serão cinco anos. A reeleição no Brasil é um problema. As pessoas não fazem o que é necessário pelo país (...) Fazem o que é necessário para se reeleger", acrescentou.
Nascida no estado do Acre, filha de uma família paupérrima de seringueiros que se tornou uma ambientalista respeitada, Marina se comprometeu a trabalhar na Presidência para frear o desmatamento que, segundo ela, voltou a disparar na Floresta Amazônica, a maior reserva de biodiversidade do planeta.
No campo econômico, não se coloca entre os "dogmáticos" favoráveis ou contrários ao mercado e promete recuperar o Plano Real - "uma conquista do povo brasileiro", implantado em 1994 para combater a hiperinflação -, e garante que não está em seus planos privatizar grandes estatais, como a Petrobras, para fazer caixa.
"Temos que enfrentar problemas que são graves. Temos uma dívida pública muito alta e é preciso resolver o problema do déficit, mas não vamos fazer isso em prejuízo dos interesses sociais estratégicos", advertiu.