Desde que assumiu a articulação política do Palácio do Planalto, há um mês, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini (PT), recebe uma romaria de deputados e senadores em seu gabinete. "Aqui não é nem consultório. É um pronto-socorro mesmo", define Berzoini.
Apesar dos atendimentos, a base aliada continua rebelde no Congresso, a presidente Dilma Rousseff ainda sofre ameaça de impeachment e o PMDB critica a política econômica do governo. "Nós estamos vivendo um momento muito complexo", admite o ministro. Berzoini diz também que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda é um nome muito competitivo do PT para a sucessão da presidente Dilma em 2018, "mas não é a única opção"
Faz um mês que a presidente Dilma concluiu a reforma ministerial para contemplar o PMDB, mas até hoje sofre derrotas no Congresso e não conseguiu recompor sua base de apoio. De que adiantou a reforma?
Mudou o quadro, a relação com o PMDB da Câmara e estamos construindo um caminho para consolidar a base. Mas é óbvio que o governo não sente, de maneira alguma, que tem uma base organizada. Nós estamos vivendo um momento muito complexo. Não há mágica na política. Parte da base está preocupada com a questão econômica e social, parte foi atingida pelos processos da Operação Lava Jato e outra parte tem demandas que não foram atendidas. Mas o ambiente, hoje, é muito melhor.
Uma queixa constante dos parlamentares era a falta de diálogo com o Planalto. O sr. conseguiu mudar isso?
Tem dia que eu recebo 70, 80 parlamentares. Eu brinco que aqui não é nem consultório, que só atende com hora marcada. É um pronto-socorro mesmo.
Esse toma lá, dá cá não incomoda?
Não há toma lá, dá cá. Em nenhum país do mundo existe democracia sem participação da base parlamentar no governo. No parlamentarismo é assim e no presidencialismo também. Não vejo problema nisso.
Diante de tantas dificuldades, o governo desistiu de tentar aprovar a CPMF neste ano no Congresso Nacional?
Ninguém desistiu de nada. Vamos trabalhar para acelerar tudo que for possível, mas temos que ser realistas em relação ao calendário. Há pouco tempo até o fim do ano.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse que vai decidir neste mês sobre os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma. O governo tem base para barrar o processo, caso ele seja deflagrado?
Não há nenhum elemento factível para se produzir uma decisão pela abertura de um processo assim.
Nem o fato de o governo ter continuado a praticar as chamadas pedaladas fiscais em 2015?
Não. Aquilo que foi feito era necessário fazer em qualquer governo. Eu não concordo com a decisão do Tribunal de Contas da União. E o TCU dá um parecer, não julga ninguém. Quem pode tomar uma decisão sobre as contas governamentais é o Congresso. As contas de 2014 não foram julgadas. Muito menos as de 2015, porque o ano não terminou.
O Palácio do Planalto nega que tenha feito acordo com Cunha para salvar a presidente Dilma, mas o PT não pediu a cassação dele no Conselho de Ética, embora a maioria da bancada tenha assinado requerimento nesse sentido. Não é estranho?
Eu acho que os integrantes do PT não devem fazer prejulgamentos. Devem tomar uma decisão no momento apropriado. Do ponto de vista político, não há razão para o Executivo se meter num assunto que é do Judiciário, do Ministério Público e da Câmara.
O sr. não tinha essa mesma cautela quando era oposição e propôs o "Fora FHC", em 1999...
Mas, como parlamentar, eu nunca apresentei nada à bancada do PT nesse sentido. Naquela época, eu propunha que nós trabalhássemos com o conceito político de que, para mudar o Brasil, era preciso, por meio do processo eleitoral, mudar o governo. A expressão "Fora FHC" era "fora a política econômica".
O que o sr. achou do documento do PMDB criticando a política econômica?
É natural, em um governo com tantos partidos na base, que haja heterogeneidade de opiniões. O importante é dialogar, e não transformar isso em elemento de crise.
Mas o texto traz expressões duras, como "nosso desajuste fiscal chegou a um ponto crítico"...
Essa é uma opinião que já foi manifestada inclusive pela presidenta Dilma. Nós tivemos, de fato, um problema fiscal grave, do fim do ano passado para cá, motivado por uma mudança de conjuntura, que pode ser explicada por dois fatores: a queda de preços das commodities e da expectativa de crescimento de vários países, especialmente da China, e o impacto que a Lava Jato teve em relação às grandes empresas de engenharia. Grandes empregadoras sofreram muito com essa operação e estão reorganizando a sua estratégia.
A Operação Lava Jato atrapalha o governo?
A Lava Jato atrapalha a economia, o País e o governo do ponto de vista empresarial. Provoca impactos severos no PIB.
A Operação Zelotes também prejudica?
Qualquer fato que impacte a economia nos preocupa. Essas operações produzem efeitos colaterais que devem ser tratados de maneira responsável pelo governo. Sei que vocês vão perguntar se o governo queria que as investigações acabassem. Não é isso. O governo simplesmente acha que precisamos encontrar mecanismos para reverter este quadro. Por isso a discussão sobre os acordos de leniência é importante. É preciso separar a parte criminal daquilo que estas empresas representam. Quem cometeu ilícitos que se responsabilize pelo que fez. O que não se pode é destruir riqueza.
Como o sr. avalia a investigação que resultou na busca e apreensão de documentos no escritório de um dos filhos do ex-presidente Lula?
Primeiro, é bom lembrar que essa Operação Zelotes investiga muitas megaempresas. E é curioso que ela hoje tenha um foco que pareça essencialmente político, voltado para alguém com uma liderança histórica no País.
O sr. está dizendo que houve exagero por parte da PF?
Eu acho muito estranho haver uma intimação às 23 horas para um cidadão que tem endereço fixo e que não está tentando evitar nada. Ninguém quer blindar ninguém, mas é preciso que as investigações sejam feitas de maneira correta, alinhadas com o Estado Democrático de Direito.
Como está a relação entre a presidente Dilma e o ex-presidente Lula após esse episódio?
A relação entre os dois é tranquila, afetuosa, de diálogo permanente, o que não quer dizer que eles pensem igual sobre tudo.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, resiste até o ano que vem? O ex-presidente Lula chegou a dizer que ele tinha prazo de validade...
Todos nós temos prazo de validade, que é dezembro de 2018. Além disso, ministro da Fazenda e técnico da Seleção são sempre objetos de crítica, em qualquer conjuntura. Não vejo nenhuma razão para prever a saída do ministro Levy por causa de alguma divergência sobre a questão econômica. Eu, por exemplo, recebo críticas com muita tranquilidade. Quem não gosta de crítica não deve fazer política.
A presidente aguenta mais três anos com popularidade abaixo dos dois dígitos?
Todo mundo que governa trabalha para aumentar sua popularidade. Nós queremos chegar em 2018 com a presidenta reconhecida pelo povo por suas qualidades.
E o ex-presidente Lula vai ser candidato do PT em 2018, mesmo se a "pancadaria", como ele diz, continuar?
Ele é um dos nomes mais competitivos que o PT pode apresentar em 2018, mas não é a única opção.
Quem seria a outra opção? O sr.?
Se alguém lembrar do meu nome, posso até não aceitar, mas triste eu não fico (risos).