O comportamento da base aliada na Câmara dos Deputados acendeu alerta para as futuras votações das principais reformas que o governo pretende aprovar neste ano, a da Previdência e a trabalhista. Nas últimas três semanas, o Palácio do Planalto sofreu derrotas e enfrentou dificuldades para aprovar matérias impopulares na Casa.
Parlamentares dizem que esse cenário decorre da combinação de alguns fatores: a agenda impopular do governo e seus possíveis efeitos na reeleição dos deputados em 2018; problemas na articulação política na Casa e na comunicação do Planalto, além da falta de atendimento às reivindicações por cargos na administração federal.
A primeira dificuldade do governo foi registrada no dia 22 de março, com o projeto que regulamenta a terceirização. A proposta foi aprovada com um placar apertado de 231 votos a 188, menos do que os 308 votos mínimos necessários para aprovar uma emenda à Constituição, como a da reforma da Previdência.
Desde então, o governo foi derrotado ao ver aprovada, por 245 a 179, uma emenda do PT à Medida Provisória do Cartão Reforma, que obriga a União a destinar 20% do valor do programa à área rural. O governo queria manter esse porcentual em 10%, mas perdeu.
Na semana passada, o Planalto também não conseguiu alcançar os votos mínimos necessários para aprovar em segundo turno uma emenda à Constituição autorizando universidades públicas e institutos federais a cobrar por cursos de extensão e pós-graduação lato sensu (especializações). A proposta recebeu 304 votos favoráveis e 139 contrários.
O governo vem enfrentando ainda dificuldade para aprovar o projeto que cria o Regime de Recuperação Fiscal para Estados falidos. Temendo derrota, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), adiou a votação para a próxima semana.
Deputados relatam que a agenda governista e seus efeitos em 2018 aliada à falta de uma boa articulação política são o principal fator desse novo cenário da Casa - que tem ameaçado a ideia de governo congressual que Temer costuma defender.
"Matéria indigesta não vota se não tiver interlocução. O governo só tem um articulador, que é o próprio (presidente) Michel (Temer). Os outros estão acomodados. Quantas vezes você viu um ministro articular com a bancada do seu partido aqui na Câmara?", disse Danilo Forte (PSB-CE). "Ou descem do pedestal e afinam agenda com o Congresso ou vai ser derrota."
Há relatos ainda do aumento da pressão do eleitor via redes sociais. "A maior tarefa é convencer a população", disse o líder Efraim Filho (DEM-PB). Para o líder, há resistência do eleitorado às reformas e cobrança imediata de seus posicionamentos na internet. "As pessoas não estão informadas, não estão convencidas", concluiu.
Deputados também dizem que a Câmara têm resistido nas medidas impopulares porque muitas vezes o Senado não as leva adiante e deixa o ônus apenas com os deputados. "Todas as broncas começam por aqui. Você se desgasta e o Senado vai lá derruba, muda tudo ou senta em cima", afirmou Joaquim Passarinho (PSD-PA).
Ele citou como exemplo o pacote anticorrupção, aprovado pela Câmara no fim de 2016 e que está parado no Senado, e a própria terceirização, quando deputados tiveram de votar o tema duas vezes: em 2015 e em março deste ano. Passarinho vê atuação tímida dos articuladores do Planalto. "Hoje você tem líder do governo e mais de dez vice-líderes, mas eles não aparecem no plenário aqui para defender o governo. Se os líderes dos grandes partidos não estão defendendo o governo, como os outros parlamentares vão defender?"
Além do líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o Palácio do Planalto criou a função de líder da maioria, posto ocupado atualmente pelo deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES). Tem ainda um deputado na liderança do Executivo no Congresso Nacional, no caso, André Moura (PSC-SE). Nos bastidores, deputados relatam falta de sintonia entre os três. Procurados nesta quinta-feira, Aguinaldo, Lelo e Moura não foram encontrados para falar sobre o assunto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.