Um mês após a votação que barrou o prosseguimento da denúncia por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer, o cenário que se desenha na Câmara é de incerteza e dispersão da base diante da iminência da apresentação de um nova acusação formal da Procuradoria-Geral da República tendo como alvo o peemedebista.
A avaliação de parlamentares é de que, em 2 de agosto, Temer saiu vitorioso ao conseguir barrar o prosseguimento da denúncia, mas com um placar no plenário que deixa implícita a dificuldade de manter a governabilidade. Foram 263 votos a favor, número pouco acima dos 257 votos que garantem maioria simples, necessária para aprovar projetos de lei, por exemplo.
Entre integrantes da base aliada, a queixa mais frequente é a de que o governo ainda não pagou a "conta" da denúncia e terá pouco a oferecer caso a Procuradoria-Geral da República apresente uma segunda acusação formal. A fatura cobrada pelos deputados que livraram Temer de ser afastado do cargo para ser investigado envolveu tanto a distribuição de cargos e recursos, por meio da liberação de emendas, quanto a promessa de intermediação do presidente em questões regionais e partidárias.
A demissão de indicados de deputados que votaram contra Temer foi uma tentativa do governo de agradar à base, mas há um sentimento, especialmente entre deputados do PP, PR e PSD, que compõem o chamado Centrão, de que eles não foram recompensados à altura do que fizeram pelo presidente. Para integrantes do grupo, Temer perdeu capital político ao não cumprir promessas e enfrentará um ambiente menos favorável no caso de uma segunda denúncia ser apresentada.
A não punição ao PSDB, que permanece com quatro ministérios, e rachou na votação da denúncia, é um dos pontos de maior crítica ao governo. O alvo da insatisfação é o ministro Antonio Imbassahy (BA), que ocupa a Secretaria de Governo. A pasta é estratégica na relação entre o Planalto e o Congresso e responsável, entre outras coisas, pela liberação das emendas parlamentares.
Outro aspecto apontado pelos deputados é que a lentidão na recuperação da economia cria um clima ainda mais desfavorável. Nos dias que antecederam a votação da denúncia contra Temer na Câmara, dizem, a sensação era de que a permanência do peemedebista no cargo seria essencial para que o País voltasse a crescer.
Hoje, o discurso é de que a economia se descolou da crise política e seguirá melhorando. "O governo está fragilizado. Não há dúvida de que essa legião de descontentes vai trazer um reflexo (na votação de uma eventual segunda denúncia)", disse o deputado Danilo Forte (PSB-CE).
"Essa desorganização da base ajuda os parlamentares que votaram com ele (Temer) a fazer novas avaliações", admitiu o líder do PSD na Câmara, deputado Marcos Montes (MG).
Aliados do Palácio do Planalto minimizam os descontentamentos e sustentam a tese de que Temer é perseguido pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Argumentam que uma eventual segunda denúncia, por obstrução da Justiça ou organização criminosa, será tão frágil quanto a primeira.
Um dos efeitos mais diretos da dispersão da base é a dificuldade que o governo tem enfrentado ultimamente para aprovar matérias no Congresso. Isso ficou evidente durante a votação da mudança da meta fiscal, na semana passada. Após 11 horas de trabalhos, a sessão foi encerrada sem a conclusão da análise de destaques e a proposta do Orçamento do ano que vem teve de ser enviada ao Legislativo com a previsão de um rombo pouco realista.
Outro ponto que não passou despercebido foi a postura mais "independente" do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Sucessor na Presidência em caso de afastamento de Temer, Maia não esconde o descontentamento em relação ao Planalto por causa do clima de desconfiança durante a tramitação da denúncia - e já tem reclamado de que esse quadro está voltando a ser desenhado.
No mês passado, a Câmara também passou a dar prioridade a uma agenda própria. De olho no calendário eleitoral, os deputados priorizaram os trabalhos na tentativa de aprovar a reforma política e abandonaram a da Previdência.
Para o líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB), essa é uma tendência que deverá continuar, segundo ele, especialmente diante do fato de que hoje o governo não tem número para votar "medidas mais robustas", como propostas de emendas à Constituição (PECs), que necessitam do apoio de, no mínimo, 308 deputados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.