Mulheres ocupam só 10% dos cargos da Câmara dos Deputados

A desigualdade também ocorre na política. No Senado, as parlamentares representam 16% do total
Angela Belfort e Cássio Oliveira
Publicado em 08/03/2018 às 12:36
A desigualdade também ocorre na política. No Senado, as parlamentares representam 16% do total Foto: Foto: Guilherme Martimon/PSB


As mulheres são 52% do eleitorado brasileiro e ocupam somente 10% dos cargos de deputados federais do País, como mostrou ontem o estudo Estatísticas de Gênero – Indicadores Sociais das Mulheres no Brasil – divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dos 513 deputados federais, apenas 54 são mulheres. No Senado, as parlamentares representam 16% do total de senadores.

O País tem menos mulheres no parlamento do que países como Cuba (48,9%), Nicarágua (45,7%), entre outros na comparação realizada pela União Internacional Interparlamentar que elaborou o ranking de participação das mulheres no parlamento.

Mas por que a representatividade feminina é tão baixa? “Por várias razões. Talvez a principal seja que existem menos mulheres candidatas. Os partidos oferecem menos candidatas femininas. Há uma sub-representação das mulheres nos partidos. Em cada 10 filiados (aos partidos), quatro são mulheres e o restante homens”, afirma o cientista político e coordenador do Movimento Transparência Partidária, Marcelo Issa.

A consultoria política Pulso Público fez um estudo – disponibilizado pelo Transparência Partidária – e constatou que, em média, 44% dos filiados eram mulheres nos 33 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em novembro do ano passado. No levantamento, somente dois partidos tinham mais mulheres filiadas: PMB com 55% e PRB com 51%. Os partidos com menos filiadas foram a Rede (37%) e o Novo (13%).

“Nos cargos de direção dos partidos, somente 20% são mulheres. Os comandos dos partidos continuam os mesmos e dominados por homens”. E, na argumentação dele, esse domínio resulta em concentração dos recursos de campanha nas candidaturas masculinas. E complementa: “Não há uma distribuição equitativa dos recursos entre os candidatos homens e mulheres”, conta.

“Na eleição de 2014, as candidaturas femininas receberam 10% dos recursos empregados nas candidaturas masculinas”, dispara a diretora presidente da Associação Visibilidade Feminina, a advogada Polianna Pereira dos Santos. Há uma lei que obriga os partidos a terem 30% de candidatas mulheres desde 1997. “Essa lei não traz qualquer outra obrigação. Então, os partidos tentam cumprir isso formalmente, mas muitas mulheres nem sabem que são candidatas”, defende Polianna. Está tramitando uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) defendendo que ao menos 30% dos recursos públicos das campanhas sejam destinados às candidaturas femininas.

Na eleição do ano passado, 16.131 candidatos não tiveram sequer um voto. Desse total, 14.417 eram mulheres e, segundo o TSE, muitas nem sabiam que eram candidatas. Essa informação levou o Ministério Público Eleitoral a apurar os documentos de registros de candidaturas.

Para Polianna, a baixa representatividade das mulheres passam principalmente por dois impasses. “O primeiro é o partido que muitas vezes não viabiliza a candidatura feminina. O segundo é a pulverização que ocorre nas eleições. É bom para o partido ter vários candidatos com poucos votos, que somando agregam um total suficiente para eleger mais um parlamentar, o que é chamado de cauda eleitoral”, conta Polianna, acrescentando que muitas vezes os candidatos com poucos votos são mulheres.

E, por último, ela alega que as candidatas mulheres quando são “puxadoras de voto” contribuem para a eleição de um candidato homem. Os puxadores de voto são aqueles que têm mais votos do que os necessários para se eleger e acabam ajudando a eleger outro candidato do mesmo partido. “Em 2016, a única mulher puxadora de votos que contribuiu para eleger outra mulher foi a vereadora Áurea Carolina (PSOL), que puxou a Cida Falabela (PSOL) em Belo Horizonte.

Ainda se referindo a eleição de 2016, ela cita que nas outras três capitais – Recife (PE), Belém (PA) e Porto Alegre (RS) – em que as mulheres foram puxadoras de votos ajudaram a eleger homens. No Recife, Michele Collins (PP) liderou a votação para a Câmara de Vereadores, ajudando a eleger mais um candidato do seu partido.

DEPOIMENTOS

Fui vítima de preconceito, muitas vezes de maneira subliminar. Na campanha, afirmavam que meu pai (ex-governador João Lyra) que iria mandar na prefeitura e não falavam isso de candidatos homens, filhos de políticos. Depois, jogaram que eu estava grávida, como uma maneira de querer evidenciar uma possível fragilidade e eu nem estava. Queriam passar para o eleitor a ideia de que eu não iria participar do primeiro ano do mandato pela gravidez”, disse Raquel Lyra (PSDB), prefeita de Caruaru.

Quando fui candidata pela primeira vez, apresentei minhas propostas para um eleitor e ele gostou, mas disse que não votaria em mim, pois não enxergava uma mulher administrando a cidade. E nós, quando estamos em cargos públicos, não podemos mostrar fragilidades, pois seremos criticadas. Ainda assim, acredito que vale a pena lutar, temos que ser exemplo para que outras mulheres se inspirem e participem”, afirmou Débora Almeida (PSB), prefeita de São Bento do Una.

 "Oficialmente, nossos direitos são iguais. Temos as mesmas prerrogativas, mas na subjetividade, a gente sente que o machismo é instalado. Sentimos discriminação, como se a gente não soubesse dominar todas as pautas, nem as artimanhas da política. Alguns ainda enxergam que a mulher só serve para cuidar da casa, para ficar atrás de um grande homem. Isso é reflexo de nossa formação, mas não podemos aceitar”, destacou a deputada estadual Teresa Leitão (PT).

 "Sou solteira, não casei pois queria ser freira, mas não consegui. Mesmo assim, era tida como modelo de piedade. Quando me candidatei a prefeita de Salgueiro, nos anos 1990, meu vice foi um menino que eu alfabetizei e tinha mania de chamar de meu filho. A partir daí, criaram a história de que eu era mãe solteira para atacar minha imagem, um juiz chegou a me questionar e ninguém pergunta ao homem quantos filhos ele tem fora do casamento”, lembrou a deputada federal Creuza Pereira (PSB).

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