A polêmica em torno do PL do Agrotóxico

A aprovação do voto do relator do projeto trouxe a tona a discussão sobre esse tema que deve chegar ao debate eleitoral
Ângela Fernanda Belfort
Publicado em 08/07/2018 às 7:01
A aprovação do voto do relator do projeto trouxe a tona a discussão sobre esse tema que deve chegar ao debate eleitoral Foto: Foto: Luís Macedo/Agência Câmara


Enquanto alguns países desenvolvidos estão estimulando a produção de uma agricultura orgânica (sem aplicação de produtos químicos), a Comissão Especial da Câmara dos Deputados, em Brasília, aprovou o voto do relator do projeto 6299/2002 que vai flexibilizar o uso de defensivos agrícolas – o que inclui uma série de produtos químicos que matam desde inseto a fungos, entre outros. É um dos assuntos mais polêmicos e envolve muitos interesses... O Brasil é um grande produtor de alimento, possui um clima que facilita o aparecimento de pragas, insetos, fungos, entre outros que podem arruinar qualquer produção no campo. Foi aprovado foi apenas o voto do relator, o deputado federal Luiz Nishimori (PR-PR) que se pronunciou favorável ao PL, na Comissão Especial que acompanha o projeto. Essa discussão pode ser um dos temas a ser debatido na próxima eleição.

Depois da aprovação na Comissão Especial, o PL 6299/2002 vai passar por uma votação no plenário da Câmara, seguindo para o Senado e somente após essas duas etapas pode ser sancionado pelo presidente da República. Na comissão especial da Câmara, a aprovação do voto do relator contou com 18 votos a favor e com nove contrários. Dos 18 que votaram a favor, 13 representam Estados que são grandes produtores de alimentos, como Rio Grande do Sul, São Paulo, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins.

O PL tramita na Câmara desde 2002 e é de autoria do então senador Blairo Maggi (PP), um dos maiores produtores de soja do País e atualmente Ministro da Agricultura. A primeira polêmica do projeto diz respeito à nomenclatura. O PL estabelece que o termo agrotóxico deve ser trocado por “defensivos agrícolas” e “produtos fitossanitários”.

O PL 6299 altera a forma de autorização dos registros para o lançamento de novos produtos, passando a ser uma atribuição do Ministério da Agricultura. Hoje, essa autorização passa por três instâncias diferentes: o Ministério da Agricultura, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério do Meio Ambiente via Ibama. O registro de um novo produto desse tipo leva de seis a oito anos para ser concluído, segundo o voto do relator da Comissão Especial, o deputado federal Luiz Nishimori (PR-PR). E, no mercado internacional, produtos novos nessa área aparecem anualmente.

O projeto estabelece a criação de um sistema de registro e autorização temporários que ocorreria somente com os produtos que tenham registros e sejam usados em três países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – grupo que em fevereiro último tinha 35 países, incluindo vários desenvolvidos – . Além dessa última exigência, os produtos com registro temporário também devem adotar o código da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação da (FAO), um padrão internacional. Nesse caso, o registro temporário terá um prazo de um ano para ser concluído o processo que o transformaria em definitivo ou não.

RISCO

Para a obtenção do registro, a empresa terá que fazer uma classificação de risco do produto. E aí vem outro fator que também pode provocar polêmica: o projeto propõe que os produtos de risco aceitável sejam liberados. Geralmente, o parâmetro do aceitável é definido com testes em cobaias, observando se ocorre alguma mutação nos animais. De uma forma grosseira, esse teste indica que o uso numa certa quantidade não vai trazer consequências (mutações) aos seres vivos. “O problema é que alguns produtores podem dizer que vão usar 10 e usar 100”, conta um fiscal agropecuário, que preferiu não se identificar.

“Todos os países usam defensivos agrícolas, que levam sanidade para as plantas. Sem o uso desses produtos, não teríamos a metade da produção agrícola que o Brasil possui hoje. O orgânico só responde por 1% da produção nacional da agricultura”, diz o deputado federal Valdir Colatto (MDB/SC) , também engenheiro agrônomo. Ele faz parte da Comissão Especial que analisa o PL 6299 e votou a favor da aprovação do voto de Nishimori.

“No Brasil, as plantas não conseguem sobreviver sem os defensivos agrícolas, porque não há frio para matar os insetos, os fungos. O atual projeto moderniza a atual legislação que é de 1989. De lá pra cá, a tecnologia avançou”, revela o parlamentar, argumentando que as mudanças que o PL vai fazer diminuirá a burocracia. “O PL sugere que seja implantado um sistema on line com a coordenação do Ministério da Agricultura para liberar o registro. Hoje, em média se leva, em média, se leva oito anos para a aprovação do registro. É por isso, que aqui se usa produtos antigos, enquanto outros países utilizam os mais modernos”, diz.

Também circularam informações de que o PL vai permitir que o Brasil use produtos que já proibidos nos países desenvolvidos. “Isso não procede. Se isso acontecer, os produtos agrícolas exportados pelo Brasil serão devolvidos”, conclui Colatto.
O presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool de Pernambuco (Sindaçúcar-PE), Renato Cunha é a favor do PL 6299. “Me recuso a acreditar que o Ministério da Agricultura vá liberar um produto que prejudique os alimentos, a saúde humana e animal”, resume se referindo a centralização do registro que ficará com o Ministério da Agricultura.

 CRÍTICAS

 O Projeto de Lei 6299/2002 divide a sociedade. “Essa iniciativa vai repassar uma parte das atribuições que são da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para o Ministério da Agricultura, cujo interesse maior é aumentar a produção agrícola. O Ministério ficará responsável pelo registro, classificação, controle, inspeção e fiscalização”, dispara o deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG), se referindo as alterações previstas no PL para o registro de novos agrotóxicos. Ele foi um dos votos contrários ao voto do relator aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados.

O parlamentar defende que as leis deveriam priorizar primeiro a saúde e depois o meio ambiente, “o que não ocorre com o PL 6299 que dá prioridade à produção. O País já é um dos maiores consumidores de agrotóxicos com uma média de 5 litros desses produtos por habitante/ ano”, conta Júlio.
Ele não está sozinho. A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) colocou no seu site um dossiê que tem várias críticas feitas ao PL6299 feitas por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Nacional do Câncer (Inca) e também por representantes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), entre outros.

Segundo o dossiê, o cálculo do “risco aceitável” para alguns produtos se daria “basicamente por meio da definição de doses nas quais esses efeitos, em tese, não se manifestariam”, sendo difícil estabelecer um limite de segurança. Ainda no documento, alguns cientistas defendem que só a identificação do perigo (à saúde humana) deveria ser suficiente para barrar o uso do produto, argumentando também que não é aceitável o risco às mutações – que podem gerar doenças.
O dossiê da Abrasco defende a aprovação do Projeto de Lei (PL) 6670/2016 que prevê uma Política Nacional de Redução de Agrotóxico (PNaRA). Apresentado em 2016, o PL (6670) até hoje aguarda o parecer do relator da comissão especial que vai acompanhá-lo na Câmara. Enquanto isso não ocorre, o projeto #Chega de Agrotóxico já coletou a assinatura on line de mais de 1,1 milhão de pessoas pedindo a aprovação do PNaRA. 

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