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Comportamento de magistrados no caso Lula levanta debate sobre CNJ

Entre 2008 e 2018, foram 87 punições aplicadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a 74 magistrados e cinco servidores
Ângela Fernanda Belfort
Publicado em 15/07/2018 às 16:12
Entre 2008 e 2018, foram 87 punições aplicadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a 74 magistrados e cinco servidores Foto: Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil


A recente briga jurídica envolvendo a soltura do ex-presidente Lula (PT) com decisões do plantonista do Tribunal Regional Federal (TRF-4), Rogério Favreto, o relator da Lava Jato no TFR-4, João Geabran Neto, e o juiz Sergio Moro fez muitas pessoas se perguntarem: quem pode punir um magistrado quando comete um erro no exercício da função? Segundo especialistas, os três cometeram “equívocos” nos seus despachos. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é o órgão máximo para aplicar punição aos magistrados e servidores da Justiça.

Entre 2008 e 2018, foram 87 punições aplicadas a 74 magistrados e cinco servidores. O número é considerado inexpressivo por alguns profissionais da área. E isso ocorre por vários fatores, desde a falta de recursos humanos no Conselho, passando pela demora na conclusão dos processos – que resultam nas penalidades – até a “presença do corporativismo”.

Para punir um magistrado, o primeiro passo do CNJ é instaurar um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), similar a um processo judicial no qual existe o direito a defesa, prazos, entre outros requisitos a serem cumpridos. Nos últimos dez anos, o CNJ instaurou 123 PADs. Desse total, 66 resultaram nas 87 punições. Um magistrado pode ter mais de uma punição no mesmo PAD, que também pode resultar na punição de vários magistrados. Instaurado em 2010, somente o PAD de nº 1922 resultou na punição de aposentadoria compulsória de dez magistrados.

Um PAD leva de um a sete anos para ser concluído, segundo informações do CNJ. “É tempo demais. Na minha opinião, seria possível fazer em menos tempo”, diz o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Direito) do Rio de Janeiro Ivar Hartmann. E complementa: “Não há a cultura de reconhecer o CNJ como um órgão necessário e disciplinador. Ele ainda não foi aceito e assimilado pela maioria dos juízes do Brasil”.

A presença pequena de integrantes da sociedade é notada. “O corporativismo é o maior problema do Brasil. Também ocorre na advocacia. Se é um órgão de controle externo, é de se esperar que tivesse uma participação maior de pessoas que representem a sociedade civil”, afirma o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Pernambuco (OAB-PE), Ronnie Duarte.

O CNJ é um colegiado com 15 membros, dos quais nove representam órgãos da magistratura; dois são advogados; dois são indicados pelo Ministério Público da União e Ministério Público dos Estados. Ou seja, 13 são profissionais com carreiras na área do Direito. Somente dois cidadãos de notável saber jurídico – um indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado – fazem parte do plenário do conselho, que toma as decisões mais importantes – incluindo a aplicação de penas aos magistrados.
“Seria possível dar outro passo adiante com uma representatividade no CNJ que não fosse majoritariamente de uma mesma carreira”, argumenta Ronnie Duarte. Mas as propostas que tratam sobre isso não avançaram no Congresso Nacional.

As penas aplicáveis aos magistrados também não são consideradas proporcionais quando comparadas com outras profissões. A mais grave punição é a aposentadoria compulsória, proporcional ao tempo de serviço. Depois de dois anos de exercício, os juízes são cargos vitalícios. Os cinco casos de demissões aplicadas pelo CNJ foram de servidores. Nos últimos dez anos, não houve qualquer magistrado demitido por punições aplicadas pelo CNJ.

A segunda pena mais grave aplicada a um magistrado é a disponibilidade, na qual ele fica afastado do cargo, ganhando proporcionalmente ao tempo de serviço. Depois de dois anos de afastamento, o magistrado pode pedir o retorno ao cargo.

Outro lado

“O CNJ passa pelo mesmo problema que, via de regra, abarca todo o Judiciário: o excesso de demandas, superior à capacidade da sua estrutura, e a consequente impossibilidade de dar respostas a todas elas em tempo razoável. A redução do tempo de tramitação dos processos é um desafio não apenas do CNJ, mas de todo o Judiciário”, resume o magistrado Rubens Curado da Silveira, juiz do Trabalho de Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10), que foi secretário-geral do CNJ em 2009 e conselheiro entre 2013 e 2015.

Além do CNJ, Rubens argumenta que existem quase 90 tribunais brasileiros que podem punir magistrados, quando necessário, por isso o número “é muito maior que as 87 punições”. Segundo ele, são cerca de 17 mil magistrados no País. “Não vejo o CNJ como um órgão ‘corporativo’. Muito ao contrário... a sua atuação histórica não permite a conclusão, no meu entender, de que o CNJ seja permeável a corporativismos”, respondeu.

A presidência do CNJ é ocupada pela presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia. Os “equívocos” envolvendo os três magistrados citados no início dessa reportagem estão sendo apurados pela Corregedoria Nacional de Justiça que vai enviar esses processos ao CNJ, que decide se instaura um PAD ou não. A Corregedoria não tem prazo para concluir a investigação iniciada.

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