Municípios de olho na repactuação do Pacto Federativo

Prefeitos querem que a distribuição dos recursos tributários ocorra de forma a contemplar mais os municípios
Ângela Fernanda Belfort
Publicado em 25/11/2018 às 9:15
Prefeitos querem que a distribuição dos recursos tributários ocorra de forma a contemplar mais os municípios Foto: Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem


A repactuação do pacto federativo tem que sair, mesmo que seja a longo prazo, para que a distribuição dos recursos tributários ocorra de forma a contemplar mais os municípios, na opinião dos especialistas ouvidos pelo JC. “Esse grande nó do federalismo no Brasil veio depois da Constituição de 1988, que sobrecarregou os municípios. É preciso que a União e o Estados pactuem não apenas do ponto de vista dos recursos, mas também do controle, do custeio, dos serviços e das responsabilidades”, resume o diretor de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Ipea, Constantino Cronemberger Mendes.

“As receitas praticamente empataram com as despesas dos municípios. A despesa de pessoal dos municípios em média cresceu 6,8%. A parte do pessoal que mais está crescendo é o inativo, que aumentou em torno de 30%”, cita Constantino, se referindo aos números divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional (Siconfi), que comparou os dados de 2017 com os de 2016. “Os pequenos não têm escala para oferecer serviços de forma eficiente. Então, para reduzir esses custos deveriam ser criadas formas consorciadas de oferecer um serviço, porque geralmente as cidades de uma mesma região têm problemas semelhantes. Por exemplo, um único aterro sanitário para algumas cidades. Isso também vale para a área de saúde, educação, rodovias intermunicipais, entre outros”, conta Constantino.

Também defende uma revisão do pacto federativo o doutor em história econômica e professor do Insper Vinícius Müller. “Os Estados e municípios precisam ser mais equilibrados constitucionalmente, juridicamente para, de alguma maneira, redistribuir os direitos e deveres de ambos com mais capacidade de arrecadação sem depender tanto dos repasses da União. A descentralização federativa promovida pela Constituição de 1988 ficou pela metade”, afirma. Dos tributos arrecadados no País, a União fica com 50%, os Estados, 31%, e os municípios, com 19%.

A Constituição de 1988 trouxe mais obrigações aos municípios, como maior responsabilidade no ensino fundamental e na educação infantil. Também aumentaram as obrigações na área de saúde, e ambas as áreas demandam mais mão de obra. “Cerca de 95% dos municípios de Pernambuco não são sustentáveis do ponto de vista da receita. Essa média no Brasil é de 85%”, conta Vinícius. Ele também argumenta que é preciso melhorar a atividade econômica dos municípios, explorando os seus respectivos potenciais para serem mais sustentáveis.

“Cada gestor deveria ver como está a sua receita para ver o quanto pode gastar antes de fazer uma despesa”, cita o diretor de controle municipal do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), Antonio Cabral. Em 2018, o TCE emitiu 330 alertas aos 184 municípios do Estado e Noronha sobre o fato de estarem perto de ultrapassar os limites com pessoal estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para o Executivo municipais. Alguns municípios receberam mais de um alerta. Nessa lei, os municípios não podem gastar acima de 54% da sua Receita Corrente Líquida (RCL) com despesas de pessoal.

A situação dos municípios que ultrapassam os limites da LRF pode ficar ainda mais complicada porque podem ter os recursos do FPM retidos pela União, ficarem sem contrair empréstimos etc. “Cada caso é um caso. Aumentar a receita própria é importante, mas há cidades que são pobres, e não há como isso ocorrer. Também é necessário ver se cada contrato está com valores compatíveis com os do mercado, se está gastando no que a população precisa”, sugere Cabral.

PROJETO CRIA NOVAS CIDADES

Mesmo com a crise nos municípios, ainda está tramitando o Projeto de Lei Complementar (PLP) 137/2015 na Câmara dos Deputados, em Brasília, o qual pode contribuir para a criação de pelo menos 400 novos municípios em todo o País. No Estado, existem pelo menos oito projetos com a finalidade de criar novos municípios que podem ser “desarquivados” na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).

Os projetos que se encontram “desarquivados” são os que estão na frente, propondo a transformação das seguintes comunidades em municípios: Ponta de Pedras (em Goiana); Nossa Senhora do Ó (em Ipojuca); Rajada (em Petrolina); Ameixas (em Cumaru); Barra de São Pedro (em Ouricuri); Cavaleiro dos Curados (em Jaboatão dos Guararapes); Cruz de Rebouças (em Igarassu); e Vermelhos (em Lagoa Grande). Atualmente, os municípios vivem uma grande crise provocada pelo aumento das despesas, má gestão e queda nas receitas.

Ainda de acordo com a assessoria da Alepe, esses projetos foram desarquivados no começo da atual legislatura, em 2015, e isso habilita os mesmos a serem votados, caso os deputados estaduais queiram retomar a sua tramitação. E não para por aí.
Na Assembleia Legislativa de Pernambuco, estão arquivados pelo menos 22 projetos de lei que estabelecem a criação de pelo menos mais 22 municípios. Esses só poderão ser desarquivados na próxima legislatura, que começará em 2019. No entanto, para os projetos locais serem desarquivados, é necessária a aprovação do PLP 137/2015, que regulamenta como será a criação dos novos municípios.

Cada município a ser criado passará a ter uma prefeitura – com secretários, servidores e uma Câmara Municipal, que terá, no mínimo, nove vereadores –, gerando novas despesas, enquanto os recursos destinados às prefeituras continuarão basicamente os mesmos: a arrecadação de tributos como o Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), o Imposto de Renda (IR) – ambos recolhidos pela União – e as transferências do ICMS arrecadado pelos Estados.

“Aproximadamente 95% dos municípios vivem de transferências da União e dos Estados”, conta o economista e diretor-sócio da Ceplan Consultoria Jorge Jatobá, secretário estadual da Fazenda no governo Jarbas Vasconcelos (MDB). “É uma redistribuição da pobreza. Esses recursos irão para gastos com pessoal e custeio, quando deveriam estar indo para investimentos em segurança, saúde e educação. É uma irresponsabilidade da Câmara aprovar um projeto desse”, resume. O economista alega que “a criação de novos municípios atende somente aos interesses corporativos dos políticos, e não do País”.

O PLP chegou a ter o seu caráter de urgência aprovado pela Câmara dos Deputados. No dia 13 de junho deste ano, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) encaminhou um requerimento solicitando a retirada de pauta do mesmo, mas tal requerimento não chegou a ser votado naquela sessão. Ainda nos dias 20 de junho, 3 e 7 de julho, a matéria foi incluída na ordem do dia da sessão daquela casa, mas não foi apreciada por causa do encerramento da sessão. Mas o projeto pode voltar à pauta a qualquer momento.

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