Proposta de reforma tributária recebe críticas do setor de serviços. Consumidor pode pagar a conta

Proposta do governo federal cria nova contribuição com alíquota única de 12% em substituição a Pis/Cofins que tem alíquotas inIciando em 3,65%
Edilson Vieira
Publicado em 22/07/2020 às 21:38
Aumento da carga tributária terá reflexo no preço dos serviços, como as mensalidades escolares Foto: LEO MOTTA/ACERVO JC IMAGEM


Empresas do setor de serviços já se sentem penalizadas pela primeira parte da reforma tributária, entregue esta semana ao Congresso, pelo governo federal. Pela proposta, o Pis/Cofins seria substituído pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). A alíquota do PIS/Cofins para o setor de serviços parte de 3,65% (para arrecadação sobre lucro presumido) e a CBS teria alíquota única de 12%. Um aumento de quase quatro vezes. Empresas como locadoras de mão de obra, escolas e universidades privadas, empresas de tecnologia, além de profissionais liberais como advogados e médicos, entre muitos outros segmentos, irão pagar mais tributos. A proposta está em análise por uma comissão mista formada por membros do Senado e da Câmara Federal.

O setor de serviços é responsável por mais de 60% do PIB nacional e grande gerador de empregos. O governo propôs atenuar o aumento da carga tributária com um sistema de crédito, onde é possível ao empresário compensar o novo tributo abatendo o valor que já foi pago por uma empresa que lhe fornece matéria prima ou insumos. Para o advogado tributarista Ivo Lima, do escritório Ivo Barboza & Advogados Associados, o sistema pode funcionar para uma indústria, mas não para o setor de serviços. “Aqui no escritório pagamos 3,65% de Pis/Cofins. Mas meu insumo é mão de obra, que não dá direito a crédito. Eu não terei como compensar um aumento de quatro vezes no meu encargo”, explicou. Ivo Barboza, lembra que na proposta do governo, os bancos e financeiras ficaram com uma alíquota menor, de 5,8%, justamente porque não podem gerar crédito. “Um segmento é beneficiado e o outro é penalizado. É contraditório”, protestou.

REPASSE

O economista da Fecomércio-PE, Rafael Ramos, vê com preocupação a possibilidade de aprovação da reforma tributária como está. “A partir do momento que o governo aumenta a carga tributária, praticamente poda o desenvolvimento do setor”. A projeção de crescimento para este ano era de 2,7%, antes da pandemia, mas até maio, segundo o IBGE, a queda já era de 7,6%. Rafael Ramos diz que até o repasse para o consumidor do custo com a nova contribuição é inviável no cenário atual. “Isso é possível quando se está em crescimento econômico, com demanda aquecida. Não é o caso agora. Qualquer repasse de aumento para o consumidor vai reprimir mais ainda as vendas”.

O presidente do Porto Digital, Pierre Lucena, diz que para empresas de serviços de alto valor agregado, como as de tecnologia, a reforma “piora o que já está ruim”. Lucena revela que a carga tributária sobre o setor dele é, em média, de 34% por utilizar muita mão de obra. “O custo de contratação é muito elevado”. Ele diz até entender a intenção do governo em dar racionalidade à questão tributária, mas é categórico sobre a possibilidade de aprovação do texto pelo Congresso. “Na prática, não vai passar’. Lucena diz que a reforma deveria ser mais discutida. “No nosso segmento, elevar custos significa perder competitividade, principalmente em relação às empresas estrangeiras”.

CUSTO

O presidente do sindicato das escolas particulares em Pernambuco (Sinepe), José Ricardo Diniz, está analisando o texto da proposta do governo, mas já a considera desproporcional. “A penalização da área de serviços é evidente. No caso específico da educação, essa carga maior vai pesar na definição dos nossos custos e nos valores das mensalidades. Isto quando já temos um achatamento da renda de boa parte da população”.

O presidente do Sindicato dos Fazendários do Recife, Fábio Macêdo, que também é consultor da Associação Nacional dos Auditores Fiscais de Tributos dos Municípios e do Distrito Federal (Anafisco) também afirma que a proposta do governo evidencia que o setor de serviços será o mais penalizado, "justamente o segmento que mais emprega e foi fortemente atingido pela crise da covid-19. Afinal, não há delivery de serviços”, ironiza.

Para o auditor fiscal Fábio Macêdo, parece que há um preconceito contra o regime cumulativo de tributação. “Este é o regime ideal para cadeias produtivas curtas, traz a simplicidade para o contribuinte e para as administrações na definição do tributo devido, como é o caso dos prestadores de serviço”.

A situação, segundo ele, é semelhante ao imposto de renda, onde há o lucro presumido e o real. “O primeiro, mais simples de apuração, possui uma alíquota menor sem a necessidade de apresentar despesas dedutíveis, enquanto o segundo é mais complexo. A simplicidade na apuração é importante para o contribuinte, imagine se o imposto de renda das pessoas físicas só permitisse a dedução completa, além de trabalhoso, poderia ensejar um aumento do recolhimento”.

Fábio Macêdo enfatizou ainda que o setor de serviços possui cadeias curtas e o regime cumulativo que há no PIS e Cofins, tributos federais, bem como o ISS, são importantes para viabilizar essa atividade. “Tributar num modelo de um IVA (Imposto de Valor Agregado) irá impactar na vida do cidadão, que suportará expressivo aumento de preços em serviços importantes como educação, saúde, entre outros”, analisou.

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