Bolsonaro nomeia olavista, dono de universidade e militar para o Conselho Nacional de Educação

O CNE é responsável por diversas deliberações da educação como diretrizes educacionais, curriculares e aprovações de cursos superiores
Carolina Fonsêca
Publicado em 10/07/2020 às 15:25
Bolsonaro tem resistência a proposta ações mais forte na reforma administrativa. Foto: MARCOS CORRÊA/PR


O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nomeou, nesta sexta-feira (10), 11 novos membros para o Conselho Nacional de Educação (CNE). A conselheira Suely Menezes e o atual presidente do Conselho, Luiz Roberto Liza Curi, foram reconduzidos. Entre os novos nomes, estão um aluno do escritor Olavo de Carvalho, um dono de universidade e um ministro do Supremo Tribunal Militar.

O CNE é responsável por diversas deliberações da educação como diretrizes educacionais, curriculares e aprovações de cursos superiores. Antes de deixar o cargo, em 18 de junho, o então ministro da Educação na época, Abraham Weintraub havia encaminhado à Casa Civil uma lista prévia de indicados.

O governo aguardava a definição do novo titular da pasta para definir os novos nomeados, mas os mandatos, que foram repostos com as nomeações de Bolsonaro, vencem nesta sexta-feira (10). Sem essas nomeações, o quórum do CNE poderia ficar comprometido para realizar as deliberações.

Os mandatos dos conselheiros do CNE têm duração de quatro anos. O órgão conta com 24 conselheiros, sendo 12 para a Câmara de Educação Básica e 12 para a Câmara de Ensino Superior - esta segunda inclui os representantes do Ministério da Educação (MEC). O MEC tem, por lei, representação no CNE. Ou seja, das 24 posições do Conselho Nacional de Educação, duas já são do MEC. 

As escolhas feitas pelo presidente foram mal recebidas por órgãos e lideranças ligadas a educação. A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consend) emitiram nota de repúdio aos critérios utilizados pelo governo para composição do CNE.

A Undime afirmou que Bolsonaro ignorou as indicações das instituições responsáveis pela gestão dos sistemas públicos de educação e desconsiderou as representações de 27 redes estaduais e 5.568 redes municipais, indo na contramão da instituição do Sistema Nacional de Educação.

"O CNE é um órgão de Estado e não de um governo. Enquanto instituição máxima da Educação, para ter respeitabilidade, legitimidade e autenticidade em suas decisões, deveria ter o mínimo de uma representação das redes públicas estaduais e municipais, responsáveis por mais de 80% de todas as matrículas da educação Básica do País e mais de 40 milhões de estudantes", reivindica a nota.

Além da nota de repúdio assinada pela Undime e pelo Consend, o 'Instituto Educatores', que reúne os ex-secretários de Educação, também emitiu uma nota pública, defendendo vagas natas para representantes das redes de ensino. No documento, o Instituto disse que não houve respeito aos secretários estaduais e municipais.

Membro do CNE entre os anos de 2005 e 2013 e em mais uma passagem há um ano e meio, Mozart Neves, que já foi secretário de Educação de Pernambuco e é professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também sinalizou que o presidente ignorou o fator representatividade, fundamental para o Conselho.

"Estamos ainda lamentando muito. A gente sempre acompanhou como se dá esse processo de renovação dos conselheiros, sempre historicamente, até porque sendo o Brasil um país federativo, onde toda a educação básica é executada pelos estados e municípios,  sempre a Undime, que reúne os secretários municipais e o Consend, que reúne os secretários estaduais, sempre tiveram representação no CNE e pela primeira, por exemplo, essas entidades não tiveram representação, o que é muito ruim do ponto de vista do regime de colaboração e representação das políticas públicas. É importante porque faz uma ponte natural de representação dessas unidades com o CNE e a gente identifica que o governo, para a educação básica, colocou representantes olavistas e evangélicos deixando de colocar entidades como a Undime e o Consend", afirmou. 

Leia na íntegra a nota de repúdio do Undime e Consend

"AOS CRITÉRIOS UTILIZADOS PELO GOVERNO PARA COMPOSIÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

O Conselho Nacional de Secretários de Educação e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, que até a formação atual tinham vagas no Conselho
Nacional de Educação, vêm a público repudiar os critérios utilizados pelo Governo Federal para a nova composição do CNE. Ignorar as indicações das instituições
responsáveis pela gestão dos sistemas públicos de educação e desconsiderar as representações de 27 redes estaduais e 5.568 redes municipais vai na contramão da instituição do Sistema Nacional de Educação.

O CNE é um órgão de Estado e não de um governo. Enquanto instituição máxima da Educação, para ter respeitabilidade, legitimidade e autenticidade em suas decisões, deveria ter o mínimo de uma representação das redes públicas estaduais e municipais, responsáveis por mais de 80% de todas as matrículas da Educação Básica do País e mais de 40 milhões de estudantes.

Ademais, neste momento em que o país se encontra às voltas com a expectativa pela nomeação de um novo ministro da Educação, quando diálogo, reconhecimento e respeito mútuos são valores essenciais para nossa relação com o MEC, desconsiderar as sugestões dos gestores da educação pública de todo o país para a composição de um colegiado tão importante como o CNE transmite uma mensagem negativa e
preocupante.

Por fim, no sentido de coibir decisões equivocadas que não respeitam e não consideram a importância da articulação entre as três instâncias federativas, faz-se
necessário e urgente que o Congresso Nacional regulamente o SNE, estabelecendo em lei nova forma de composição do CNE, com a devida representação paritária das três esferas de governo."

Nota do Instituto Educatores

"O Instituto Educatores, que reúne os ex-secretários estaduais de Educação e acompanha atentamente as ações em educação no País, viu com preocupação as novas designações para o Conselho Nacional de Educação, assegurada por competência legal ao Presidente da República. O CNE é uma das instituições mais importantes do sistema educacional brasileiro. Nos anos recentes, aprovou a Base Nacional Comum Curricular, regulamentou o Novo Ensino Médio, as diretrizes curriculares para o Ensino Médio, e as diretrizes para a Formação de Professores. Em meio à pandemia, foi o CNE que regulamentou o ensino remoto e contribuiu com orientações para as redes.

Considerando essa importância, para atuar no conselho não basta a titulação acadêmica, é preciso ter experiência de gestão, conhecer a legislação da educação pública, e conviver com diferenças metodológicas e de abordagem, contribuindo para políticas públicas que dialoguem com a diversidade. Dessa forma, mais do que nunca, é preciso garantir a existência de vagas natas para instituições que representam as redes de ensino.

Sem dúvidas, a maior perda neste momento crucial para o sistema educacional brasileiro é o fato de não ter sido assegurado ao Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e à União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), instituições que representam o ensino básico no País, uma vaga na Câmara de Educação Básica do CNE. Não houve respeito às redes estaduais e municipais de ensino, que concentram mais de 40 milhões de alunos e das
quais dependem a Educação Básica no país.

Mesmo com conselheiros com competências individuais no CNE, seria fundamental que o Conselho tivesse representatividade institucional, tanto para o ensino básico como para o ensino superior, como de fato é solicitado às Instituições."

 

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