Falta de apoio dos bancos às microempresas reduzirá capacidade de economia retornar de forma mais rápida

Fernando Castilho
Publicado em 27/06/2020 às 23:00
O comércio varejista com as lojas fechadas terá mais dificulade de voltar a funcionar depois da crise da covid-19. Foto: ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM


Por Fernando Castilho da Coluna JC Negócios

Num país onde os bancos públicos e privados têm baixíssima taxa de operações dinâmicas com o segmento de micro e pequenas empresas, a negação de crédito no momento de falta de capital de giro devido à covid-19 vai cobrar um alto preço à economia brasileira.

No momento em que ele tenta retomar as atividades, o fechamento de milhares dessas organizações que geram empregos de baixo custo e rapidamente ampliam a capacidade de tração do mercado vai perder força porque elas terão fechado suas portas.

Não foi por falta de dinheiro à disposição dessas empresas pelo Banco Central. De certa forma, o BC flexibilizou normas para que os bancos abrissem o cofre em mais de R$ 1,2 trilhão.

Entre os países emergentes foi o que mais colocou dinheiro a disposição das empresas, inclusive, forçando a baixa dos juros.

Mas a realidade do mercado, a inexistência de uma cultura bancária no financiamento regular das micro e pequenas empresas (6,8 milhões), travou as operações quando os negócios pararam durante a covid-19 mesmo o segmento gerando 54% dos empregos formais no país e pagar 44% da massa salarial.

Entretanto, como as empresas praticamente não tomavam crédito ou faziam operações mais complexas com os bancos, alegando a exigência de garantias reais que não tinham, os bancos, por sua vez, se queixavam das exigências burocráticas que tratam uma microempresa do mesmo modo que uma empresa com ações em Bolsa na hora de emprestar.

O problema é que com a covid-19, o Brasil soube que do total de 7,3 milhões de mulheres empregadas nas MPE com carteira assinada, 53% estão nas empresas de Serviços e esse segmento vai perder capacidade de retomar as atividades porque milhares delas estão fechando suas portas.

Mas o número de operações feitas e tão pequeno que os dados de prorrogação de parcelas (R$ 33,1 bilhões) representado por pequenas empresas está no site da Febraban agregado ao de pessoas físicas.

Outro dado que mostra essa falta de conexão dos bancos com o segmento. Dos 9,7 milhões de contratos que os bancos negociaram eram de operações em dia que tinham um saldo devedor total de R$ 550,1 bilhões.

Na prática, o que os bancos fizeram foi repactuar (suspender) os prazos de R$ 61,5 bilhões. Mas sem liberar crédito novo.

Embora ainda essa conta ainda não tenha sido fechada já se sabe que a maioria dos 10 milhões de empregos perdidos na pandemia estavam nessas organizações.

São empresas familiares, grande parte na segunda geração, com boas marcas no mercado e clientela firme que sem capital de giro não vão reabrir suas portas quando as prefeituras autorizarem.

O fenômeno vai gerar efeitos colaterais graves. No comercio o fechamento de micro e pequenas empresas reduz capacidade de escoamento da indústria.

No serviços também reduz o consumo de insumos produzidos pela indústria. Historicamente. 24% das micro e pequenas empresas morrem após dois anos de funcionamento número que deve explodir em 2020.

O fechamento de micro e pequenas empresas terá um efeito devastador no setor de franchising pela incapacidade de manter lojas e pontos de milhares de franqueados reduzindo a expansão das franqueadoras.

Haverá mais um outro efeito colateral. Sem capacidade financeira de demitir e pagar as verbas rescisórias trabalhistas, essas empresas já estão explodindo o número de causas trabalhistas que cobram o direito de acesso de imediato a liberação do FGTS e do seguro desemprego.

O fenômeno da negação de crédito às micro e pequenas empresas tem razões históricas. De forma geral a micro e pequena e se financia com CPF do dono.

Mesmo dispondo de linhas de crédito do BNDES e de fundos como os geridos pelo Sebrae, o relacionamento com o banco no máximo chega a antecipação das faturas de cartão de crédito.

Isso não quer dizer que elas não consigam, mas para conseguir um empréstimo para ampliação de lojas ou modernização de equipamentos as empresas precisam de ajuda de consultoria financeira para vencer a burocracia.

Essa falta de relacionamento do banco com o CNPJ de pequeno faturamento foi o responsável pela recusa de 8 em cada 10 pedidos de crédito durante a pandemia segundo o Sebrae. E sem esse dinheiro as empresas não vão voltar e isso reduzirá drasticamente a capacidade de tração da economia no segundo semestre.

O mais grave desse cemitério de CNPJ é que seria esse segmento que pela sua característica quem mais tem potencial de gerar emprego.

Esse fenômeno ficou evidente dentro do próprio no cadastro do auxílio emergencial. Milhões de pessoas que se habilitaram eram prestadores de serviços a micro e pequenas empesas e de MEI. Agora eles não terão mais clientes.

O perfil dos bancos no Brasil também impediu que eles pudessem ampliar sua base de crédito na hora da crise. Rigorosamente não há no Brasil cultura de crédito solidário a partir de fundos de aval prática comum países da Europa e da Ásia.

O BNDES está há 100 dias tentando organizar um e só agora com o Pronampe acredita que pode chegar na ponta.

Mas já sabe que até nos bancos públicos terão dificuldades. Como no programa 15% do risco é do banco a prática comum é de ao conceder o empréstimo o banco reter esse percentual como garantia.

Ou seja, num empréstimo de R$ 100 mil o banco só entrega R$ 85 mil ao cliente protegendo integralmente o seu risco de um possível calote.

O problema é que ainda assim os bancos estão oferecendo apenas 50% do que os micro e pequenos empresários julgam ser o suficiente para sobreviver.

Outra coisa que vai matar milhares empresas é que dificuldade de manter o programa de ajuda da União, que pagou uma parte do salários dos empregados, combinada com a suspensão de pagamentos dos tributos federais.

Se a MP 939/20 não for renovada o seguro acaba quando milhões de empresas ainda estarão fechadas.

E sem a continuidade do programa, as micro e pequenas empresas vão demitir a maior parte dos 10 milhões de empregados mantidos até agora podendo dobrar o número de desempregados na fila do seguro desemprego.

Assim, mesmo que o governo fale que está ampliando as linhas de crédito, a suspeita é que eles chegaram tarde demais.

A grande empresa aproveitou a crise para acessar esse crédito barato porque tinha todas as garantias. Em maio, por exemplo, as concessões de crédito cresceram 12,5% segundo o BC.

Mas como não há informações de que o crédito chegou a pequena e micro empresas a dedução logica é que esse credito foi tomado pela grande e média empresa que aproveitou a baixa de juros

Os bancos fortaleceram seu caixa e sua rentabilidade embora seja muito constrangedor mostrar que durante os três meses da pandemia sua rentabilidade cresceu.

Mas quem disse que o acionista controlador está preocupado com isso?

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