Criação de José Sarney, vale-transporte faz 36 anos, inacessível a quem não tem carteira assinada

A ideia de que a empresa pagasse para que o empregado chegasse ao trabalho não existia há 40 anos e foi considerada uma grande conquista pelos sindicatos
Fernando Castilho
Publicado em 16/12/2021 às 11:10
CONQUISTA.A ideia de que a empresa pagasse para que o empregado chegasse ao trabalho não existia há 40 anos; hoje trabalhador custeia 6% do valor Foto: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM


O Vale-Transporte está completando 36 anos nesta quinta-feira (16). Um dos direitos do trabalhador mais reconhecidos foi proposta do então presidente José Sarney, que o considera sua maior contribuição para a melhoria das condições de acessibilidade às empresas.

Pode parecer uma coisa despropositada nos dias de hoje com o recrudescimento do debate sobre o custo das passagens, mas a ideia de que a empresa pagasse para que o empregado chegasse ao trabalho não existia há 40 anos e foi considerada uma grande conquista pelos sindicatos.

Na época, as fábricas já forneciam frotas próprias de ônibus para apanhar seus empregados, especialmente nas grandes cidades, mas quem trabalhava numa pequena ou média empresa tinha que bancar o custo do acesso ao trabalho.

O vale-transporte ajudou que outro benefício importante, o vale-refeição, viesse a seguir, sendo criado em 1985 e que acabou se incorporando. O vale-refeição nasceu dentro do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) em 1976, como parte do Programa Nacional de Alimentação e Nutrição.

Mas caso do vale-transporte, é bem interessante porque resolveu um sério problema de quem saía de casa e tinha que ter o dinheiro das passagens.

Em agosto de 1985, quando era presidente da República, Sarney enviou ao Congresso projeto do Executivo propondo a criação do vale-transporte. Depois da aprovação pelos parlamentares, Sarney sancionou a Lei 7.416/85, que instituiu o benefício. Dois anos depois, sancionou também a Lei 7.619/1987, que determinou a obrigatoriedade da concessão do benefício por parte dos patrões.

Em 2012, o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) foi homenageado pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Públicos (NTU) na sala da presidência do Senado, quando recebeu a Medalha do Mérito Precursor do Vale-Transporte, honraria concedida a 25 personalidades que lutaram pela consolidação desse benefício aos trabalhadores brasileiros.

A história, porém, foi dura com o político maranhense. Foi durante o seu governo que o Brasil viveu um dos acontecimentos mais marcantes: a elaboração e promulgação de uma nova Constituição para o Brasil, durante os trabalhos da Assembleia Constituinte que se formou em 1987. O governo de José Sarney é um marco da redemocratização que o Brasil passou na década de 1980. Mas o governo de Sarney, que também tentou combater a inflação e a crise econômica, acabou fracassando.

O vale-transporte, porém, teve luz própria e foi aprovado sem problemas pelo Congresso.
Na verdade, a obrigatoriedade do benefício é um marco para as conquistas trabalhistas e sociais, consolidadas com a Constituição de 1988.

Os números mostram isso. Com o vale-transporte, os trabalhadores com menos renda, que antes investiam até 30% do salário com transporte, passaram a gastar apenas 6% do valor.

Mas até chegar a essa realidade, a categoria precisou percorrer um longo caminho de luta, travada principalmente com os ministros do governo Sarney.

Era um problema econômico e social da época. Era uma época de reajuste de preços em todos os setores e redução do poder aquisitivo da população. Em especial, as pessoas de menor renda. Complicava a prestação dos serviços de transporte coletivo urbano.

As entidades chegaram a propor ao ministro Pedro Malan a assinatura de ato de extinção do benefício, sob o argumento de que seria uma importante medida anti-inflacionária.

Foi quando surgiu a ideia de se instituir um bilhete de acordo com o modelo francês, financiado entre governo, empregadores e passageiros. Os empresários queriam que o Governo pagasse a conta.

O presidente José Sarney foi contra, e assim foi desenvolvida a ideia de um vale-transporte em que o empregador repassasse o bilhete diretamente a seus empregados, sem a intervenção do governo.

O problema é que hoje a questão do transporte do trabalhador virou um obstáculo para quem está fora do mercado de trabalho oficial.

Com 12 milhões de desempregados e mais 13 milhões de pessoas subempregadas, a questão do transporte assusta governantes e gestores do setor.

Na verdade, o grande desafio não é mais se entregar o vale transporte ao trabalhador, mas como levar de volta ao ônibus ou o metrô os trabalhadores sem carteira assinada que não têm acesso ao benefício.

E mesmo depois da pandemia, a situação não se resolveu, porque os sistemas de transportes em nível nacional só conseguem transportar 75% do que transportavam em 2019.

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