Brasil se preocupa com fertilizantes da Rússia, mas fechou grande mina de fosfato que tinha em Olinda

Na década de 50, a família Costa Azevedo - dona das terras onde havia fosforita - implantou uma indústria pioneira de fertilizantes onde hoje é o bairro de Peixinhos
Fernando Castilho
Publicado em 02/03/2022 às 12:00
PERNAMBUCO As terras onde hoje é o bairro de Peixinhos, em Olinda, abrigaram a antiga fábrica Fosforita na década de 50, mas projetos de urbanização ganharam espaço na região Foto: PERNAMBUCO ARCAICO


No ano passado, o Brasil importou 41,6 milhões de toneladas de adubos e fertilizantes, 24% delas vindas da Rússia, fato que tem justificado a posição de neutralidade do País em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia. Foi com esse fertilizante que o Brasil produziu sua safra de 284,3 milhões de toneladas de grãos e mais 580 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, em 2021.

Mas o País - produtor de classe mundial - nunca apostou numa indústria forte para a produção de adubos e fertilizantes para atender esse mercado. Após a crise da Petrobras em 2014, a companhia decidiu sair do negócio, paralisando sua fábrica de fertilizantes nitrogenados em Araucária (PR), em março de 2020.

A estatal também acabou vendendo, no último dia 4 de fevereiro, para o grupo russo Acron, sua fábrica de fertilizantes em Três Lagoas (MS), que está com mais de 80% das obras concluídas para produzir uréia fertilizante, uréia para uso industrial, amônia, gás carbônico e sulfato de amônio.

O que pouca gente sabe é que na década de 1980, a empresa Norfértil S.A. Mineração, Indústria e Comércio - uma associação entre os grupos Petrobrás e LundgreI, com participação minoritária do Governo do Estado -, também se desfez de uma planta de produção de adubos, construindo sobre uma gigantesca mina de fosfato em Olinda e Paulista milhares de residências, em função do adensamento populacional na área norte da Região Metropolitana do Recife.

Recife Arcaico - A Extração do Fosfato Pela Fosforita S/A, Poço Azul e o Poço da Lavadeira - Olinda Início da Década de 1960.

SONHO DE PERNAMBUCO

Esse é a história da fosforita, descoberta em 1949 pelo professor Paulo José Duarte, da UFPE, que desencadeou intensivas investigações, tanto por órgãos governamentais, como por empresas privadas, e que hoje está sob diversos bairros residenciais de Olinda e Paulista.

Segundo estudo do geólogo Nélio das Graças de Andrade da Mata Rezende, autor de “O Fosfato de Olinda e os Conflitos de Mineração”, esse é um caso histórico e ilustrativo, em que a exacerbação da causa ecológica e o uso do solo sem planificação adequada privaram a sociedade de insumos geradores de alimentos e empregos.

Na década de 50, do século passado, os donos das terras onde havia fosforita eram a família Costa Azevedo. Ela chegou a implantar uma planta que funcionou até a década de 70 e fez o DNPM elaborar um programa, executado pela CPRM, sob a denominação de "Projeto Fosfato na Faixa Sedimentar Costeira Pernambuco- Paraíba", que previa o aproveitamento da fosforita para a produção de fertilizantes.

Indústria pioneira de fertilizantes, cuja produção, no período 1957-67, obteve uma das maiores expressões no cenário mineral do País, beneficiando mais de quatro milhões de toneladas de minério. Mas, em 1968, a empresa pediu falência devido aos baixos preços do fosfato.

A FASA detinha cerca de 50% das reservas globais na área da Região Metropolitana do Recife, mas a Fundação de Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife - FIDEM, enquanto órgão de planejamento, defendia projetos de edificações e loteamentos em zonas de comprovada mineralização, embora defendesse a viabilidade econômica de extração do minério fosfático. Venceu a corrente que defendia os loteamentos.

Na verdade, a ocupação urbana na área dos depósitos nos anos de 1974 e 1988, tornou clara a elevada taxa de expansão habitacional ocorrida para atender a pressão das atividades de comércio, indústria e agricultura, instaladas ao longo da rodovia BR-101.

O próprio desenvolvimento urbano da Região Metropolitana do Recife e a valorização dos terrenos, grande parte das reservas de fosforita, ficaram situadas em áreas de grande densidade demográfica, o que, associado ao desencanto dos mineradores, dificultava uma retomada dos trabalhos de exploração.

A fosforita vendeu suas áreas e o projeto da Norfertil, aprovado pela SUDENE desde 1984, não entrou em funcionamento total.

 

Divulgação - A fábrica de fertilizantes da Petrobrás em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul,

 

VOLTA DA PETROBRAS

No governo Lula, a Petrobras voltou a se interessar pela produção de adubos. Mas segundo o Coordenador Geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, a partir de 2014 o Brasil -que antes a Petrobras produzia em Sergipe, Bahia e Paraná -, optou pela importação.

Com a aquisição da Fafen-PR, a companhia reforçou seu Plano de Negócios e Gestão 2013-2017 no setor com as duas fábricas: a Fafen-SE, com capacidade de produção de 657 mil toneladas/ano de ureia e 456 mil toneladas/ano de amônia, e a Fafen-BA, com 474 mil toneladas/ano de ureia e 474 mil toneladas/ano de amônia.

Mas com a crise da Petrobras no escândalo na Operação Lava Jato, veio a decisão de se desafazer de ativos não dedicados à área de petróleo. A Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados da Petrobrás no Paraná (Fafen-PR) foi fechada em março de 2020.

Na época, ela era responsável pela produção de 30% do mercado brasileiro de ureia e amônia, e 65% do Agente Redutor Líquido Automotivo (ARLA 32), aditivo para veículos de grande porte que atua na redução de emissões atmosféricas.

A Fafen-BA, cujo principal produto era amônia, uréia, gás carbônico e Agente Redutor Líquido Automotivo (Arla 32), também foi hibernada em 2018, até ser arrendada à Proquigel, subsidiária da Unigel, em 2020, junto com outra unidade, a Fafen-SE, produtora de uréia fertilizante, uréia para uso industrial, amônia, gás carbônico e sulfato de amônio (também usado como fertilizante).

Finalmente, no último dia 4 de fevereiro, o grupo russo Acron comprou a fábrica de fertilizantes da Petrobrás em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, que está com mais de 80% das obras concluídas e que terá capacidade de produzir 3.600 toneladas de uréia e 2.200 de amônia por dia.

Ministério da Agricultura - Ministra Tereza Campelo negociou a venda para o grupo russo Acron da fábrica de fertilizantes da Petrobrás em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul.
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