Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

JC Negócios

Por Fernando Castilho
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Coluna JC Negócios

AUXÍLIO BRASIL: Bolsonaro não entendeu que não é só no Nordeste que tem gente passando fome

Além de 9,4 milhões de famílias no Nordeste, existem seis milhões inscritos no Auxílio Brasil no Sudeste

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Fernando Castilho

Publicado em 21/09/2022 às 12:20 | Atualizado em 21/09/2022 às 15:18
No Sudeste existe quase seis milhões de famílias que dependem do Auxílio Brasil. No Nordeste 9,4 milhões. - Gabriel Ferreira/JC Imagem

Os resultados nas últimas pesquisas de intenção de votos para a Presidência da República mostram que, faltando 10 dias para o primeiro turno, o presidente Jair Bolsonaro passa a ter menos armas para tentar virar o jogo, e que o aumento no valor do Auxílio Brasil não gerou o resultado eleitoral esperado.

Faz sentido que alguém com algum conhecimento de pobre (o que parece claro que não é o caso do então ministro da Cidadania, João Roma que teve a "brilhante" ideia de unificar os pagamentos num valor único) saberia que quando você nivela por baixo, tratando iguais os diferentes, os resultados não têm como dar certo.

Quando a popularidade de Jair Bolsonaro subiu quando ele pagou as primeiras cinco parcelas do Auxílio Emergencial a 65 milhões de pessoas, muita gente no Governo achou que o presidente tinha conquistado o Nordeste eliminando a memória do Bolsa Família, uma criação dos Governos Lula. Foi um enorme equívoco.

Bolsonaro quer usar recursos de vendas de estatais e de taxação de lucros e dividendos para manter o reajuste do Auxílio Brasil - Divulgação

O Bolsa Família (Auxílio Brasil) pagou, em agosto, 9,4 milhões de famílias no Nordeste. Mas também paga 5,9 milhões de benefícios (4,9 milhões apenas no RJ, MG e SP), onde estão cadastradas, até agosto, 2,5 milhões de famílias.

Se alguém se der ao trabalho de verificar onde estão essas pessoas, estão na capital, na Região Metropolitana, e nas cidades de porte médio.

É pobre demais nos três estados mais ricos, e com maior contingente eleitoral. E essa concentração de miseráveis está muito mais concentrada em menos espaços. Ou seja, a sensação de insegurança alimentar e de proteção é mais forte.

Isso quer dizer que a fome e o desespero em não ter alimento ao menos duas vezes por dia é maior. Não quer dizer que nos estados de Bahia, Pernambuco e Ceará, que juntos têm mais de 3 milhões de inscritos, essa sensação seja menor. Mas é que em São Paulo, a coisa é mais forte. Especialmente pela dificuldade de comprar comida.

Então, foi uma enorme estupidez do Ministério da Cidadania achar que deveria desprezar todo o conhecimento georreferenciado de anos e não focar nas áreas críticas. Nivelou e aumentou a insatisfação.

O caso das mulheres é estratégico. Bolsonaro não consegue se aproximar de Lula, a distância continua sendo de 14 pontos. A rejeição do presidente cresceu entre as mulheres, enquanto a de Lula oscilou pra baixo.

Ora, qualquer técnico em políticas sociais sabe que a razão do Bolsa Família ser no nome da mulher é para evitar que homem deixe de comprar comida para comprar bebida alcóolica.

Foi isso quem assegurou a melhoria da segurança alimentar das 20 milhões de famílias contempladas. Imagine se o dinheiro fosse creditado no nome dos chefes de famílias homens.

SEM VIRADA NO NORDESTE 

A virada esperada pelo governo no Sudeste também não veio (Bolsonaro tem 38% dos votos do Sudeste), porque como já tinha dito Bill Clinton, em 1993, a célebre frase: “É a economia, estúpido”, que o permitiu derrotar o todo poderoso Bush pai. Foi um fenômeno eleitoral. E nesse caso, a economia da fome.

Importa pouco que mesmo com as melhorias dos últimos dois meses, como Bolsonaro disse no seu discurso na ONU (porque o percentual de quem acredita que a economia piorou no último ano ainda é muito alto). E isso não está só no Nordeste, onde Lula nada de braçada. Está na periferia de São Paulo e nas favelas do Rio de Janeiro.

A nova pesquisa da Genial/Quaest mostra que 75% dos eleitores dizem que não viram redução no preço dos alimentos. Entre o eleitor de baixa renda, a situação do preço dos alimentos é ainda pior; 80% não viu redução de preço.

ESTRATÉGIAS Troca de marcas, substituição de produtos, busca pelo melhor custo-benefício são as saídas para compor a cesta de abastecimento - DAY SANTOS/JC IMAGEM

Segundo o IBGE, de janeiro a agosto a alimentação subiu 10,10% numa inflação geral e 4,39%. Mas quase 12% na alimentação dentro de casa. Em 12 meses, a alimentação subiu 13,34%, numa inflação de 8,73%. Beleza, está baixando, mas e a comida no supermercado?

Tem coisas que são determinantes. Por exemplo, em 12 meses o preço dos produtos de milho subiram 34,8%. A farinha de trigo 332,2% e o açúcar cristal, 17,5%. Ora, esse três elementos mais o café, que subiu 46,3%, são a base da comida de quem recebe o Auxílio Brasil. Não tinha como Bolsonaro melhorar a imagem com os R$ 600. Não dá para comprar comida com esse valor.

Em 2022, o consumo de carne de frango no Brasil deverá chegar a 10,54 milhões de toneladas, representando 51% do consumo total de carnes no país, segundo relatório do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA).

BRASILEIRO COME 250 OVOS POR ANO

Isso foi bater no consumo do ovo. Em 2020, foi de 251 unidades por habitante passando, em 2021, para 257 unidades por habitante, com quase 60 (produzidas 54,973 bilhões de unidades), onde 99,54% são destinadas para atender o mercado interno. Só que o preço do ovo, em um ano, subiu 13,90% em 12 meses.

Então, não tinha mesmo como o Auxílio Brasil turbinar a campanha de Jair Bolsonaro, tanto no Nordeste como no Sudeste. A sensação de fome, que ele diz não ser “tão grande assim”, é real.

Vai precisar de outro argumento. Porque distribuir dinheiro às vezes soa como uma coisa muito ruim.

Como, aliás, já dizia Luiz Gonzaga na celebre música Vozes da Seca.

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