O velho Tancredo Neves costumava dizer que “ninguém é forte nacionalmente se não dominar a base”. E que perder eleição faz parte da vida de quem decidiu ser político profissional. E como ninguém ganha sempre, daí a necessidade de ler, sempre, Eclesiastes 3:1-10.
Escalado para representar o PSB numa festa que o PT organizou para Lula, na qual a candidata do Solidaridade, Marília Arraes foi a estrela ao lado do ex-presidente e candidato a um novo mandato, João precisou cumprir nas ruas a tarefa de mostrar o apoio de seu partido a Lula e a Marília.
O problema é que João Campos há pouco mais de dois anos derrotou a mesma Marília Arraes, sua prima, numa disputa tão feroz pela Prefeitura do Recife que as relações familiares foram cortadas de uma forma que nenhum dos dois fez qualquer gesto de aproximação.
Derrotada, Marília que saíra do PSB, foi se abrigar no PT até ser, novamente, excluída do processo eleitoral exatamente por uma articulação que o PSB de João Campos fez com Lula nacionalmente.
E essa negociação lhe tirou a chance de disputar o Governo pela legenda de Lula - a quem se alistou na tarefa de elegê-lo presidente desde o primeiro dia da campanha.
Marília precisou repetir o gesto de Jarbas Vasconcelos, em 1985, quando depois da campanha do “Diretas já” foi impedido de disputar a Prefeitura do Recife pelo seu MDB e precisou se abrigar no PSB, partido pelo qual venceu o pleito de forma arrasadora. Marília tem certeza que vai repetir o gesto de Jarbas Vasconcelos, que não lhe apoia nessa eleição, mas está com Lula.
Ela já comemora uma primeira vitória, retirando o partido de João Campos do poder - há 16 anos - ancorando seu discurso numa crítica feroz ao governador Paulo Câmara, explicitada já na primeira entrevista após o primeiro turno - quando exibiu a votação de Danilo Cabral (quarto colocado) como um troféu.
O problema é que ela precisa de apoios, e o PSB - que cedeu um lugar para Geraldo Alckmin - exigiu estar na festa de Lula no Recife nesta sexta-feira.
E lá foi João Campos cumprir a tarefa. Primeiro, ter que fazer as pazes com a prima Marília. E, depois, ter que subir num carro onde sua presença era a de um simples coadjuvante.
As câmeras mostraram, ao vivo, o desconforto do prefeito do Recife numa festa para Lula, onde quem brilhou foi Marília. Mas fazer o quê? Alguém tinha que representar o PSB e, certamente, não poderia ser Paulo Câmara nem Danilo Cabral.
Eles até foram conversar com Lula e tomar café da manhã para, em seguida, voltar para casa, enquanto para João Campos “sobrava” a tarefa de ser o PSB num espaço apertado - em cima de uma caminhonete.
O PSB ianugurou o "Apoio txt". Emite uma nota, conversa com a candidata, mas não faz e muito menos divulga uma foto para ser publicada em JPEG nas redes sociais ou internet.
O problema de João Campos são os cenários de futuro.
O que acontece com o PSB se Marília vencer a eleição? Ela vai abrigar parte da massa de filiados do PSB no Governo? E se não fizer isso, João tem como abrigar o time que há 16 anos está no comando do Governo de Pernambuco no prédio do Palácio Rio Capibaribe?
O prefeito sabe que Raquel Lyra não fará nenhum gesto para com o PSB. Até porque o arco de apoio dela numa eventual vitoria em 30 deste mês não contempla seu partido.
Resta investir suas fichas numa vitória de Lula. E começar a reorganizar o PSB, preparando o partido para se reinventar e se apresentar como uma opção em 2024 e 2026. Sua sorte é ter tempo.
A respeitada jornalista de política Marisa Gibson, certa vez, disse que a coisa mais difícil de um político é ir para uma festa, como convidado, quando já foi o anfitrião.
João Campos deve ter vivido essa sensação durante as três horas que precisou estar ao lado de Marília e de Lula num espaço tão pequeno que podia sentir a respiração forte dos dois.
Mas e daí? Não queria ser político? E como tal ele pode recorrer ao “livrinho da capa preta” e refletir sobre as 13 quadras escritas no Eclesiastes. Ajudam muito.